1.Da vocação à missão
“O espírito do Senhor está sobre mim, porque o Senhor Me ungiu e me enviou (..)a proclamar um ano de graça da parte do Senhor” (Is 61, 1-9 e Lc 4, 16-21).
Esta palavra de Isaías, retomada por Jesus, na sinagoga da sua terra, é hoje proclamada e dirigida a cada um de nós e, através de nós, é destinada à Igreja de Aveiro.
Compreendemos que Isaías e Jesus se encontrem nesta mesma página do evangelho a dizer-nos que é também nossa esta vocação de profeta e esta missão de discípulo.
Participando da unção de Cristo, os seus discípulos constituem um povo sacerdotal, um povo messiânico, que leva em si todas as esperanças da humanidade. Animado, assim, pelo Espírito Santo, este povo é chamado a prolongar no tempo e a dilatar no espaço a ação salvadora de Cristo.
Do mesmo modo que há «um só Deus, um só Senhor, uma só fé e um só batismo» (Ef. 4, 5), também a humanidade inteira é chamada a reunir-se num só povo. Este povo não é, apenas, a soma de vários povos ou o acumular de diferentes épocas da história nem muito menos a junção fortuita das diversas pessoas que conhecemos mas sim a assembleia santa e o povo sacerdotal dos filhos de Deus, reunidos nesta «casa e escola de comunhão» ( João Paulo II, NMI 43) que é a Igreja, «sacramento de salvação para a humanidade» ( Vaticano II, Lumen Gentium, 1).
Para chegar aqui não bastaram os profetas e os sacerdotes, os reis e os juízes de Israel. Todos foram necessários. Mas não foram suficientes. Em Jesus Cristo, é Deus que se dá à humanidade. É a vida de Deus que recebemos para que tenhamos a vida n’Ele. Em Jesus Cristo, é Deus que cuida do seu povo e que conduz a humanidade.
Nestes tempos difíceis, de uma humanidade fragilizada por incontidas dificuldades e aumentadas desventuras que nos conduziram a esta crise de civilização que vivemos, mais necessário se torna ouvir a profecia de Isaías e mais urgente se faz assumir a missão que Jesus Cristo confiou aos discípulos.
2. Um mistério de graça e um ministério de bênção
Ungidos pelo mesmo batismo e confirmados pelo sacramento do crisma, somos membros deste mesmo povo sacerdotal de quem nascemos e a quem nos destinamos. De Jesus Cristo recebemos a vocação e a missão, em ato sacramental que nos unge para sempre no Espírito do Senhor e nos envia a anunciar o evangelho. Queira Deus consumar, dia a dia, em cada um de nós sacerdotes, o bem que, desde a nossa ordenação sacerdotal, em nós começou!
Assim, a missão que Jesus confiou aos Apóstolos e que na sucessão ininterrupta do tempo deles recebemos e convosco partilhamos não é uma mera delegação de poder. É um mistério de graça e um ministério de bênção.
Somos, irmãos sacerdotes, sacramentalmente sinais do dom de Deus para a vida da Humanidade. E este sinal não se escreve em carta de missão onde o trabalho se define ou em pormenores de ação onde a missão se descreve, mas sim na oferta plena da nossa vida, no dom total de nós mesmos, feito com alegria e com esperança.
Conhecemos as nossas fraquezas e limitações, mas nem isso nos intimida diante da grandeza da missão nem nos perturba perante a dimensão da responsabilidade. Deus, também aqui, transcende a nossa fragilidade pela beleza do seu amor. E deste amor de Deus em nós expresso e da permanente generosidade que o amor de Deus em nós inspira, irradia a beleza do serviço a que Deus nos chama e que a Igreja nos pede.
Caros sacerdotes: conheço a vossa generosidade e disponibilidade, fonte de fecundidade apostólica, de quem tantas vezes se excede em dedicação e trabalho para que os dons de Deus se multipliquem e tornem visíveis no serviço da Igreja e no coração do mundo.
3. Da ousadia da profecia ao dinamismo da esperança
Somos pastores e guias de uma humanidade que não parou no tempo, que não é estática e que não se pode fechar aos desafios da cultura. Somos chamados a compreender, acompanhar e iluminar este caminho da humanidade.
