As proximidades do padre
1. Proximidade(s)
Estamos, no nosso percurso pastoral arquidiocesano, a aprofundar a identidade e pertença a uma Igreja sinodal e samaritana.
O programa de vida para uma Igreja com este rosto está traçado pelo próprio Jesus Cristo, que realiza a profecia de Isaías: «O Espírito do Senhor está sobre mim, porque Ele me ungiu, para anunciar a Boa Nova aos pobres. Ele me enviou a proclamar a redenção aos cativos e a vista aos cegos, a restituir a liberdade aos oprimidos, a proclamar o ano da graça do Senhor» (Lc 4, 18-19). Sentimos também a proximidade de Deus, ao escutar na segunda leitura, retirada do livro do Apocalipse: «fez de nós um reino de sacerdotes para Deus, seu Pai» (Ap 1, 6).
Vamos celebrar o coração do coração do Ano Litúrgico: o Tríduo Pascal.
Antes desta centralidade, viemos à nossa antiga e sempre nova igreja catedral. Ela é o símbolo e o princípio de comunhão eclesial e, simultaneamente, desejo de contribuir para a coesão social, onde possamos cuidar-nos com dignidade e respeito.
É com este quadro e ambiente que hoje, queridos sacerdotes, me proponho a meditar convosco a proximidade (as proximidades) que nos caracterizam… As proximidades do padre, como nos lembra o Papa Francisco, são quatro: com Deus, com o Bispo, com o Presbitério e com o Povo santo de Deus.
Somos chamados à comunhão com Deus e com os outros. Damos igualmente profundas graças a Deus pelas pessoas consagradas que vivem, rezam e testemunham o carisma recebido à luz da santidade da Palavra de Deus na nossa Arquidiocese. Juntos somos a Igreja sinodal e samaritana!
«Amar é querer que o outro exista»; por isso, «não busques o próprio bem. Preocupa-te com a caridade, prega a verdade, e alcançarás a eternidade na qual encontrarás a segurança» (Santo Agostinho).
- Presbitério bracarense, que fazes da tua proximidade sacramental?
Durante o tempo favorável da Quaresma, peregrinei ativamente convosco, os presbíteros dos 14 arciprestados da nossa querida Arquidiocese. Em cada um dos lugares do presbitério, escutámos o Espírito Santo e escutámo-nos uns aos outros na proximidade fraterna.
Do coração, vos agradeço: bem hajam, estimados presbíteros!
No evangelho de Lucas, o fio condutor do nosso plano pastoral, deparamo-nos com um colóquio entre Jesus e um doutor da lei (Lc 10, 25-37) sobre o preceito do amor que se concentra no dúplice mandamento do amor a Deus e ao próximo. Jesus realça a verdade da lei natural inscrita no coração de cada homem e não se limita a dar os parabéns ao doutor da lei, mas transmite ao seu interlocutor um juízo positivo.
E vem a questão do próximo. Quem é o próximo que o mandamento me obriga a amar?
Deus propôs uma única lei para todos os homens. Certamente, o sacerdote e o levita levavam a lei inscrita na testa e no braço, como era habitual. Ao contrário, para Jesus e o samaritano da parábola, a lei de Deus conserva-se no coração, escutando-a e praticando-a.
A pergunta do doutor da lei, «Quem é o meu próximo?», permite a Jesus alterar toda a perspetiva vigente e dizer que o próximo é todo aquele que precisa de mim. É a necessidade que o torna próximo de mim. Por isso, perguntamo-nos: de quem sou próximo?
O samaritano é apresentado em paralelismo com os dois personagens bem conotados e caracterizados: vai a caminho, viu; passou junto do ferido. A atitude é totalmente diferente – encheuse de compaixão. O efeito desta narrativa fictícia não traz só consequências sobre a definição de «próximo», mas diz respeito também às condições necessárias para receber a herança da vida eterna.
A Liturgia celebra o mistério de Cristo, como o bom samaritano da Humanidade. A Eucaristia renova em nós o amor de Cristo e pede-nos que, como Ele, amemos até os nossos inimigos e que façamos nosso próximo até o mais afastado.
O grande Arcebispo, São Bartolomeu do Mártires, cujo lema era «arder e alumiar», escreveu no seu livro que se tornou clássico, O Estímulo dos Pastores: «há feridas cuja cura se não consegue lancetando-as, mas curam-se untando-as com bálsamo de azeite».
