Homilia do bispo de Santarém na Missa Crismal

Ungidos para levar a Boa Nova do amor que salva

“O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Ele me ungiu para anunciar a boa nova aos pobres”

É um momento de alegria e de graça a celebração da Missa Crismal, onde se benzem os santos óleos e os presbíteros diocesanos renovam a entrega confiante e jubilosa ao ministério ordenado. Demos graças ao Senhor que nos congrega na unidade e nos fortalece para a missão.

Saúdo com muito apreço os presbíteros presentes e os que não puderam vir. Manifesto, diante de Deus e da assembleia reunida, o meu vivo reconhecimento pela colaboração sempre pronta e a admiração pelo zelo tantas vezes sacrificado no exercício do ministério. Não somos muitos. Neste momento temos na atividade pastoral diocesana 64 presbíteros, sendo quatro provenientes de outras dioceses e seis religiosos. Oito, por idade e mérito, estão dispensados de responsabilidades pastorais. Faleceram dois (Padres José Américo e Fernando Diogo) e ordenou-se apenas um (P. Ricardo Pinto). Com a força do Espírito Santo e a nossa colaboração dedicada, daremos o melhor contributo para a missão que o Senhor espera de nós. Reafirmo o meu propósito de vos animar na fidelidade corajosa e feliz à mesma missão apostólica e de vos apoiar na ação pastoral integrada na unidade do Corpo de Cristo.

Saúdo cordialmente os vários membros do povo de Deus na riqueza dos carismas e ministérios: os Diáconos Permanentes a quem agradeço a generosidade no serviço que prestam à Igreja; os seminaristas candidatos ao ministério sacerdotal e os candidatos ao Diaconado Permanente. Os Religiosos (as) e noviços; Os membros do povo de Deus que dão apoio aos ministros sagrados e às vocações sacerdotais. Todos os presentes, irmãos e irmãs no Senhor.

Dispensadores dos mistérios de Deus

A missa Crismal, concelebrada pelo presbitério e onde são benzidos os Santos Óleos, convida-nos a considerar a vocação cristã como vocação à santidade e a aprofundar a orientação fundamental da nossa vida de Ministros de Deus. Na verdade, os santos óleos são um sinal sacramental da ação do Espírito Santo que acompanha e renova permanentemente a Igreja. “O Espírito do Senhor está sobre mim. Ele Me ungiu e me enviou a anunciar a Boa Nova aos pobres” profetizou Isaías e confirmou Jesus. A unção com óleo dos catecúmenos fortalece os fiéis para o combate espiritual contra as forças do mal; a unção dos enfermos alivia o sofrimento e pode dar-nos o dom da cura; a unção do Crisma concede-nos a alegria da vida cristã e a força para a missão. Nos sacramentos recebemos, portanto, o dom do Espírito Santo, luz e força dos filhos de Deus, segredo da renovação interior dos fiéis e alma da missão da Igreja.

Assim, concluímos que a nossa vocação cristã fundamental é a de viver segundo o Espírito e não segundo os impulsos da natureza humana ou os critérios mundanos, produzindo os frutos do Espírito e não as obras do mal; A celebração fundamenta também a compreensão do estatuto dos presbíteros como cooperadores do bispo e dispensadores dos mistérios do Senhor. Consagrados para santificar o povo de Deus, nós sacerdotes, levamos em vasos de barro o tesouro da salvação. Não somos donos dos dons da Igreja mas servos e mediadores. Jesus Cristo é, segundo a leitura do Apocalipse que ouvimos, “a Testemunha fiel, Aquele que nos ama e pelo seu sangue fez de nós um reino de sacerdotes para Deus Seu Pai”. Nele se manifesta o amor que salva, que se sacrifica pela vida do seu povo, liberta os oprimidos, redime os cativos e dá vista aos cegos. Esse amor é a Boa Nova que os pobres, os aflitos, os feridos deste mundo esperam de nós seus continuadores. A nossa missão é realizada em nome do Senhor e, por isso, devemos revestir-nos de sentimentos de fidelidade, de humildade e de alegria. Estas atitudes, recomendadas nas leituras da Missa crismal, devem marcar a nossa identidade de Ministros do nosso Deus.

