Igreja/Abusos: «Estamos num lugar que é claramente de reforma» – Alfredo Teixeira

Antropólogo e docente da UCP considera que relatório da Comissão Independente revela «problema de caráter institucional»

Agência Ecclesia/MC

Lisboa, 20 fev 2023 (Ecclesia) – Alfredo Teixeira, antropólogo e docente da Universidade Católica Portuguesa (UCP), disse à Agência ECCLESIA que a divulgação do relatório sobre abusos sexuais na Igreja em Portugal deve levar a uma “dinâmica de reforma”.

“Estamos num lugar que é claramente de reforma. Reconhecer este problema e enfrentá-lo, como a Igreja Católica está a fazer hoje, nas suas instituições, é claramente uma dinâmica de reforma que reflui sobre a própria instituição e a pode transformar, em muitas dimensões”, assinala o docente universitário.

Para o investigador, estes casos são” um forte contratestemunho para a Igreja Católica”, que, enquanto instituição, “não soube colocar-se no seu lugar certo”.

“O que as pessoas não entendem é que a instituição, nas suas autoridades, tenha tido conhecimento destas situações e não tenha agido de uma forma clara, em favor da vítima”, precisa.

Alfredo Teixeira sublinha que a presença de abusadores nos vários setores da sociedade é um dado adquirido, sendo um problema “difícil de prevenir”.

“Além dos problemas pessoais que podem ser colocados, a que a psicologia e a psiquiatria podem responder, há um problema de caráter institucional, em todo o caso. O próprio Papa Francisco deu o nome a isso, clericalismo”, aponta.

O relatório, pedido pela Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) e divulgado a 13 de fevereiro, validou um total 512 testemunhos de abuso sexual na Igreja Católica nas últimas décadas, com um “pico” entre as décadas de 60 e 90 do século passado.

Falando num problema extenso, “no tempo e também geograficamente”, o antropólogo alerta para o “abuso espiritual” que se estabelece numa relação “privilegiada” entre os padres abusadores e os menores.

As vítimas, acrescenta, vêm “pôr a nu” as “disfuncionalidades” das instituições, que podem ser tentadas a responder com “estratégias ou táticas de invisibilização”.

“As organizações, como sistemas de vida, também têm as suas próprias patologias”, adverte.

Estes casos são vistos pelo antropólogo como um “sintoma” de problemas que vão além dos problemas de abusos sexuais, limitados a “algumas pessoas, dentro das instituições católicas”.

“Estamos perante um problema a que poderíamos chamar uma espécie de doença da própria organização”, sustenta.

O docente da UCP recorda que, em vários estudos, os clérigos abusadores enfrentam situações de “desorganização social”.

Alfredo Teixeira acredita que a sinodalidade na Igreja Católica, como “dinamismo participativo” e de corresponsabilização, “tendencialmente diminuirá a possibilidade destes comportamentos de desvio”.

A Conferência Episcopal Portuguesa vai reunir-se a 3 de março, em Assembleia Plenária extraordinária, para debater os dados do relatório e decidir sobre medidas concretas a tomar.

HM/OC

 

Abusos Sexuais: «Confronto com este problema é, claramente, um lugar privilegiado de reforma da Igreja» – Alfredo Teixeira (c/vídeo)

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