Documento deixa sugestões de medidas, apontando à assembleia extraordinária da CEP
Lisboa, 02 mar 2023 (Ecclesia) – Cerca de três centenas de católicos e instituições ligadas à Igreja divulgaram hoje uma carta dirigida aos bispos portugueses, pedindo medidas na resposta à crise dos abusos sexuais de menores.
O texto, enviado à Agência ECCLESIA, sustenta a “suspensão com caráter preventivo sempre que haja indícios minimamente credíveis sobre abusos”, por membros da Igreja, recomendando que as comissões diocesanas de proteção de menores recentrem a sua ação na prevenção primária e na formação.
A Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) vai reunir-se esta sexta-feira, numa Assembleia Plenária Extraordinária “dedicada, exclusivamente, à análise do relatório final da Comissão Independente para o estudo dos abusos sexuais”.
Em nota enviada à Agência ECCLESIA, a CEP informa que o encontro vai decorrer, entre as 10h00 e as 17h00, sendo seguido de uma conferência de imprensa, na Casa de Nossa Senhora das Dores, em Fátima, pelas 18h00.
A 13 de fevereiro, em Lisboa, a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica em Portugal, designada pela Conferência Episcopal Portuguesa, apresentou o seu relatório final, no qual validou 512 testemunhos, apontando a um número de 4815 vítimas, entre 1950 e 2022.
Nesse mesmo dia, em reação ao documento, o presidente da CEP disse aos jornalistas que o mesmo “exprime uma dura e trágica realidade”, sublinhando que a Igreja Católica não vai tolerar “abusos nem abusadores”.
“A ‘tolerância zero’ para com os casos de abusos tem de ser uma realidade em toda a Igreja e, por isso, não toleraremos abusos nem abusadores”, afirmou D. José Ornelas.
Para o bispo de Leiria-Fátima, o relatório é “uma ferida aberta”.
“Pedimos perdão a todas as vítimas: às que deram corajosamente o seu testemunho, calado durante tantos anos, e às que ainda convivem com a sua dor no íntimo do coração, sem a partilharem com ninguém”, acrescentou.
A carta enviada aos bispos sugere a criação de “mecanismos que viabilizem apoio e ajuda psicológica e psiquiátrica às vítimas” e de uma nova “comissão independente”.
No texto, pede-se ainda “um mecanismo para pedir perdão às vítimas de acordo com as suas necessidades, e realizado um momento solene e coletivo que simbolicamente projete publicamente esse pedido de perdão”.
A intenção de fazer “publicamente um pedido solene, marcante, de perdão” já foi assumida pelo presidente da CEP, em novembro de 2022.
Os signatários da carta propõem que seja elaborado um “manual de boas práticas que ajude os agentes pastorais a prevenir situações de risco e a identificar indícios de casos de abusos, bem como a acolher e encaminhar vítimas”.
O texto inclui propostas para implementação imediata e outras para um prazo de seis meses, como a divulgação e estudo do relatório da Comissão Independente entre os agentes de pastoral, “prevenindo a tentação negacionista ou de relativização do fenómeno criminal”.
“Queremos uma Igreja onde todos se possam abrigar e acolher”, conclui a missiva.
O Vaticano disponibiliza desde 2020 um “vade-mécum” para ajudar os bispos e responsáveis de institutos religiosos no tratamento de denúncias de abusos sexuais de menores.
O documento preparado pelo Dicastério para a Doutrina da Fé (DDF) surgiu depois dos pedidos feitos durante a cimeira para a proteção de menores, que o Papa promoveu de 21 a 24 de fevereiro de 2019, no Vaticano.
O DDF propõe aos responsáveis católicos um “manual” para “casos de abusos sexuais de menores cometidos por clérigos”, visando processos que envolvam bispos, padres e diáconos, de forma a uniformizar os procedimentos e estabelecer regras comuns, em vez de orientações.
O guia em 164 pontos, disponível online desde 2022, explica os procedimentos a seguir, desde a denúncia à conclusão da causa, falando numa “ferida profunda e dolorosa que pede para ser curada”
OC
As diretrizes da Conferência Episcopal Portuguesa para estes casos, datadas de 2020, sublinham que o bispo responsável deve dar seguimento a denúncias e à possível investigação prévia.
As novas orientações defendem “condutas que assegurem a todos um ambiente absolutamente seguro, transparente, alegre e cheio de esperança”, com formação específica dirigida aos agentes pastorais e mecanismos eficazes para acompanhar casos de abuso sexual de menores e de adultos vulneráveis, “desde o momento da sua sinalização ou denúncia até à conclusão dos procedimentos canónicos, civis e pastorais”. A CEP determina que, nas atividades da Igreja Católica, os agentes pastorais, clérigos ou leigos, devem estar sempre “em lugares visíveis a outras pessoas quando estejam com menores e adultos vulneráveis”. As diretrizes sublinham que é “absolutamente proibido” aplicar qualquer tipo de castigo corporal a menores e adultos vulneráveis ou ter com eles “comportamentos inapropriados ou com conotações sexuais, sejam essas conotações explícitas ou dissimuladas”. |