Uma das nossas prioridades consiste em sermos capazes de perceber, iluminados pelo Espírito de Deus, aquilo que transporta em si dinamismos de futuro e ver que é aí que se deve centrar a nossa missão.
Esta missão desenha-se agora na nossa Diocese com formas de renovado vigor que vos convido a viver com acrescido entusiasmo. Aproxima-se a celebração do Jubileu dos setenta e cinco anos da restauração da nossa Diocese. Viveremos este tempo que Deus nos concede como graça e como bênção, em Missão Jubilar.
Sabemos todos quanto os caminhos a percorrer e a mobilização pastoral que de toda a Comunidade diocesana se espera depende de nós bispos, presbíteros e diáconos. Convoco-vos para, a exemplo de Isaías e ao jeito de Jesus, também nós «proclamarmos um ano de graça da parte do Senhor» (Is 61, 9 e Luc 4, 19).
Sei e sinto que temos recebido muito como Diocese. São muitas as razões para agradecermos a Deus mas temos caminho pela frente e Deus continuará a ser generoso com o seu povo. Também em vocações, em alegria e em perseverança de vida sacerdotal.
4. Da vitalidade da Igreja à generosidade da missão
A vitalidade da nossa Igreja nasce primeiro da graça de Deus que permitiu e tornou fecundos tantos anos de trabalho vivido e realizado ao longo do tempo, mas é também fruto laborioso do caminho de evangelização e de renovação continuamente retomado.
Contemplemos e agradeçamos a beleza da Igreja que somos e do ministério a que fomos chamados. A liturgia, concretamente a Missa Crismal, permite-nos passar para lá da nossa consciência individual e une-nos ao povo de Deus, às famílias, a que demos acrescida atenção nesta etapa pastoral, às comunidades cristãs, aos consagrados (as), aos diáconos e ao presbitério desta Igreja de Aveiro.
Há uma generosidade profunda dos sacerdotes à missão e dou graças a Deus pelo trabalho agora feito no campo específico da formação dos futuros sacerdotes, desde o Pré-Seminário, ao Seminário e ao acompanhamento dos novos sacerdotes.
Saúdo-vos, caros seminaristas, com particular afeto e dedicada esperança. Sei quanto a vossa formação pede tempo e exige perseverança. Alegramo-nos convosco e rezamos por vós. Aqui estaremos de novo, com alegria, nesta Sé para a instituição de Ministérios no próximo dia 15.
É igualmente a pensar no nosso presbitério e sempre de olhos postos no futuro que vemos erguer, com íntima alegria, a nossa Casa Sacerdotal. Deus concedeu-nos este dom de pertencermos a uma Igreja viva com um presbitério ativo, unido nesta comunhão de irmãos de coração livre, generoso e disponível para dilatar o horizonte do Seminário àqueles que são chamados a fazer da idade, da aceitação da doença, da oração e da contemplação a sua missão. O santuário de gratidão que ali se levanta é obra de Deus por vós desejada e para vós edificada.
Recordo com saudade e com gratidão pela vida e pelo ministério os Padres Augusto Fernandes da Costa, João Paulo da Graça Ramos, Viriato da Graça Bodas, Agostinho Tavares Rebimbas e Veríssimo Lemos Peliz e o Diácono José Figueira da Silva e quantos, membros das nossas famílias, partiram ao encontro de Deus.
Felicito os sacerdotes em jubileu sacerdotal de 50 anos, Padre Manuel António Carvalhais, e de 25 anos, Padres Filipe Manuel da Silva Coelho, Luís Manuel Barbosa de Oliveira, Manuel Martins Simões Melo, Paulo Manuel Teixeira Gandarinho e Rogério António da Cruz Oliveira. A nossa alegria estende-se às suas famílias e comunidades.
Convosco, irmãos sacerdotes, quero viver a alegria da vossa fidelidade e do vosso testemunho e dou graças pelo dinamismo permanente que a missão de todos exige.
5.Uma prece de confiança
Confiemos, irmãos e irmãs, a Maria, Mãe de Deus e Mãe da Igreja, e a Santa Joana Princesa, nossa Padroeira, esta Igreja que somos e os propósitos assumidos e horizontes sonhados para que a sua bênção e proteção, nos inspirem os caminhos de missão a percorrer com alegria e perseverança.
Sé de Aveiro, 5 de abril de 2012
D. António Francisco dos Santos, bispo de Aveiro