Igreja Católica na linha da frente contra o aborto

Polémica sobre a despenalização do aborto envolveu bispos e movimentos católicos de Portugal A opinião pública portuguesa despertou em bloco para a questão da despenalização do aborto e da descriminalização das mulheres que interrompem a gravidez quando o Semanário “Expresso” publicou na edição de 13 de Dezembro de 2003 uma entrevista com o Bispo do Porto, onde se escrevia que “o aborto não devia ser penalizado”. Um Comunicado do Conselho Permanente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) veio imediatamente reafirmar que a Igreja Católica se opõe “a todas as tentativas legais ditas de despenalização do aborto, não porque queira acentuar a pena, mas porque todas elas supõem a legitimação da prática do aborto”. “Na óptica da Igreja, no quadro dos deveres de cada um perante Deus e perante os outros homens, seus irmãos, o aborto, enquanto atentado à vida de outro ser humano, é, antes de mais, uma desordem moral, a que chamamos pecado”, esclareciam então. O próprio D. Armindo Lopes Coelho quis esclarecer que “sou contra o aborto, porquanto a pessoa humana tem direito à vida desde a sua concepção até à morte natural”. O Bispo do Funchal, D. Teodoro de Faria, criticou no Natal a distinção feita pela sociedade civil: “ se a criança já nasceu, não se pode matar; se ainda não nasceu, embora já sendo um ser vivo, tem menos importância e até em alguns Estados se pode matar sem que isso constitua crime algum”. Já no início deste ano, D. Januário Torgal Ferreira apresentava uma solução “mágica” a favor da vida, que passava pela entrega do filho a instituições do Estado e da Igreja, resolvendo a questão da (des)penalização do aborto. Mais duro foi o Bispo de Aveiro, D. António Marcelino, que se manifestou contra o que apelida de “regresso à barbárie”, visando a campanha em favor da despenalização do aborto. “Nunca, em minha vida, vi conluio tão organizado, tão cheio de meias verdades, tão carregado de emoções, tão vazio de razões, tão descentrado do essencial, tão alienante, tão a comando de mãos às claras e de mãos às ocultas”, escreveu. D. António Sousa Braga, bispo de Angra, numa Nota Pastoral sobre o debate do Aborto, publicada dia 30 de Janeiro, referiu que o aborto é uma “medida drástica, que não pode ser aceite, como método de contracepção, porque elimina uma vida”. Perante este dado, a questão do aborto “não é uma questão religiosa. É uma questão de humanidade”, rematava. A mensagem de Quaresma dos Bispos diocesanos de Évora criticava a “cultura da morte” e “conjura contra a vida” que constatavam na nossa sociedade, vincando que “a Igreja, ao serviço da vida humana, considera seu dever, a que não pode de modo nenhum subtrair-se, dar voz a quem a não tem, defendendo os inocentes, os mais fracos, os pequeninos de todas as condições”. No dia da memória dos beatos Francisco e Jacinta Marto (20 de Fevereiro), o cardeal José Policarpo, Patriarca de Lisboa, visitou o Hospital D. Estefânia, em Lisboa, onde referiu que “nós temos a alegria de não ter só os aspectos tristes e dramáticos da discussão sobre o aborto. Temos também a alegria de ver gente que luta pela vida”. CATÓLICOS EM MOVIMENTO Nas últimas 4 semanas foi a vez do movimento cívico “Mais Vida, Mais Família” recolher mais de 190 mil assinaturas contra a despenalização do aborto, um número que para os promotores da iniciativa expressa “a vontade dos portugueses”. O movimento congregou inúmeras associações pró-vida, de inspiração católica, permitindo que “quase 200 mil pessoas dessem um sinal muito claro de que estão descontentes com o que tem sido dito e escrito sobre a maioria dos portugueses ser favorável ao aborto a pedido, o que não é verdade”, como defendeu Isabel Carmo Pedro, em declarações à Agência ECCLESIA. Sobre a discussão pública em torno da problemática do aborto, Isabel Pedro lamenta que “se afirme constantemente que a opinião pública mudou desde 1998, mas o que constatámos foi o contrário: há uma maior defesa da vida, os avanços científicos fazem com que as pessoas tenham mais noção do que é a vida intra-uterina”. Associação de médicos católicos assumiu também uma posição pública no debate sobre o aborto, defendendo o direito fundamental à vida. Maymone Martins, presidente da Associação dos Médicos Católicos, afirmou que “esta querela, que se instalou com grande intensidade nos Media, tem dado grande importância ao papel da mãe, mas esquece a vida do filho”. À Agência ECCLESIA, este responsável assegura que “a solução destes problemas não se alcança apenas por um dos lados”, dado que a problemática é complexa e não tem apenas uma componente. “Em qualquer dos casos, a vida das crianças é sempre perdida quando se interrompe uma gravidez”, vinca. A contestação ao resultado dessa consulta popular de 1998, promovida por vários sectores da sociedade portuguesa, mereceu também um comentário do presidente da Associação dos Médicos Católicos: “apesar de o destaque ser sempre dado à abstenção e à divisão, a verdade é que esses dados devem fazer-nos concluir que há, nos portugueses, uma grande perplexidades e uma grande dúvida”. O coordenador nacional da Pastoral da Saúde da Igreja Católica, Pe. Vítor Feytor Pinto, defendeu que a discussão na sociedade portuguesa, a respeito da despenalização do aborto, foi pautada pelo excesso de ruídos e pela falta de reflexão sobre a matéria. O Pe. Feytor Pinto critica alguns comportamentos excessivos e de pressão junto da opinião pública, vincando que muitos estão a esquecer que a Constituição da República Portuguesa afirma claramente que “a vida humana é inviolável” (Artigo 24). Este responsável católico lembra ainda o texto da Convenção sobre os direitos da criança, assinada por Portugal, onde se define, no Artigo 6º, que a criança tem “o direito inerente à vida”. Sobre a situação em Portugal, o Pe. Feytor Pinto assinala que, mesmo na suspensão da ilicitude (artigo 142 do Código Penal, sobre a Interrupção da gravidez não punível), não se diz que o aborto não seja crime, mas que as circunstâncias que a pessoa está a viver podem ser atenuantes. “Penso que uma leitura precipitada, – que pretende despenalizar, abrindo a porta à liberalização -, é negativa, até porque as leis não têm de apenas o carácter punitivo, mas também são preventivas”, afirma. “Não respeitar o carácter preventivo desta lei é abrir a porta a toda uma vida completamente desequilibrada no comportamento afectivo, sexual e social das pessoas”, acrescenta.

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