Homilia de D. Joaquim Mendes na celebração do 13 de Julho

Peregrinação aniversária de Julho 2008 Tema: “Vim ao mundo para dar testemunho da Verdade” 1. Com estas palavras, Jesus responde à interrogação de Pilatos: “Então Tu és rei?” “Tu o dizes: eu sou rei. Para isso nasci e para isto vim ao mundo: para dar testemunho da verdade. Quem é da verdade escuta a minha voz” (Jo 18,37). Jesus veio ao mundo para dar testemunho da verdade de Deus, de quem fala quase cada uma das páginas da Bíblia, que escutamos e aclamamos na Palavra proclamada. Sempre que os cristãos se reúnem para celebrar a Eucaristia, antes da mesa eucarística, o Senhor põe a mesa da Palavra, com a qual alimenta o seu povo e o guia pelos caminhos da Aliança e da fidelidade à verdade revelada. 2. A Palavra exprime a fidelidade de Deus em relação à aliança, oferecida aos homens para a sua salvação. É escutada e acolhida por todo aquele que busca a verdade, vive na verdade: “Quem é da verdade escuta a minha voz” (Jo 18,37). Esta palavra eficaz e de uma fecundidade extraordinária é indestrutível, porque vem de Deus, e exige do homem disponibilidade, conversão, confiança naquele que a pronuncia, apesar dos sinais de aparente insucesso. O crente é continuamente tentado a perder esta confiança, quando vê multiplicarem-se os abandonos, a indiferença e a oposição, onde se esperava que a Palavra manifestasse a sua eficácia. 3. Dirigindo-se às pessoas que não vêem senão insucessos, para quem todas as esperanças em relação ao do Reino parecem goradas, Jesus responde com a parábola que escutámos: todos os insucessos, incontestáveis, não impedirão um sucesso final que compensará todas as perdas. Dirigida a todas as pessoas desanimadas, a parábola do semeador é a parábola da esperança. Jesus encontra dificuldades no seu ministério: abandonos, deserções, indiferenças e oposições, que impressionam os que estão à sua volta e que os levam a questionarem, se verdadeiramente Ele é capaz de estabelecer o Reino de Deus sobre a terra. A estas objecções a parábola responde: raciocinar assim, seria apenas fixar-se na perda de uma parte da semente e concluir que a semente não dará qualquer fruto. Uma parte da semente, de facto, perde-se, mas não se pode concluir que a semente não dá fruto, bem pelo contrário. 4. Os insucessos não faltam também hoje; não faltam cristãos desorientados, desiludidos, sem esperança. A parábola da semente conserva toda a sua actualidade. Não obstante as adversidades, o terreno pedregoso, os espinhos que ameaçam e sufocam a semente, no fim, onde a semente consegue enraizar, a recolha é abundante, frutifica e produz cem, oitenta, sessenta e trinta… Apesar das adversidades, do terreno refractário da história, dos espinhos das consciências egoístas, o Reino de Deus desenvolver-se-á em plenitude. A parábola é por isso, um apelo à confiança e à esperança no Reino de Deus e na sua força oculta no manto da sua pobreza e do seu aparente insucesso. Esta é também a mensagem do oráculo de Isaías, da primeira leitura: a Palavra de Deus é eficaz, a sua força fecundante é semelhante à da chuva tão desejada pelo agricultor e celebrada no “canto da primavera”, do salmo responsorial que cantamos. 5. A Palavra de Deus, também hoje, encontra um vasto horizonte de indiferença, hostilidade e rejeição, mas não é por isso que ela perde a sua força ou se deixa de proclamar. Ela continua a contar com uma porção de “boa terra”, onde cai e frutifica e produz fruto abundante, que compensa largamente as perdas do terreno estéril. A “boa terra” é o terreno espiritual dos “pequenos”, dos pobres, dos pecadores convertidos que alargam o coração e a vida à palavra de Cristo, que acolhem com entusiasmo e confiança a “Boa-Nova” do Reino que promete perdão e paz. Esta semente santa, que cai no coração dos justos e dos fiéis, compensa as desilusões, pela semente estéril dos indiferentes, auto-suficentes e prepotentes. 6. Esta parábola da esperança é uma grande reflexão sobre o Reino de Deus, sobre a Igreja, sobre a fé e sobre as obras, sobre o mal, a incredulidade e a rejeição obstinada da luz e do bem, por isso Jesus adverte: “Quem tem ouvidos, oiça”. A Palavra de Deus não é só verdade, mas é força que opera em nós e nos introduz no dinamismo da salvação, é fonte de vida. Esta Palavra continua a viver na Igreja. O Evangelho que a Igreja proclama é Palavra de Deus, “viva, eficaz e mais penetrante do que qualquer espada de dois gumes; penetra até dividir o espírito (…) julga as disposições do coração. E não há criatura oculta à sua presença (Hb 4,12). A Palavra liberta da “corrupção que escraviza”, produz uma transformação radical, que vai para além das nossas forças e possibilidades, responde à esperança da revelação que os filhos de Deus esperam ansiosamente, como refere o apóstolo S. Paulo, na segunda leitura. A Palavra de Deus sacia a inteligência, aquece o coração, encoraja a vida. 7. Caríssimos irmãos e irmãs: Como Maria Santíssima sejamos um “bom terreno”, que acolhe a Palavra com um coração aberto, disponível, generoso e dócil. A Palavra gera em nós Cristo. Deste modo, podemos oferecê-lo ao mundo como Maria. A Palavra é um grande tesouro, que precisámos de redescobrir e de valorizar na nossa vida de crentes e na vida das nossas comunidades cristãs. Ela é uma presença de Deus que nos acompanha e nos guia pelos caminhos da fidelidade à aliança. Nela podemos escutar Deus que nos fala, dialogar com Ele, encontrar resposta para as nossas dúvidas e inquietações, encontrar razões para viver com esperança e dar razão da nossa esperança a quantos nos interrogam e nos questionam sobre a fé, manifestando assim que o Reino de Deus chegou, germina e frutifica em nós. A Palavra ilumina, dá a força e a coragem de Cristo, para dar testemunho da Verdade, num mundo ferido pela mentira, pelo erro, pela falsidade, onde muitos se iludem, pensando que o Reino e os seus valores estão ultrapassados. A Palavra responde à situação do nosso mundo, a todos aqueles que obstinadamente se fixam somente no terreno pedregoso e com espinhos onde a semente se perde; que procuram sublinhar o insucesso do Reino, descredibilizando a Igreja, procurando remetê-la para a esfera do privado. A Palavra é um convite à esperança de crentes e não crentes, para que abram os olhos para ver a luz, a verdade e o bem, os frutos da semente da Palavra que germina no coração de tantos homens e mulheres e nas comunidades cristãs, que, no silêncio, na humildade e na discrição produzem, “umas, cem; outras, sessenta; outras, trinta por um”. Estes são todos aqueles que escutam a voz de Cristo e dão testemunho da verdade de Deus, hoje, no mundo. Associemo-nos a eles, para que a nossa vida cristã seja fecunda, produza fruto abundante, glorifique a Deus, e seja sinal da presença de que o Reino está vivo e continua e fecundar a história. Fátima, 13 de Julho de 2008 † Joaquim Mendes, Bispo Auxiliar de Lisboa

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