Homilia do bispo de Santarém na missa de Ano Novo

1. Acreditar e preparar um futuro melhor. Reunimo-nos para celebrar o primeiro dia do novo ano que a igreja dedica a Santa Maria Mãe de Deus. Confiamos à sua proteção maternal as dificuldades que vamos enfrentar no novo ano e pedimos ao Senhor que nos abençoe e faça brilhar sobre nós a luz do Seu rosto nestes momentos de muitas preocupações e receios que ameaçam o novo ano 2013.

Cada ano que começa é sempre encarado como uma nova oportunidade na qual projetamos a aspiração de uma vida melhor, de um futuro mais risonho. Todo o ser humano, é animado pela esperança. Todos aspiramos a uma vida com mais qualidade, ventura, plenitude. É um anseio humano profundo. Vivemos da esperança. Um ano que começa é um reacender da esperança.

Para nós, crentes em Jesus Cristo, a esperança está profundamente associada à fé. Deste modo, o “ano da fé” que estamos a celebrar, deve ser entendido como um ano para fortalecer a esperança. Mas, no meio de tantas nuvens negras da crise, teremos razões para viver com esperança? Ou estamos a criar uma ilusão para nos esquecermos das dificuldades da crise? Que reazões temos para viver com esperança?

Para preparar um mundo melhor não podemos exigir as soluções perfeitas ou as melhores condições já no imediato ou a curto prazo mas devemos ter em perspetiva o amanhã e olhar para o futuro. A esperança leva-nos a ver a longo prazo, a confiar em Deus, na vida e nas capacidades humanas de rever e refazer percursos e comportamentos. A esperança traduz-se, portanto, em prever, programar e pôr em prática, com coragem e esforço, um caminho progressivo para um futuro melhor. Não deixamos condições mais favoráveis às gerações de amanhã, se não nos sacrificarmos no presente. Se quisermos tudo em função do nosso proveito imediato podemos tornar-nos uma geração egoista, sem sentido de solidariedade com a sociedade que hão de vir. 

Praparar o futuro não é cuidar sómente da economia. Nem só de pão vive o homem. Todos precisamos de pão, todos têm direito ao trabalho e todos sofremos quando o pão não chega ou o desemprego atinge muita gente, como agora. Mas a felicidade, o sentido e a realização da vida humana, não dependem só do bem estar económico, sobretudo não dependem só do luxo, do consumismo, do estilo de vida acima das nossas posses. Preparar um futuro melhor, não é apenas pagar as dívidas económicas mas procurar também mais justiça, mais fraternidade e solidariedade, mais paz e alegria. Esse é o sentido da nossa esperança que tem como conteúdo os valores do reino de Deus, reino de paz, justiça e alegria no Espírito Santo.

2. Um novo modelo de desenvolvimento. Deste modo, uma questão fundamental para construir um futuro melhor, que o Papa Bento XVI aborda na sua mensagem de ano novo de 2013, é a necessidade de um novo modelo de desenvolvimento e uma nova visão da economia. A crise, como muita gente esclarecida reconhece e o papa recomenda, deve ser uma ocasião para discernir um novo modelo económico. De facto, como diz Ratzinger, “o modelo que prevaleceu nas últimas décadas,  apostava na busca da maximização do lucro e do consumo, numa ótica individualista e egoista, que pretendia avaliar as pessoas apenas pela sua capacidade de dar resposta às exigências da competitividade. (…) Porém o desenvolvimento económico suportável, isto é, autenticamente humano, tem necessidade da gratuidade como expressão da fraternidade e da lógica do dom. Concretamente, na atividade económica, o obreiro da paz cria relações de lealdade e reciprocidade com os colaboradores e os colegas, com os clientes e os usuários. Ele exerce a atividade económica para o bem comum, vive o seu compromisso como algo que ultrapassa o interesse próprio, beneficiando as gerações presentes e futuras. Deste modo, sente-se a trabalhar não só para si mesmo, mas também para dar aos outros um futuro e um trabalho digno. (Mensagem Ano Novo 2013 nº 5)

3. Pedagogia da paz. O apelo a uma vida humana plena, feliz e bem sucedida, que se levanta nos corações de toda a gente, coincide, segundo Bento XVI na referida mensagem, com o anseio de paz. O homem é feito para a paz, para a harmonia, para o desenvolvimento integral. Há uma vocação natural da humanidade à paz (nº1). A este respeito o Papa oferece-nos uma reflexão de grande riqueza e atualidade sobre a bem-aventurança do evangelho: “Bem-aventurados os obreiros da paz”.

Como bem aventurança, a paz é promessa e dom de Deus e, ao mesmo tempo, missão e tarefa dos crentes. Recordando o cinquentenário da Encíclica “Pacem in terris” de João XXIII, o atual sumo pontífice, lembra que Deus promete a paz a quantos se deixam guiar pelas exigências da verdade, da justiça e do amor.

Conclui, nesse sentido, que “é necessário propor e promover uma pedagogia da paz. É necessário educar os homens a amarem-se e a educarem-se para a paz, a viverem mais de benevolência que de mera tolerância. Incentivo fundamental será dizer não à vingança, reconhecer os próprios erros, aceitar as desculpas sem as buscar e, finalmente, perdoar, de modo que os erros e as ofensas posssam ser verdadeiramente reconhecidos a fim de caminhar juntos para a reconciliação. Isto requer uma pedagogia do perdão (…). A pedagogia da paz implica serviço, compaixão, solidariedade, coragem e perseverança” (7).

O nascimento do Senhor é o nascimento da paz, lembra São Leão Magno. Ele veio congregar numa só família os filhos de Deus dispersos e divididos pelo pecado. Nossa Senhora Mãe de Deus deu ao mundo o Principe da paz e colabora ativamente na difusão da Sua mensagem de justiça e fraternidade. Guiados pelo evangelho e sob a proteção da rainha da paz entreguemo-nos também à construção de um mundo com mais justiça e concórdia. Amen. 

D. Manuel Pelino Domingues, Bispo de Santarém

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