Igreja/Cultura: Murais recuperam técnicas antigas para retratar milagre da Senhora da Veiga e os sete mistérios de Jesus e de Maria (c/fotos)

Cal, areia e pigmentos naturais dão vida a uma «catequese» pela arte em Alfaião, Diocese de Bragança-Miranda

Bragança, 05 jan 2022 (Ecclesia) – O Santuário da Senhora da Veiga, em Alfaião, na Diocese de Bragança-Miranda, apresenta aos peregrinos murais de esgrafitado e fresco sobre o milagre local e os sete mistérios de Jesus e de Maria, uma “catequese” numa técnica natural e antiga.

“A ideia central foi representar o milagre porque era aquilo que as pessoas pediam mas depois pensou-se que se podia fazer uma catequese de Nossa Senhora, em sintonia com o seu filho Jesus Cristo: Os sete mistérios de Jesus e de Maria, desde o nascimento, passando pela crucifixão e a assunção e ascensão do Senhor”, disse o pároco de Alfaião à Agência ECCLESIA.

O padre António Estevinho Pires explica que o milagre da Veiga diz respeito a um lavrador que ali perto estava a lavrar e os animais iam cair num “despenhadeiro e o senhor fez uma prece a Nossa Senhora e susteve as vacas”.

“É o milagre que hoje o povo tem muita tradição e quis também que ficasse inscrito no painel central destes murais”, acrescentou, lembrando que num documento do século XVII também consta a história de um sapateiro da localidade que “foi levado pela Inquisição, julgado” e preso, porque disse que “teve visões de Nossa Senhora”.

O sacerdote recorda que “a arte é uma pregação viva” e foi usada pela Igreja Católica há 500, 600 anos, e no distrito de Bragança “é algo de assombroso”.

Os murais no santuário mariano em Alfaião foram realizados em “técnicas bastante antigas”, nomeadamente o esgrafitado e a pintura a fresco, pela artista Tânia Pires da Diocese de Bragança-Miranda.

A técnica natural do fresco, usada nesta “pregação” que representa o milagre da Senhora da Veiga e “Nossa Senhora na vida de seu filho Jesus Cristo”, não era usada em Trás-os-Montes há mais de 500 anos.

“Esta técnica foi pensada porque não se trata de uma estrutura habitual dentro de uma capela mas no exterior, e aquilo que se percebe é que oferece mais resistência, mais durabilidade. A técnica mural a fresco é muito melhor do que qualquer outra para este tipo de edificação”, destacou o padre António Estevinho Pires.

Foto: Agência ECCLESIA/CB

Em declarações à Agência ECCLESIA, a iconógrafa Tânia Pires adianta que o esgrafitado, que era usado “na construção em Trás-os-Montes”, como noutras regiões do país, “tem a mesma base da pintura a fresco, que é a base de cal e areia e pigmentos”.

Segundo a artista, a cal exerce uma “ação de carbonatação e fixa o pigmento”, por isso é que esta técnica é “duradoura mesmo a nível de cor”.

Tânia Pires explica que na técnica utilizada têm de trabalhar enquanto a cal está fresca, ou seja, tiveram “um curto período de tempo para trabalhar” e obriga a ser “bastante rápido”, num processo feito através de “várias camadas de cal, com diferentes cores de pigmentos naturais”.

Tudo o que utilizamos são materiais naturais e é muito simples: cal, areia e pigmentos naturais. É trabalhar por camadas, tem também um pouco de escultura, raspar e esgrafitar. Depois a parte do fresco que é aplicada a parte do cal e pintada por cima, existe o processo de carbonatação em que a cal fixa o pigmento, vai endurecendo e secando”.

Para a iconógrafa brigantina “é sempre importante” resgatar técnicas antigas, que são validas e são bastante interessantes, “mesmo a nível plástico” para esta época e trabalhá-las de uma forma mais contemporânea.

A artista que já conhecia a zona rural do Santuário da Senhora da Veiga, em Alfaião, destaca que é “um lugar muito bonito e pacífico”, perto do rio Penacal, e destaca que “é bonito relacionar técnicas tradicionais onde existe ainda alguma tradição”, por isso, faz muito sentido nas aldeias usarem técnicas tradicionais e manter a parte mais ecológica e natural.

“Estamos habituados a fazer arte em cidades grandes e aposta-se pouco na arte e em trabalhos em murais em pequenas terras. É compreensível, há pouca gente e haverá pouca gente a visitar, mas este sítio é muito movimentado e tem vindo mais gente. É preciso apostar nestas pequenas terras que têm grande valor e as pessoas também merecem na sua terra ter algo bonito para ver e contemplar”, salientou Tânia Pires.

CB/OC

O pároco de Alfaião assinala que na aldeia existe uma “devoção muito grande à Senhora da Veiga”, que celebram a 15 de agosto, quando a presença de pessoas é maior, com o regresso dos migrantes.

Sobre o local, o padre António Estevinho Pires contextualiza que existiu ali um povoado romano e no levantamento arqueológico “descobriram-se bastantes vestígios de romanização, algumas moedas romanas, e apareceram muitas verónicas, pequenas imagens de Nossa Senhora”.

 

 

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Agência ECCLESIA

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