Esta mistura de bálsamo com o azeite é o Santo Crisma, azeite e perfume que, consagrado nesta Missa Crismal, serve para a celebração dos sacramentos do Batismo, da Confirmação, da Ordem dos Presbíteros e dos Bispos e para a dedicação da Igreja e do Altar.
Aqui, o azeite é como «o sacramento do Espírito Santo». Pode até dizer-se «o sacramento do azeite», enquanto o azeite remete para a unção, ou seja, para Cristo, o ungido do Pai.
A parábola conclui com as palavras «Então vai e faz o mesmo». O mesmo Jesus Cristo, o bom samaritano, que diz: «vai e faz o mesmo», continua a dizer «vem e segue-Me».
O Padre é «escolhido entre os homens e constituído em favor da humanidade» (Heb 5,1). A prática da proximidade humaniza a Humanidade e cuida as feridas: da fraternidade, das comunidades, da casa comum, das relações familiares, dos jovens, dos pobres e dos idosos.
3. O Padre, bom e feliz samaritano da Humanidade
Sede felizes e alegres na vida boa do Evangelho. Sede bênção para todos.
Não acumuleis riquezas pessoais e multiplicai o bem ao serviço de todos e em especial dos que mais precisam; não andeis tristes nem fomenteis a murmuração nem a intriga; sede próximos e amigos de todos, sobretudo dos jovens e dos pobres e das pessoas mais velhas e levai-lhes carinho e ternura na visita aos doentes e aos mais sós; não procureis o poder, o dinheiro, a fama. Olhai que o ministério presbiteral não se compra nem se vende. Sede firmes na fé, alegres na esperança e generosos na caridade; mostrai na vida que a fé é o maior desafio e é simples; todavia não está a saldo.
Sede bons e dai a vida pelo povo de Deus; dai tempo às pessoas, não sejais como aqueles que estão sempre ao telefone e sempre inacessíveis. Não sejais apenas presbíteros, sede membros efetivos e afetivos do presbitério. Nunca realizeis a vocação e a missão pastoral sozinhos. Sede com os outros presbíteros, diáconos, consagrados e fiéis leigos, o homem da comunhão e da missão.
Na ordenação do presbítero, a Igreja pede ao Pai: «renovai em seu coração o Espírito de santidade…» e depois o eleito exprime a vontade: de exercer o ministério sacerdotal no grau de presbíteros, como cooperador do bispo; de pregar o Evangelho; de rezar pelo povo; de se consagrarem pela salvação de todos os homens; de obedecer a Deus na pessoa do bispo. Que a função não prevaleça sobre a unção.
No dizer do jovem poeta Daniel Faria, que se preparava para ser padre: «Nunca conheci terreno mais fértil do que as mãos juntas, festa maior do que as mãos afastadas, prodígio maior do que as mãos impostas» (Daniel Faria).
Hoje, a tradução em língua portuguesa da terceira edição do Missal Romano torna-se “típica” para as dioceses em Portugal. Esta oportunidade de graça seja fonte de espiritualidade para melhor celebrar e viver a eucaristia. Para tal, dediquemos tempo, oração, estudo ao serviço dos santos mistérios.
Ao presbitério está intimamente ligado o Seminário Maior Conciliar. Este continua a ser a escola do Evangelho que forma os futuros presbíteros, para seguirem o único Mestre que é caminho, verdade e vida. Na verdade, «não temos o poder de fazer nascer novas vocações, mas temos o dever de testemunhar uma vida significativa» (D. F.-X. Bustillo).
Não faltarão os bons pastores à nossa Arquidiocese de Braga se as paróquias forem autenticamente cristãs, onde se celebra o Mistério, se escuta a Palavra e se contempla o rosto do Amor.
Se não se descobre o sentido do Mistério ao ministério sacerdotal, não se entende como pode um jovem, ao escutar na vida a palavra «segue-Me», renunciar a tudo por Cristo, na certeza de que, por esta decisiva estrada, a sua personalidade humana se realizará plenamente.
Em consequência, auguramos e ao mesmo tempo intercedemos pelo florescimento de uma nova primavera vocacional na Igreja presente em terras bracarenses.
D. José Cordeiro, Arcebispo Primaz