Relação com a natureza e valor do discurso poético são notas sublinhadas por frei Hermínio Araújo, no aniversário do «Cântico das Criaturas»
Lisboa, 12 jan 2025 (Ecclesia) – Os Franciscanos estão a celebrar em 2025 os 800 anos do ‘Cântico das Criaturas’, composto por São Francisco de Assis antes da sua morte, um poema que, segundo frei Hermínio Araújo, mantém atualidade perante “radicalismos complexos”.
“Há visões religiosas nada em sintonia com esta visão teológica de São Francisco e do Papa Francisco”, refere o religioso da Ordem dos Frades Menores, em entrevista conjunta à Agência ECCLESIA e Rádio Renascença, publicada e emitida este domingo.
Para o responsável, a ligação à expressão artística é “muito significativa e provocadora”, num tempo em que identifica “razões para temer em relação ao futuro”.
“É sempre uma semente de esperança que podemos ir lançando com este Cântico”, acrescenta.
A conversa aborda correntes de pensamento que defendem a “subjugação” da natureza ao ser humano e que procuram fundamentação “antropológica, cultural, religiosa” para as suas posições políticas e religiosas.
O poema d de São Francisco de Assis inspirou o Papa, que escolheu uma passagem do Cântico das Criaturas para iniciar a sua encíclica ecológica e social ‘Laudato Si’, em 2015.
Frei Hermínio Araújo convida a ter “muito cuidado para não ler o Cântico apenas como uma espécie de manifesto de sustentabilidade ou de manifesto ecológico”.
“Importa sobretudo fazer uma segunda leitura, a atualidade poética do Cântico das Criaturas”, precisa.
A poesia é uma via que nos conduz à realidade inteira, como diz Sophia, à realidade toda, e não a realidades parciais. Por isso é que o texto, a sua atualidade poética, é tão significativo”.
O religioso franciscano destaca a “atitude contemplativa” que deu origem ao poema, “uma experiência espiritual de crentes e não crentes”.
“O Cântico das Criaturas é o canto do espanto, é o poema do espanto, do maravilhamento perante todos os seres, é o cântico dos seres unidos ao Ser supremo, ao Altíssimo”, sustenta o entrevistado.
Perante uma cultura “muito fragmentada”, frei Hermínio Araújo considera que a poesia é “abertura ao essencial”, convidando a imitar São Francisco de Assis na sua opção por “viver desapropriado, sem próprio”.
“É possível amar sem possuir. É possível amar sem destruir. É possível amar sem se apropriar”, acrescenta.
O programa de comemorações dos 800 anos do Cântico das Criaturas decorre ao longo dos próximos meses, com destaque para o 21 de março, Dia Mundial da Poesia.
“Queremos chegar ao maior número de pessoas, sensibilizar a partir do Cântico das Criaturas, nesta hiperpoesia, nesta dinâmica de um outro olhar para a realidade”, adianta frei Hermínio Araújo.
“Há esta dialética entre a lógica do mundo do Cântico das Criaturas, o mundo de Francisco e do Cântico das Criaturas, e o mundo da guerra, mas, persistentemente, esta mensagem de paz é uma possibilidade”, conclui o religioso.
Henrique Cunha (Renascença) e Octávio Carmo (Ecclesia)