Caríssimo irmão no episcopado, D. Filipe, Bispo da Irlanda, meus caros irmãos, sacerdotes e diáconos, consagrados e leigos, vindos de diferentes partes de Portugal e de outras partes do mundo.
Aqui nos encontramos congregados à volta deste altar, sob o olhar materno de Maria, a Senhora do Rosário de Fátima, como peregrinos vindos individualmente ou integrando grupos paroquiais ou famílias religiosas e missionárias, que constituem uma referência inspiradora na vivência do próprio baptismo, no testemunho da fé, no anúncio do Evangelho do Reino, na construção de uma mundo mais fraterno.
Permiti-me que saliente dentre vós a Peregrinação Nacional da Família Missionária Espiritana, padres, irmãos, irmãs e leigos a eles associados, unidos em grande movimento missionário que faz do coração humano, ao perto e ao longe, campo privilegiado de anúncio do Evangelho.
Quero saudar e manifestar o meu reconhecimento a todos os missionários presentes e ausentes, pelo testemunho contagiante de uma vida "oferecida" e "gasta" ao serviço da missão ad gentes, eles que representam, segundo expressão do Papa João Paulo II – também ele grande missionário e catequista itinerante – "o paradigma do compromisso missionário da Igreja, que tem sempre necessidade de doações radicais e totais, de impulsos novos e corajosos" (RM 66).
Convosco louvo o Senhor pelo vosso serviço à missão da Igreja e invoca a força do Espírito para que a celebração jubilar dos 300 anos da morte do vosso fundador constitua verdadeiramente um tempo de graça e de dom para renovardes o vosso ardor missionário em fidelidade ao carisma e à missão de que sois herdeiros.
Saúdo, igualmente, a família carmelita em peregrinação nacional. Destas duas famílias queremos acolher hoje o apelo a sermos contemplativos e apóstolos, seduzidos pelo Pai, impelidos pelo Espírito, no seguimento de Cristo e no anúncio do Evangelho.
2. São certamente muitos e variados os motivos que aqui nos trazem neste domingo e inspiram a nossa peregrinação.
Motivos que nos levam a depositar sobre este altar o nosso louvor agradecido ao Pai por todos os dons recebidos, bem como a dirigir-lhe pelas mãos de Maria a nossa invocação filial e confiante, certos de que, pela intercessão de Jesus, seu Filho, nos escuta e atende nas nossas dificuldades, anseios, projectos…
A nossa peregrinação a este Santuário deve despertar em cada um de nós a disposição e a disponibilidade interior para correspondermos ao apelo aqui deixado por Maria: oração e penitência, ou seja, conversão pessoal e mudança de vida; adequar a nossa vida aos valores do Evangelho: o primeiro convite de Jesus ao iniciar a sua vida pública: convertei-vos e acreditai no Evangelho.
Só com um coração convertido e aberto ao amor e aos apelos de Deus, podemos entender e acolher a mensagem presente na Palavra hoje proclamada e viver de modo mais pleno em fidelidade à vocação missionária de todo o baptizado, como participação pessoal e co-responsável na missão da Igreja.
O mandamento de Cristo "Ide pelo mundo e anunciai o Evangelho" é sempre actual e reclama a urgência de todas as horas e de todo o tempo para a Igreja entendida e definida, na sua essência mais profunda, como missionária. Ela existe para evangelizar: "O anúncio do Evangelho é o serviço da Igreja ao mundo. Evangelizar é a vocação própria da Igreja, a sua identidade mais profunda". (EN1.1a)
Esta tarefa não é facultativa para a Igreja nem delegável ou preterida pelos seus membros.
A missão é de todos, é para todos e para todo o mundo.
Como baptizados devemos sentir-nos todos enviados e destinatários da evangelização.
3. A palavra de Deus proclamada neste domingo converge para um tema comum: Deus serve-se da fraqueza e da fragilidade humanas para se manifestar e transmitir a sua mensagem.
