Homilia de D. António Carrilho, Bispo do Funchal,
na Solenidade de Nossa Senhora do Monte,
Padroeira da Cidade do Funchal e de toda a Diocese
Maria-Mãe, sinal de consolação e esperança!
A Igreja Diocesana da Madeira e do Porto Santo une-se à Igreja Universal, celebrando com grande alegria, gratidão e piedade mariana, a secular solenidade de Nossa Senhora da Assunção, aqui invocada como Senhora do Monte.
Padroeira da cidade do Funchal e de toda a Diocese tem, no cimo da montanha, esta igreja que lhe é dedicada. Daqui a Senhora do Monte inclina-se sobre a baía do Funchal, num gesto de bênção materna para com o bom povo que a invoca nas suas dificuldades e lhe dedica um verdadeiro e profundo amor filial. No dia 15 de Agosto, todos os caminhos vêm dar ao Monte!
Congregando pessoas de toda a Ilha, das comunidades emigrantes espalhadas pelo mundo e muitos turistas, que hoje, aqui, se reúnem e veneram a Padroeira na sua pequenina imagem, esta festa é uma referência importante para os filhos desta terra e um espaço privilegiado para celebrarmos as maravilhas, que Deus realizou em Maria de Nazaré.
Como sabemos, o culto a Nossa Senhora do Monte foi também largamente difundido e promovido pelos nossos emigrantes nas terras de emigração. Foram muitos aqueles que, com lágrimas nos olhos e o coração cheio de saudades, antes de embarcarem para novas terras, subiam a longa escadaria do Monte e ajoelhavam junto da Santa Mãe de Deus, implorando as suas bênçãos e graças. E são muitos aqueles que aqui tornam, agradecidos, sempre que a vida o proporciona.
Participante da glória do Ressuscitado
A celebração litúrgica de Nossa Senhora da Assunção é uma das mais antigas festas marianas. Na verdade, a Igreja sempre acreditou e defendeu, que, após a morte, a Bem-Aventurada Virgem Maria subiu à glória do céu em corpo e alma, mas só em 1950 o Papa Pio XII proclamou a Assunção de Nossa Senhora, como dogma de fé: a Santa Mãe de Deus, a Arca da Nova Aliança, intimamente associada ao sofrimento e à morte de Cristo, foi também e, desde logo, associada à Sua gloriosa Ressurreição.
Na nossa Diocese, porém, já no dia 25 de Maio de 1918, a Madre Virgínia Brites da Paixão havia comunicado, como recebida de Jesus, a seguinte mensagem: “assim como foi proclamado dogma de fé a Imaculada Conceição, assim deverá ser proclamado dogma de fé, em todo o orbe católico, a sua gloriosa Assunção ao céu”.
E foi por isso que a humilde Clarissa, em obediência ao seu confessor e com o conhecimento do então Bispo da Diocese, D. António Manuel Pereira Ribeiro, escreveu ao Santo Padre Bento XV, formulando o pedido do reconhecimento e proclamação solene, por parte da Igreja, desse singular privilégio da gloriosa Assunção da Virgem Maria ao Céu, em corpo e alma.
Sinal de consolação e esperança
A riqueza da mensagem litúrgica, que a Igreja nos propõe para este dia, introduz-nos no dinamismo e contemplação da esperança da vida eterna, a Vida plena em Deus, após a morte. Na Virgem cheia de Graça, o Verbo Eterno do Pai, Cristo Jesus, fez-se Carne e habitou entre nós. Sua Mãe Imaculada, concebida sem pecado original, não podia, por isso, segundo a fé da Igreja, estar sujeita à corrupção da morte.
Num dos seus sermões, S. João Damasceno, monge e grande teólogo do séc. VIII, ilustre doutor da Igreja, convida todas as criaturas e nações a “aplaudir e a celebrar a Mãe de Deus” e, referindo-se à sua morte, afirma: “Ela, que gerou o destruidor da morte, (…) vê aproximar-se sem temor, esta partida luminosa, cheia de vida e de santidade”. Maria, a Mãe do Verbo Encarnado, subiu ao céu em corpo e alma e vive para sempre na glória da Santíssima Trindade!
O texto do Apocalipse, na primeira leitura, enaltece a formosura singular da “Mulher revestida de sol com a lua debaixo dos pés e uma coroa de doze estrelas na cabeça” (Ap 12,1). “Este sinal grandioso” é Maria, a excelsa figura da Igreja, que depois dos sofrimentos e lutas desta vida, é revestida da Luz do Ressuscitado, com toda a beleza e esplendor. Nossa Senhora da Assunção é, para cada um de nós, sinal preclaro de consolação e esperança no nosso peregrinar neste mundo.
Na segunda leitura (2Cor 15, 20-27), S. Paulo sublinha o mistério admirável da Ressurreição de Cristo, “pois se em Adão todos morremos, assim também em Cristo todos serão restituídos à vida” (1Cor 15, 22). A Virgem Maria foi a primeira a participar desta vitória sobre a dor e a morte, como primícias de esperança para todos os baptizados em Cristo. Criados à imagem e semelhança de Deus, o homem e a mulher são chamados a viver eternamente com Ele.
Modelo de fé e de amor a Cristo
Se a Igreja convida os crentes a contemplar Maria na glória do Céu, ela também os convida a imitar as suas sublimes virtudes, como modelo de fé e de amor a Cristo e aos irmãos.
