Humanizar a morte nos hospitais

Padre José Nuno, capelão, dedica investigação aos últimos momentos da vida, que os portugueses passam cada vez menos em casa

Porto, 26 jan 2012 (Ecclesia) – O padre José Nuno, capelão do Hospital de São João, Porto, defende a necessidade de humanizar a morte nestas instituições, nas quais a maioria dos portugueses acaba os seus dias e onde existe “muito sofrimento por dizer”.

“Não se vive bem numa sociedade em que se morre mal”, refere em entrevista concedida à Agência ECCLESIA, a respeito do trabalho de doutoramento sobre este tema, que apresenta hoje.

Para este especialista, “não é possível viver humanamente numa sociedade em que se morre desumamente”.

“Não valia a pena gastar-me exclusivamente a abençoar e a consolar as vítimas – e todos são vítimas, não apenas os doentes que morriam, nesta encruzilhada existencial e civilizacional que vivemos em que a morte não cabe – sem, ao mesmo tempo dar o melhor de mim na tentativa de humanizar a morte”, explica.

Enquanto capelão, o sacerdote católico acompanhou a “transferência” dos momentos finais da vida para o ambiente hospitalar, frisando que é ali que “morrem mais de 60% dos portugueses, já de há vários anos a esta parte”.

“À primeira vista, é um dado positivo: as pessoas têm acesso a cuidados de saúde, morrem assistidas, as famílias não se veem sós com o seu doente sem saber o que fazer, mas eu via o outro lado desta realidade – via como as coisas se passavam de facto e compreendi que esta visão só positiva não dizia a realidade toda, porventura não dizia o principal da realidade”, alerta o padre José Nuno.

“Dediquei-me a esta causa, convicto como estou – cada vez mais – que ela é causa maior de muito do mal-estar da sociedade dos nossos dias”, acrescenta.

O investigador, autor de uma tese de mestrado sobre esta matéria em 2004, fala de um processo que se começa a delinear na década de 70 do século XX, de sul para norte de Portugal.

Este sacerdote deseja que o seu novo trabalho “ajude a recuperar a humanidade da morte no hospital, porque a morte humanamente acolhida e vivida é a maior fonte de uma espiritualidade sadia”.

“O objetivo do trabalho foi tentar compreender o sofrimento do nosso tempo na relação com a morte – o sofrimento dos que morrem, o dos familiares que os acompanham ou que fogem, o dos profissionais de saúde que se veem a braços com uma realidade para que não são formados em hospitais que não foram preparados para ser o lugar de morrer da maioria”, indica o padre José Nuno.

Para este responsável, a questão é “prioritária”, também para a Igreja Católica, “pois humanizar é evangelizar”.

A tese ‘A Morte e o Morrer entre o deslugar e o lugar. Precedência da Antropologia para uma Ética da Hospitalidade e Cuidados paliativos’ vai ser apresentada às 15h30, no campus da Foz da Universidade Católica Portuguesa (UCP), no Porto.

O júri das provas públicas vai ter a presidência do reitor da UCP, Manuel Braga da Cruz, contando com a presença do espanhol Diego Grácia, especialista em antropologia médica e bioética, bem como Daniel Serrão, para além de D. Manuel Clemente, bispo do Porto; António Ferreira, presidente do Conselho de Administração do Hospital São João e Ana Sofia Carvalho, diretora do Instituto de Bioética da UCP.

O trabalho do capelão do Hospital de São João foi orientado pelo padre Arnaldo de Pinho, professor da UCP e diretor do seu Centro de Estudos do Pensamento Português, e Walter Osswald, investigador e docente universitário na área da bioética.

PR/OC

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