Igreja/Cultura: Regresso às «grandes perguntas»

Cardeal Gianfranco Ravasi e João Lobo Antunes alertam para riscos de sociedade invadida por «ruído» e «banalidade»

Guimarães, Braga, 16 nov 2012 (Ecclesia) – O cardeal Gianfranco Ravasi, presidente do Conselho Pontifício da Cultura (CPC), disse hoje em Guimarães que a sociedade tem de voltar às grandes questões sobre a vida e o mundo num tempo cheio de “banalidade”.

“Uma das grandes tragédias do nosso tempo é que as grandes perguntas já não se coloquem”, disse o membro da Cúria Romana no Auditório Nobre da Universidade do Minho, durante um debate sobre ‘O valor e o sentido da vida de cada ser humano’ com o neurocirurgião João Lobo Antunes.

“Nós procuramos algo que nos supera”, referiu no dia inicial da nova sessão do Átrio dos Gentios, projeto do Vaticano que visa promover o diálogo entre crentes e não crentes.

D. Gianfranco Ravasi considerou que existem mais concordâncias do que discordâncias no que diz respeito ao tema escolhido para a edição portuguesa, ‘O Valor da Vida’, destacando, a este respeito, o papel da Bíblia como “léxico” comum da cultura.

Segundo este responsável, o que constitui a humanização definitiva é quando se “encontra o outro”, porque “a vida precisa de relação”, de amor, incluindo “o sexo, a corporeidade, a matéria”.

“Somos seres simbólicos, não somos só um monte de células”, complementou, alertando para o facto de os jovens estarem a “perder uma componente fundamental, o diálogo dos rostos”.

João Lobo Antunes, por sua vez, lamentou a existência de uma cultura do “ruído”, que retira espaço ao silêncio.

O vencedor do Prémio Pessoa em 1996 falou sobre “qual a razão” para que as pessoas sejam colocadas no mundo e referiu uma conversa, com um neto de 13 anos, sobre o “sentido da vida”.

“Disse que para mim, a vida só fazia sentido se fosse digna de ser vivida”, revelou, antes de acrescentar que “a vida não tem preço”.

D. Gianfranco Ravasi evocou o “sabor amargo da dor, o isolamento, a solidão” que muitas pessoas sentem, na sua fragilidade.

João Lobo Antunes apresentou-se como ‘gentio’ e destacou a importância do “funcionamento harmónico” de corpo e espírito para compreender o sentido e a dignidade da vida.

“Os diversos atributos que nos conferem uma identidade única articulam-se de modo imprevisível, caótico mesmo”, frisou.

“A maneira como cada um encara a dignidade da vida e do morrer é pessoal”, observou.

Lobo Antunes retomou o seu conceito de “compaixão ontológica” e apelou à recusa do outro como “simplesmente um meio para obter um fim”.

De um ponto de vista pessoal, o neurocirurgião disse que a sua fé “partiu e deixou no seu lugar uma angústia metafísica”.

No sábado, dia final do Átrio dos Gentios, vão decorrer em Braga debates sobre ‘estilo de vida e salvaguarda do universo’, desde várias perspetivas, para além de momentos culturais, com concertos, exposições e a apresentação de uma peça de teatro.

A ministra Assunção Cristas, o antigo candidato presidencial Fernando Nobre e a presidente da Federação Europeia dos Bancos Alimentares, Isabel Jonet, são alguns dos conferencistas convidados, juntando-se à coreógrafa Olga Roriz, aos escritores Vasco Graça Moura e Valter Hugo Mãe, à poetisa Ana Luísa Amaral e ao padre e poeta Tolentino Mendonça, entre outros.

O Átrio dos Gentios pode ser seguido com emissão vídeo online, em direto, assegurada pela Agência ECCLESIA, em parceria com o portal SAPO.

OC

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