Na sugestiva e belíssima página do Evangelho de S. Lucas (1,39-56), escutámos e acompanhámos a jovem Maria de Nazaré, que sobe apressadamente a montanha da Judeia para ajudar sua prima Isabel, que estava grávida. O “Sim” incondicional de Maria a Deus, face ao admirável mistério do Verbo Encarnado, abre-lhe um horizonte imprevisível de total doação e serviço aos outros. A sua fé profunda e viva é dinâmica: cheia de amor e de alegria corre a visitar e a ajudar Isabel.
O encontro feliz entre as duas mães ficou célebre na História da Salvação. Maria e Isabel irrompem em cânticos de louvor. É a festa do Amor e da Alegria, porque Aquele que é a Vida e a Luz do mundo, está a chegar! Mistério admirável do Amor surpreendente de Deus, que as mães celebram, agradecidas!
Na escola de Maria
Caros diocesanos: hoje, subimos ao Monte na companhia de Nossa Senhora, para celebramos juntos as maravilhas e os louvores do nosso Deus. Deixemo-nos contagiar pela alegria, bondade e espírito de serviço da nossa Mãe. Com Maria cantamos o “Magnificat”, o belo Cântico de Amor e de Louvor, que perpetua as maravilhas de Deus realizadas nos corações simples e humildes. Maria é, para todos nós, perfeito modelo de fé, obediência e amor; ela é a mais fiel discípula de Cristo.
Na escola de Maria aprendemos que a verdadeira beleza nasce de um coração puro, disponível, aberto à plenitude de Vida em Deus. Nos nossos dias, com tantas solicitações e propostas no domínio dos bens materiais, não é fácil manter viva esta atitude de abertura aos valores espirituais e sobrenaturais, não é fácil assumir os valores da fé: esquecem-se, muitas vezes, os mais altos ideais do Evangelho, que é, para os cristãos, a fonte da autêntica sabedoria que liberta e salva.
Ninguém duvida de que a nossa sociedade está carente de valores. Impõe-se, por isso, cada vez mais, como necessidade prioritária, uma acção convergente dos diversos responsáveis e elementos educativos, num projecto humanista comum, norteado pelos grandes princípios da Declaração Universal dos Direitos do Homem e outras Convenções Complementares, cujos valores muito devem ao Humanismo Cristão, que está na raíz e constitui referência fundamental para a nossa cultura.
Perante a vaga de incêndios dos últimos dias, não posso deixar de manifestar a mais profunda solidariedade a quantos sofreram, de algum modo, momentos de grande angústia e aflição ou perderam os seus bens. E gostava de deixar, também, um forte apelo à consciência e ao coração de todos, para que se evitem, talvez com maior atenção e cuidado, situações de sofrimento desnecessário e de destruição do ambiente, que é o nosso habitat e património comum. Em situações desta natureza, afinal, todos sofremos e todos ficamos mais pobres.
A nossa gratidão filial
Aqui, neste santuário da Senhora do Monte, temos diante de nós o crucifixo e a imagem da Imaculada Conceição da Capela das Babosas, salvos de forma quase inexplicável, no passado dia 20 de Fevereiro, ficando para nós como sinal de consolação e de esperança.
Muitos são os pedidos, chegados à Paróquia do Monte e à Diocese, para que não tarde a reconstrução daquela Capela, não só pelo seu significado originário de fazer memória dos 50 anos do Dogma da Imaculada Conceição, mas também, nas presentes circunstâncias, como sinal da protecção de Maria-Mãe, que na sua imagem quis ficar junto dos seus filhos, em momento tão doloroso.
É, pois, com grande alegria, que vos comunico que estamos a envidar todos os esforços para que, em breve, estejam concluídos alguns estudos prévios e seja iniciado o processo de concurso, de modo que a obra possa avançar da melhor forma. Estou certo de que não faltarão o interesse, o estímulo e ajuda dos muitos devotos de Nossa Senhora.
O Céu tem um coração
Caros diocesanos: confiai à Senhora do Monte os vossos problemas, dificuldades, sofrimentos e alegrias. À semelhança de Isabel, recebei jubilosamente Maria nas vossas vidas e nas vossas casas. Que todos os filhos e filhas desta terra, também das nossas comunidades emigrantes, que nos acompanham pela RTP, sintam a presença e o carinho de Nossa Senhora do Monte. Com Maria chega sempre a esperança, a consolação e a alegria!
E a terminar, partilho convosco uma expressão feliz do Papa Bento XVI, numa homilia sobre a solenidade da Assunção: “No céu temos uma Mãe. O céu está aberto, o céu tem um coração”. Como é belo ter uma Mãe no céu, que vela constantemente por nós! A Mãe nunca se cansa de amar, de estar vigilante e de esperar! A ela dirigimos, agora, unidos e solidários, a nossa prece:
Senhora do Monte, Maria-Mãe, protege a nossa Diocese e a Madeira; sois nossa Mãe e nossa Padroeira! Envolve-nos na luz do teu olhar de Paz, no abraço materno que fortalece e satisfaz. Abençoa o nosso povo, os nossos emigrantes. Toma-nos pela mão, caminhamos juntos, ó Mãe, ao ritmo do teu Coração!
Senhora do Monte, nossa Padroeira, rogai por nós!
Funchal, 15 de Agosto de 2010
† António Carrilho, Bispo do Funchal