O Sacramento do Corpo e Sangue de Cristo: a festa da nossa Aliança com Deus
( Ex. 24, 3 – 8; Heb. 9, 11 – 15; Mc. 14, 12 – 16 . 22 – 26 )
Celebramos o Sacrifício e Banquete da Santíssima Eucaristia, na Solenidade do Corpo e Sangue de Cristo, na Quinta-Feira, a seguir à da Santíssima Trindade. As leituras do Ano B pedem para meditar o mistério da Eucaristia, como expressão da Aliança, entre Deus e o Homem, entre Deus e o Povo. O Mistério centra-se na Pessoa de Jesus, verdadeiro, único e eterno sacerdote e Filho de Deus, que se fez homem, para se oferecer, por nós, no memorial do sacrifício da cruz, criando a unidade da Igreja e selando, com o dom do Seu preciosíssimo Corpo e Sangue a nossa definitiva aliança, com Deus.
1.-Indo ao cerne do mistério, a Igreja canta: “Ó Sagrado banquete em que se recebe Cristo, se comemora a Sua Paixão, a alma se enche de graça e nos é dado o penhor da futura glória”. A Eucaristia torna presente o Sacrifício da Cruz, na oferta e comunhão do Corpo e Sangue do Senhor, que Ele nos dá, em alimento, enchendo-nos da graça, na expectativa de obter e participar nos frutos da Ressurreição gloriosa. Assim a Eucaristia é o coração da Igreja e do Mistério Pascal de Cristo e o sacramento da aliança eterna de união, com Cristo, pelo Espírito, em Deus. A Eucaristia é o gosto antecipado da vida gloriosa e celeste, sendo a aurora da feliz e eterna surpresa, com Cristo, em Deus.
2.- A Aliança de Deus, com o Povo de Israel, espelha a praxe cultural dos pactos e das alianças políticas dos soberanos com os vassalos, na antiguidade bíblica e pré-bíblica. O documento escrito era aceite pelas partes e selado, no sacrifício de comunhão, com a marca da aspersão do sangue do animal sacrificado. Moisés aspergiu o altar de Deus e com o resto do sangue aspergiu o Povo, que aceitou a vontade e os mandamentos de Deus. O sangue da vítima unia os contraentes, Deus e o Povo Eleito. Na Bíblia Grega a Aliança ou Pacto recebe ainda a conotação de Testamento, que só é executado após a morte dum dos contraentes. A Morte de Cristo e o Seu sangue são sinais da aliança nova, que garantem a herança eterna. De qualquer modo a ideia original de Aliança expressa a comunhão de vontades e propósitos, que no Antigo Testamento se resume deste modo: “ Vós sereis o meu povo, Eu serei o Vosso Deus”. Eu ser-vos-ei sempre fiel e Vós cumprireis aquilo que vos mando”.
- A nova Aliança com Deus foi selada não com sangue de animal, mas com o precioso sangue de Cristo, Filho de Deus, Supremo e Eterno Sacerdote, Pastor e Mediador entre Deus e o Homem, enquanto verdadeiro Deus e Homem. Jesus ofereceu-se, uma vez por todas, na Cruz, e a Eucaristia como Sacramento da Sua presença real, documenta e testemunha o amor do Filho de Deus, que nos amou até ao extremo de dar a vida e de morrer por nós. Deste modo, Jesus é o Sacerdote oferente e o Cordeiro ou a vítima oferecida em oblação a Deus. Ele é o altar e o templo. O Pai mandou o Filho ao mundo para ser um de nós e como nós, excepto no pecado. Jesus Ressuscitado que nos leva ao Pai e nos abre a porta do Céu, é a grande surpresa e novidade, é o Corpo glorioso, não feito por mãos humanas, mas a obra inefável de Deus.
- Por três vezes, Marcos, ao narrar a Instituição da Eucaristia, fala da Páscoa e da Ceia pascal, cenário e horizonte, em que Jesus se entrega para realizar a verdadeira, única e eterna aliança, que nos dá a vida, nos liberta e aceita o serviço dado, por nós, a Deus, em liberdade. A Eucaristia está conexa com a Páscoa, com a Passagem libertadora, com a gesta salvífica do Êxodo e converte-se na síntese das maravilhas de Deus.
A Eucaristia faz a Igreja. Antes de morrer, Jesus pede pela unidade: “Que todos sejam um, como Tu, ó Pai, estás em Mim e Eu em Ti; que também eles sejam um em nós, para que o mundo creia que Tu me enviaste” (Jo.17, 21). O Corpo e Sangue de Cristo, dado em alimento, é o sinal sacramental que significa e realiza a aliança definitiva com Deus, não selada, com sangue de animais, mas com o Precioso Sangue do Filho de Deus.
Ao instituir a Eucaristia, Jesus deixa de comer para dar a comer aos Doze o alimento novo que sela a aliança nova e eterna com Cristo, em Deus. Jesus interrompe a Ceia Pascal, para criar algo novo e repartir o pão e entregar o cálice, com vinho, que passa a ser o alimento novo, descido do céu, obra de Deus e sinal obreiro da nova e eterna aliança com Deus, em Cristo, no Espírito. A Eucaristia é obra da Santíssima Trindade, é uma nova criação do dom celeste, que o Espírito, realiza na conversão e transformação ou transubstanciação do pão e do vinho que o Espírito faz. Na Epiclese ou oração da Invocação do Espírito Santo, que precede o relato da Instituição da Eucaristia, pedimos a vinda do Espírito, para que o pão e o vinho apresentados, se transformem no Corpo e Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo.
- – Na Solene Procissão, pelas ruas da Cidade iremos louvar, agradecer e adorar Jesus Sacramentado, reconhecendo que se não estabelecermos a frutuosa e íntima Aliança com Cristo e não nos deixarmos converter e transformar, por Ele, com Ele e n’Ele não o recebemos nem o comungamos. Há que discernir, confessar, adorar e reconhecer o verdadeiro pão do Céu, para não comermos nem bebermos a nossa condenação como adverte S. Paulo. Só viveremos unidos em aliança com Deus se crescermos e vivermos na comunhão fraterna e eclesial, pois “ ninguém pode ter a Deus por Pai se não quiser ter a Igreja por mãe” como diz S. Cipriano mártir e bispo de Cartago. E S. João o grande paladino do amor e da Eucaristia, diz, peremptório, na sua Primeira Carta: “ninguém diga que ama a Deus a quem não vê se não ama o irmão que vê”.
Durante a celebração e na Procissão, adoremos Jesus Sacramentado, dizendo:
“ Alma de Cristo santificai-me, Corpo de Cristo salvai-me, Sangue de Cristo inebriai-me, água do lado de Cristo lavai-me, paixão de Cristo confortai-me, ó bom Jesus ouvi-me, dentro das Vossas chagas escondei-me, do inimigo maligno defendei-me, na hora da minha morte chamai-me e mandai-me ir para Vós, para que Vos louve, com os Vossos Santos, pelos séculos dos séculos. Amen”.
Bendito, louvado, adorado e desagravado seja o Santíssimo Sacramento da Eucaristia, fruto do ventre sagrado da Virgem Puríssima Santa Maria!
Vila Real, Festa do Corpo de Deus, 31 de Maio de 2018.
D. Amândio José Tomás, bispo de Vila Real