Ezequiel: o "filho do homem" para ser no meio do seu povo a voz de Deus. O importante não são as qualidades do profeta, mas o chamamento de Deus e a missão que lhe confia. Também não é decisivo se a mensagem é acolhida. Podem escutar-te ou não, mas saberão que haverá um profeta no meio deles.
Paulo como todos os apóstolos e missionários de todos os tempos: "quando sou fraco é que sou forte".
O próprio Jesus, Ele que sendo Deus assumiu a nossa humanidade, experimentou a rejeição dos seus conterrâneos porque nada viam nele de invulgar… de extraordinário… de diferente dos outros habitantes de Nazaré…
Ele, todos o conheciam, era o "carpinteiro", o "filho de Maria"…
Comodamente instalados nas suas certezas e preconceitos, os conterrâneos de Jesus estavam convencidos de que Deus não podia manifestar-se no humilde carpinteiro que todos conheciam… (Um profeta só é desprezado na sua terra entre os seus parentes e em sua casa).
Mas não precisamos de recuar tanto no tempo… todos conhecemos a reacção da maioria dos conterrâneos e contemporâneos dos pastorinhos quando começou a divulgar-se a notícia dos acontecimentos aqui ocorridos, da mensagem do céu da qual eles, crianças ainda de tenra idade, foram fiéis e heróicos depositários.
Mensagem que aqui continua a convidar gente proveniente de todo o mundo, como a nós hoje, e que de modo tão eficaz nos desperta e impulsiona para a verdadeira conversão a Cristo e ao Evangelho… Deus serve-se, hoje como ontem, da fragilidade e da fraqueza humana para se manifestar e revelar a obra redentora operada por Cristo.
Este modo característico de Deus agir ver anular as desculpas que, tantas vezes, apresentamos, baseadas nas nossas limitações, na nossa "incapacidade", recusando participar de modo activo e corresponsável na realização da missão da Igreja, inseridos nas nossas comunidades paroquiais.
Este modo característico de Deus se manifestar confunde-nos e baralha a nossa lógica humana.
Ele faz da fraqueza e da ignorância humana a sua força e a sua sabedoria.
Escolhe o fraco para confundir o forte.
Escolhe o simples e humilde para confundir o sábio.
Ele faz do escândalo e da ignomínia da cruz caminho de ressurreição e de glória.
Ele serve-se do sofrimento humano como instrumento portentoso e eficaz de anúncio do Evangelho.
Quando me sinto fraco, então é que sou forte – escutamos hoje no testemunho de Paulo, o mesmo que concluía: "Sem em quem acreditei, nada temo", "tudo posso, naquele que me dá força".
Conclusão: Com Maria, vivemos em Missão
Caros peregrinos, não nos contentemos em regressar às nossas terras, às nossas famílias, à nossa vida quotidiana, apenas como alguém que "veio a Fátima", que "esteve em Fátima", que "passou por Fátima".
Meus caros peregrinos, a mensagem aqui deixada e hoje aqui escutada pede-nos que regressemos diferentes… não basta "passar por Fátima". É preciso que Fátima e a sua mensagem nos acompanhe no regresso às nossas casas… Toda a peregrinação deve convergir para a conversão pessoal, para o compromisso no anúncio e no testemunho do Evangelho.
A verdade da conversão pessoal bem como a vitalidade de uma comunidade cristã é proporcional ao compromisso e ao dinamismo missionário presente em toda a sua acção pastoral.
Que Maria, mãe de Jesus e nossa mãe, Estrela da nossa evangelização, que aqui veneramos e invocamos como a Senhora do Rosário de Fátima, nos abençoe, nos acompanhe e nos fortaleça no cumprimento das decisões e propósitos que queremos levar para a nossa vida. Com ela e como ela, nossas comunidades querem viver em estado permanente de missão.
D. Manuel Quintas, Bispo do Algarve