Homilia do Bispo do Funchal nas Ordenações Presbiterais

Homilia de D. António Carrilho, Bispo do Funchal 

na Eucaristia das Ordenações  Presbiterais

Sé do Funchal 30 de Julho de 2011

 

Ao serviço dos irmãos, anunciando a Salvação de Deus!

 

É grande a nossa alegria, é grande a alegria de toda a Igreja Diocesana do Funchal, pela Ordenação de dois novos Sacerdotes, nesta manhã: o Óscar Andrade e o Roberto Aguiar. Alegria e acção de graças, com o profundo reconhecimento e gratidão a Deus pelo grande dom, que nos é feito com a consagração total da vida destes jovens. Renunciando a tantos projectos possíveis, porventura bem mais comuns e socialmente aceites, eles colocam-se, assim, ao serviço dos seus irmãos, homens e mulheres da nossa terra, anunciando a Salvação de Deus em Cristo Jesus.

Dois testemunhos, apelo renovado

Dois jovens, dois caminhos, dois chamamentos diferentes, como eles próprios testemunham. O Roberto Aguiar guardou no silêncio do coração o desafio lançado pela sua catequista (“Quem quer ser Padre?”), sentindo novo apelo e decidindo-se a frequentar o Pré-Seminário, aos 13 anos, perante o testemunho e o convite de um sacerdote, que falava, na sua escola, sobre a vocação sacerdotal e missionária. A entrada no Seminário foi, depois, o início de “um caminho de coragem” e de muitos outros desafios, “crescendo na fé, amadurecendo na vida espiritual e discernindo o caminho vocacional”. A decisão foi tomada, a graça da ordenação sacerdotal é hoje acolhida e assumida, como projecto de felicidade e realização pessoal, na entrega ao serviço do Povo de Deus.

Caminho diferente foi o do Óscar Andrade, que só aos 26 anos sentiu o chamamento do Senhor e generosamente lhe respondeu, depois de cumprir o serviço militar, trabalhar com os pais na área comercial, completar o 12º ano de escolaridade e já colaborar na paróquia, como catequista e ministro da comunhão. Assim escreveu ele: “Meditei e reflecti o que faria, casar ou ser padre? O chamamento do Senhor foi mais forte e deixei-me ir como barco pela corrente, com 26 anos. Confiei e deixei a barca andar”. Hoje agradece a todos quantos encontrou no caminho da vida e o ajudaram a maturar a decisão que o traz aqui.

Com estes testemunhos e tantos outros que poderíamos referir, desde já quero renovar aqui o meu apelo aos jovens da Diocese do Funchal: deixai-vos contagiar pela alegria do testemunho daqueles que optaram por uma vida de especial consagração; abri o vosso coração a Cristo, Redentor da Humanidade; escutai o Senhor que vos ama e chama alguns de vós a serem “pescadores de homens”. Ele precisa do vosso coração, cheio de amor, alegria e entusiasmo, e dos vossos lábios, para continuar a Sua missão no mundo.

Palavra da Esperança e Pão da Vida

Os textos que a Igreja proclama na liturgia de hoje (18º Domingo do Tempo Comum, Ano A) e há pouco escutámos, ainda que reportando-nos a tempos históricos distantes, fazem-nos pensar em situações e problemas de grande actualidade e a sentir fortes interpelações, sobretudo no que se refere ao sentido da própria vida humana. E numa celebração de ordenações sacerdotais, são textos que apontam para caminhos de identidade da missão do Padre e nos propõem uma meditação e revisão de vida pessoal sobre o modo como nós, presbíteros, assumimos e exercemos o nosso ministério.

Na primeira leitura (Is 55, 1-3), o profeta Isaías lança ao povo desanimado e resignado a viver longe da sua terra, após longo tempo de exílio na Babilónia, um grito de alento e de esperança, com uma promessa de libertação, significada num grande banquete, que saciará a fome e a sede de todos. É Deus, quem convida o Povo a escutar a Sua Palavra, como alimento e resposta para as aspirações mais profundas do ser humano, para a fome e sede de felicidade, de justiça, de fraternidade, de amor, de paz. É que, para além da resposta à fome e sede materiais, importa encontrar resposta para o verdadeiro sentido da vida humana, para as aspirações mais íntimas dos corações.

Através de Isaías, Deus interpela aquele povo e interpela-nos a nós, hoje: “Todos vós que tendes sede, vinde à nascente das águas. (…) Porque gastais o vosso dinheiro naquilo que não alimenta e o vosso trabalho naquilo que não sacia? (…) Prestai-Me ouvidos e vinde a Mim; escutai-Me e vivereis” (Is 55, 1-3) Aponta-se, assim, para a Salvação messiânica, que em Cristo se concretiza. Também Ele, proclamou um dia: “Se alguém tem sede venha a mim e beba! Do seio daquele que acredita em Mim, correrão rios de água viva!” (Jo 7, 37-38)

No texto evangélico (Mt 4, 13-21), por sua vez, Jesus mostra-Se atento às necessidades e compadecido da multidão que O procura. Hoje, como então, é grande o número daqueles que, para além da resolução dos problemas materiais, procuram, ainda, quem lhes possa saciar a sede de vida em abundância, quebrando as cadeias da angústia e do desalento, da solidão e do medo, da falta de horizontes e sentido para a vida.

Urge, também na Igreja de hoje, “desembarcar” como Jesus, ir ao encontro e acolher, vencer a tentação de “mandar embora”. “Dai-lhes vós de comer” (Mt 14, 16), diz Jesus. Importa, pois, alimentar o nosso mundo, o povo que nos está confiado, com a Palavra da Esperança e o Pão da Vida!

