Homilia do Bispo de Viseu na Solenidade de Cristo Rei

A Solenidade de Cristo, Rei e Senhor do Universo, conclui o ano litúrgico, colocando tudo o que somos e temos nas mãos de Jesus, Filho de Deus, o Pantocrator – Aquele por Quem tudo foi criado e Aquele que Deus Pai e Criador colocou à frente de todas as criaturas e de todos os bens.

O bem fundamental e base de todos os outros bens, é o da vida. Hoje é, pois, o Dia da Vida e o Dia do Senhor da vida, o único que tem o poder de a tirar, pois é o único, também, que tem a capacidade de a dar.

Celebrar, hoje, Jesus com este título – de Rei e Senhor – parece não ter cabimento… E não mesmo se, por Rei e Reino, pensamos em nobreza e riqueza, em palácios e exércitos. Mas este Rei e Senhor é especial… Não tem palácio, nem exército, nem poder, nem riqueza. Além disso, a Sua vida é pouco recomendável. Junta-se aos pobres – a quem alimenta; aparece com pecadores – a quem perdoa; acolhe os marginais, os excluídos e os pequenos – que declara serem os primeiros no Seu Reino.

Quando lhe é perguntado, como ouvimos no Evangelho de hoje, se na verdade era rei, Ele responde sem hesitar, mas acrescenta o lugar (não é deste mundo), a sua constituição (verdade), os membros (seguidores da verdade), os destinatários (todos) e as condições: construir a verdade, a vida, a justiça, o amor. Os que ouvem a verdade seguem-no e imitam-no, servindo os irmãos… De facto, não pode ser deste mundo…

São várias as tónicas deste Reino, para além das diferenças externas: reina nos corações, na interioridade. O Seu Reino está dentro de nós. Além disso, este Rei não vem para ser servido. Ele é Quem serve e, a tal ponto, que Se entrega e dá a vida. De facto, não é deste mundo!… Porém, apresentando o Seu Reino e condições, torna-se exigente, não Se compadece com tíbios ou hesitantes (quem põe as mãos no arado) e não Se deixa substituir nem deixa partilhar o Seu lugar: “não podeis servir a 2 senhores”, diz Jesus com muita clareza. O Seu amor é radical e não admite neutralidades, hipocrisias ou jogos de conveniências ou de interesses (“por Mim ou contra Mim”). Não pode ser deste mundo!…

As características que dá ao Seu Reino não estão em saldo nem vendem jornais nem fazem primeiras páginas. Também não têm muita saída e, talvez mesmo, não estejam muito na moda. É um Reino de verdade e de vida; de santidade e de graça; de justiça e de solidariedade; de amor e de paz; de liberdade e de perdão; de alegria e de tolerância; de humildade e de mansidão; de pobreza e de pureza… Numa palavra, é o Reino das Bem-aventuranças… Este Reino que se apresenta na 1ª leitura como “eterno e que não será destruído”, pois o Rei é o “Alfa e o Ómega, Aquele que é, que era e que há-de vir, o Senhor do Universo”, como se lê no Livro do Apocalipse, proclamado na 2ª leitura. Ainda não é o Reino implantado neste nosso mundo!…

Porém, é a este Reino que Ele chama os Seus membros, os Seus amigos e seguidores… embora haja muitos que não querem nada com Ele. Uns porque O não conhecem; outros porque não querem trabalhos; outros porque se deixam seduzir por alternativas…Vão andando por aí mas nunca se comprometem muito e, às tantas, dizem mesmo NÃO e fogem. Abandonam o barco onde entraram… sem assumirem compromissos… E, hoje, ser Cristão é estar comprometido com a construção do bem comum, com a construção da igualdade justa e solidária, com o combate à corrupção, à hipocrisia e à mentira… É estar comprometido com a leitura cristã do Evangelho… É estar comprometido com Jesus Cristo…

