Igreja: Assembleias eclesiais pré-conclave, com «participação de representantes aos mais variados níveis», poderiam promover «escuta» e indicar «prioridades» – Octávio Carmo

Vaticanista e jornalista da Agência ECCLESIA olha para os 12 anos do pontificado de Francisco, para gestos que «leem a vida concreta» e promovem «um amor que se alarga»

Foto: Agência ECCLESIA/MC

Lisboa, 12 mar 2025 (Ecclesia) – Octávio Carmo, jornalista e vaticanista da Agência ECCLESIA, disse hoje que gostaria que as reuniões entre cardeais, que antecedem o início do conclave, assumissem a forma de assembleias eclesiais para promover a “escuta” e “prioridades” para a Igreja.

“Antes da entrada na Capela Sistina, os cardeais estão reunidos durante vários dias a debater problemas que são, do seu ponto de vista, essenciais para o futuro da Igreja. Esse é o momento em que, se alguém aparecer com uma reflexão estruturada que responda a muitas preocupações dos eleitores, provavelmente vai, vamos dizer assim, ganhar pontos. Esse é o momento. Eu gostaria que estas congregações gerais de cardeais passassem a ter a forma de uma Assembleia Eclesial pré-conclave, com participação de representantes da Igreja aos mais variados níveis”, explica à Agência ECCLESIA.

O vaticanista preconiza a aplicação sinodal às congregações gerais, promovendo um “debate alargado” e possibilitando que os cardeais que vão eleger o futuro Papa “possam ouvir mais vozes sobre aquilo que são as prioridades para a Igreja Católica”.

“Eu diria que uma das formas, porque eu acho que as estruturas sinodais não se devem limitar ao atual modelo da Assembleia do Sínodo dos Bispos. É possível criar mais estruturas sinodais na Igreja e uma delas poderiam ser estas Assembleias Eclesiais pré-conclave”, acrescenta.

Octávio Carmo apresenta esta possibilidade até num quadro de “renúncia” de Francisco e acredita que “prolongar a sede vacante e o início do conclave alguns dias não seria prejudicial”.

“Eu diria que poderia acontecer mais facilmente perante uma renúncia. Porque, olhando para o que aconteceu com Bento XVI, por exemplo, quem renuncia, apesar de tudo, tem algum controle sobre o que vai acontecer a seguir: datas, formas de operar… o Papa Bento XVI aplicou ligeiras alterações, por exemplo, à forma de eleição, até para antecipar”, indica.

Octávio Carmo, vaticanista com acreditação permanente na Santa Sé, iniciou esta função durante o pontificado do Papa Bento XVI e tem acompanhado o pontificado de Francisco que, reconhece, abriu a Igreja e o diálogo a partir da sua leitura da vida concreta e não de teoria.

“Ele lê a vida concreta e parece-me uma forma muito bonita de falar do Evangelho, de espiritualidade, de dialogar com pessoas que nem todas serão católicas, mas que muitas se identificarão com as palavras e com os gestos do Papa”, traduz.

A história de Jorge Mario Bergoglio, que olha a Igreja católica a partir da América Latina e não de Roma, traz para o pontificado o contacto com os pobres, com os descartados, com os esquecidos e assume como mensagem de futuro que “a Igreja não serve para estar ao lado do poder; a Igreja serve para estar ao lado dos mais fracos”.

Octávio Carmo recorda que na história da Igreja “é sempre possível voltar atrás”, mas diz que Francisco deixará uma marca de “um amor que se alarga”.

“Acho que é isto que ele quer que seja a Igreja Católica, um amor que se alarga. Que assusta, porque objetivamente, como é que esta instituição se pode alargar se ela hoje tem dificuldade em manter as suas estruturas tradicionais? Mas a sua atenção é esta: entre criarmos estruturas, nas quais ficamos presos, ou esta capacidade de expandir a proposta e de ir ao encontro do mundo contemporâneo para que ela seja relevante, ele opta pela segunda via. E a perda de relevância é o pior que pode acontecer. Não é a perda de estruturas nem de influência, é a perda de relevância”, indica.

O jornalista fala ainda na recuperação de gestos, “a partir das ações de Jesus”, que querem ir ao encontro “daqueles que estão esquecidos”.

“O Papa tem insistido muito na questão da dignidade. O gesto do lava-pés que ele recupera na celebração de Quinta-feira Santa, ao deslocar-se a prisões onde lava os pés a reclusos e detidos, a mulheres e a pessoas de outras religiões, ele recupera um gesto que quer incomodar porque se nós não incomodamos com este gesto a consciência de alguém, ele não serve para nada. E o Papa Francisco vai, claramente, deixar a indicação de que este gesto tem de ser consequente. Parece-me que é um gesto que define muito o que é”, reconhece.

A conversa com Octávio Carmo pode ser acompanhada esta noite na Antena 1, no programa ECCLESIA emitido pouco depois da meia-noite, e disponibilizado no podcast «Alarga a tua tenda».

LS

Partilhar:
Scroll to Top