Os dois imperativos  “dai-lhes vós de comer” e “trazei-mos cá” manifestam que o ministério sacerdotal nos torna mediadores do próprio Cristo, associados à Sua missão de Bom Pastor. Saibamos nós fazer da Palavra anunciada e do Pão repartido a porta escancarada para a Vida em abundância, fonte transbordante da Verdade e da Alegria.

Mestre, Sacerdote e Pastor

Caros amigos, Óscar e Roberto, ireis em seguida manifestar diante do Povo de Deus o vosso propósito de receber o ministério sacerdotal, no grau de presbíteros, como zelosos cooperadores da Ordem dos Bispos, mediante a imposição das minhas mãos e do presbitério aqui presente.

Perguntar-vos-ei: quereis exercer o ministério da Palavra, celebrar com fé e piedade os mistérios de Cristo, implorar a misericórdia divina para o povo a vós confiado, unir-vos cada vez mais a Cristo e com Ele consagrar-vos a Deus para a salvação dos homens? – “Sim, quero”, será a vossa resposta! A mesma resposta que todos nós, sacerdotes, também demos no dia da nossa ordenação. Mas o que significa este “sim”?

Como sabeis, caros Ordinandos, os presbíteros são consagrados como verdadeiros sacerdotes da Nova Aliança para anunciarem o Evangelho, apascentarem o povo de Deus e celebrarem o culto divino, principalmente no sacrifício Eucarístico.

Cooperadores dos Bispos e associados a eles na missão sacerdotal, os presbíteros servem Cristo, Mestre, Sacerdote e Pastor, por cujo ministério o Seu Corpo, que é a Igreja, cresce e se edifica como templo santo e povo de Deus.

O sacerdote é o homem da Palavra, o homem da Eucaristia e demais Sacramentos, o homem da Oração da Igreja. Sobretudo na Missa ele sente a exigência de uma configuração cada vez mais íntima com Jesus Bom Pastor; aprende d´Ele a entrega total e o coração indiviso, que o faz buscar, de forma apaixonada, a realização da obra do Senhor.

Por isso o próprio Ritual recomenda a cada um de nós: distribui a todos a Palavra de Deus; procura crer o que lês, ensinar o que crês e viver o que ensinas; realiza, pois, com verdadeira caridade e alegria constante, o ministério de Cristo Sacerdote, não procurando os teus interesses, mas sim os de Jesus Cristo; traz sempre diante de ti o exemplo do Bom Pastor que veio não para ser servido, mas para servir e para buscar e salvar o que estava perdido.

Perante os desafios do mundo actual

Perante os desafios das novas realidades sociais e culturais do mundo actual, o sacerdote há-de ser uma testemunha viva e contagiante do amor infinito de Deus para todos os homens e mulheres, sobretudo junto daqueles que mais precisam de ajuda. Bento XVI recorda-nos que o sacerdócio não é uma simples “profissão”, mas um “Sacramento”: “Deus serve-se de um pobre homem a fim de estar, através dele, presente entre os homens, e agir em seu favor”. Os nossos olhos podem ver no padre apenas um homem, mas pela fé reconhecemos nele Jesus, o Bom Pastor.

Só na oração se intensifica a nossa relação de intimidade com Deus, a nossa presença diante d´Ele e a nossa capacidade para melhor servir e apascentar o povo que nos é confiado. O sacerdote, atento às necessidades dos homens e da sociedade em que vive, deve manter o mundo desperto para Deus. Deve ser alguém que está de pé: firme diante das correntes do tempo, firme na verdade, firme no compromisso pelo bem, disposto a suportar tudo pelo Senhor, até as dificuldades, a solidão e eventuais fracassos.

É este, afinal, o desafio à fidelidade que o grande Apóstolo S. Paulo nos deixa, na segunda leitura, como testemunho da sua própria experiência de entrega total à missão recebida. Nada poderá fazer esfriar a generosidade do Apóstolo, pois, pergunta ele: “Quem poderá separar-nos do amor de Cristo?” (Rom 8,35). Nada nem ninguém poderá separar-nos do amor de Deus, que se manifestouem Jesus Cristo (cf. Rom 8,37-39).

A nossa gratidão

E a terminar, ao mesmo tempo que felicito os ordinandos pela generosidade e alegria do “sim” de cada um, não posso deixar de saudar e felicitar, também, com muito afecto de Pastor, todos quantos entraram no caminho das suas vidas e os acompanharam, tornando possível a grande festa de hoje: familiares e amigos, sacerdotes e catequistas.

Saúdo e felicito, particularmente, as suas famílias e as paróquias de Boaventura e Fajã do Penedo. E manifesto o mais profundo reconhecimento e gratidão a quantos os apoiaram e orientaram no caminho do discernimento vocacional e da preparação para a vida sacerdotal: os responsáveis pela formação, os Seminários do Funchal e dos Olivais em Lisboa, a Escola Teológica e a Universidade Católica, as paróquias que os acolheram em estágio pastoral.

Em espírito de solidariedade e congratulação apraz-me ainda nomear e felicitar o Rev.do Padre Cecilio Astondoa Gortazar, sacerdote carmelita, que celebrará 70 anos de ordenação, no próximo dia 31 de Agosto. As nossas felicitações, agradecendo-lhe o testemunho de tão longa vida no exercício do múnus sacerdotal.

À Mãe da Igreja

A Maria, Mãe da Igreja e Rainha do Clero, Senhora do Monte, nossa Padroeira, confio os nossos sacerdotes, diáconos, seminaristas e jovens em discernimento vocacional. Que todos se deixem conduzir pela novidade do Espírito de Deus e respondam com alegria, entusiasmo e empenho, à própria vocação, na fidelidade e inteira disponibilidade para servir, como Maria.

 

 

† António Carrilho, Bispo do Funchal

 

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Agência ECCLESIA

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