E eu vejo aqui – e vejo em todas as Comunidades da nossa Diocese – pessoas comprometidas em diversas frentes. Vejo aqui um grupo de pessoas que representam uma gloriosa história de compromisso na fidelidade e no amor à Igreja. História gloriosa que há pouco celebrou 75 anos de existência – a AC. Movimento inspirador e modelo de actuação, no estudo e na transformação das coisas terrenas segundo o projecto do Reino de Deus. Combate, durante estes anos, o défice, agora cada vez maior, de secularidade positiva e dialogante com o mundo. O método que orienta a sua pedagogia de ver, julgar e agir, leva a olhar e a comprometer-se com as realidades terrenas, deixa-se iluminar pela Palavra de Deus e Seus valores e inspira um compromisso sério, empenhado e lúcido pela transformação do mundo. Sim, importa assumir as consequências das opções, das atitudes, dos sinais exteriores e das palavras… para que a Fé cristã não seja uma vida de mentira, de hipocrisia e de incoerência…

Caríssimos Cristãos: a opção cristã de vida é um compromisso sério. Supõe uma resposta positiva a uma proposta vocacional. Responder SIM, significa querer dar uma configuração séria à vida, orientando-a pelos valores do Reino… Significa estar disposto a ser cristão nas opções e no estilo de ser pessoa e de estar no mundo. O cristão orienta-se por valores que dão sentido à vida: verdade, justiça, amor, perdão, solidariedade…

Não temamos as responsabilidades, pois o Senhor está e caminha connosco… A nós vem o Espírito Santo, com os Seus dons, para ajudar a que tudo seja mais fácil, a que tudo tenha sentido, a que haja coragem e forças para tudo ser possível e, sobretudo, a que haja alegria, muita alegria, para viver a fé e a esperança em Jesus Cristo.

Celebrar Jesus Cristo, Rei e Senhor do Universo é viver com o Espírito Santo e escolher o que é bom, belo e verdadeiro, dando o contributo para que a sociedade seja melhor, mais bela, mais justa e mais verdadeira. Faltam estes valores – muitas vezes – nas famílias, nas escolas, na política, na economia, nas associações, nos grupos, na comunicação social… São campos de trabalho onde vós, os cristãos leigos, deveis trabalhar… Queixamo-nos que o mundo está mal, que não há respeito nem valores! Que fazemos nós, cristãos, para o mundo ser melhor?

Queixamo-nos da Igreja: que não chama os jovens, que não atrai as pessoas, que é antiquada ou conservadora!… Que fazemos nós, os que cá andamos, para chamar e tornar atraente a participação?… Como vivemos as nossas relações em família, no trabalho, na escola, nas ruas?… Que testemunho damos aos que não pensam como nós?… Que consequências têm as nossas celebrações, a nossa oração, a nossa fé?…

Ser cristão é querer ser diferente, é votar de maneira diferente, sempre que estão em jogo valores fundamentais e decisivos do viver humano e é viver de maneira diferente… É querer ser activo e participativo na construção de uma sociedade melhor e de uma Igreja mais autêntica, mais evangélica e mais renovada. É levar para a vida a força, a luz e a fé que nos vêm do Espírito Santo e dos Seus dons… Só assim tem sentido estar aqui, cada Domingo e fazer a Profissão de Fé, cada Domingo, de forma séria, responsável e solene.

O dia de Cristo Rei marca o final de uma etapa e aponta para uma novidade que deve começar por ser interior e pessoal. Importa que essa novidade venha do coração, da consciência, do interior de cada um.

Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo e dos nossos corações! Tu chamas cada um a ser feliz, num caminho de serviço, onde a vida tenha valor e sentido. Envia sobre nós o Teu E. Santo para que em todos nós Ele derrame os Seus dons. Torna-nos generosos e disponíveis para aceitarmos, com alegria, a Tua vontade. Entra e fica no nosso coração para nos deixarmos inflamar pelo Teu amor, para que sejamos activos construtores do Teu Reino de paz, de justiça e de verdade. Tudo isto nós pedimos, ao Teu e nosso Pai, que é Fonte de Vida, Contigo e com o E. Santo.

AMEN

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