Testemunhas do amor que salva

A primeira característica do administrador é a de ser fiel ao amor. Proclamamos a boa nova de Cristo não tanto por palavras mas predominantemente por gestos, acontecimentos e atitudes onde transpareça o amor feito de despojamento e entrega de si mesmo. “Só o amor permanece”, afirma o hino da caridade da Carta aos Coríntios. A vida passa depressa, as responsabilidades pastorais terminam e o que fica depois da nossa passagem? No coração da Igreja e na memória dos fiéis permanece o amor vivido na entrega à missão, na simplicidade e na afabilidade. Como aprendemos no mesmo capítulo da Carta aos Coríntios, podemos ser pregadores brilhantes mas se não tivermos amor somos como bronze que faz barulho; podemos mostrar muitos dotes e capacidades mas se não tivermos amor de nada aproveita. O amor fiel é perseverante na missão, é responsável no zelo, é paciente e prestável no serviço.

O amor assenta numa base que necessita de ser constantemente cultivada: a humildade. É a virtude primária e indispensável para que Deus possa agir através de nós. “O amor não é arrogante nem orgulhoso, nada faz de inconveniente, não procura o seu próprio interesse, tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta”. É esta atitude que aprendemos com o nosso Salvador que, especialmente na Semana Santa, nos é apresentado como o exemplo supremo de humildade. Para interiorizar e traduzir a humildade, prostrámo-nos por terra na ordenação sacerdotal. Hoje revivemos esse gesto e renovamos a promessa de nos configurarmos com Cristo na renúncia a nós mesmos. Ao celebrarmos, da parte da tarde, o memorial da ceia do Senhor e recordar o rito em que Jesus se despojou do manto e se abaixou para lavar os pés aos apóstolos, deixemo-nos assombrar e conduzir por este gesto impressionante de humildade. Sem esta virtude não podem desabrochar as outras disposições interiores necessárias para sermos fiéis ao ministério. Sem humildade, não tocamos também o coração dos nossos contemporâneos para acolherem o evangelho.

A humildade leva-nos a depositar a nossa confiança na força do Senhor: “Ungi o meu servo com Óleo santo. Estarei sempre a seu lado e com a minha força o sustentarei. A minha fidelidade e bondade estarão com ele”, cantámos hoje no salmo. A confiança no Senhor leva-nos a semear o evangelho mesmo na adversidade e no sofrimento, com a convicção de que o desígnio de salvação se realiza pelo poder salvador da cruz. O Senhor assegura-nos também a nós o que promete ao apóstolo Paulo: “Basta-te a minha graça pois a força manifesta-se na fraqueza…Pois quando sou fraco então é que sou forte” (2 Cor 12, 9.10). A confiança em Deus tem a sua referência no mistério da cruz e da ressurreição, cultiva-se pelo crescimento da vida espiritual que fundamenta a nossa união e configuração com Cristo.

Servidores da alegria

Fidelidade, humildade e confiança geram alegria e motivam para anunciar o evangelho como uma boa nova para o mundo de hoje. Precisamos de presbíteros que redescubram o encanto da fé como força de salvação, como fermento de um mundo novo, atentos às expectativas dos homens do nosso tempo, como a sentinela que descortina na escuridão da noite os sinais do raiar da aurora, com uma atitude construtiva perante a sociedade e a igreja. Presbíteros que cumpram a profecia de Isaías e anunciem o evangelho de forma atrativa, como o ano da graça do Senhor, como consolação para os aflitos, com cânticos de louvor e não com espírito abatido. Num ambiente de desalento e de insegurança sobre o futuro, o próprio mensageiro não está imune ao desânimo, ao desgaste, ao desencanto. Por isso, é importante reanimar o dom que recebemos, repensar as opções assumidas na ordenação, fortalecer a fidelidade, a confiança, o amor e a alegria. Como podemos levar o óleo da alegria e cânticos de louvor com um traje de luto e um espírito abatido?

“Não somos donos da vossa fé mas servos da vossa alegria” confessa São Paulo na segunda carta aos Coríntios (2Cor 1,24). Jesus é o servo por excelência e chama-nos a servir também. Ser servo é fazer o que Ele nos pede através da Igreja. Sirvamos o Senhor com fidelidade e humildade, com confiança e alegria, pois o seu evangelho é fonte de liberdade e de esperança para a Igreja e para o mundo. Amen.

Santarém, 21 de abril de 2011

D. Manuel Pelino Domingues, Bispo de Santarém 

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