“Ide e anunciai”
1.Fostes convocados para esta celebração de encontro e envio.
Encontro com Cristo Palavra e com Cristo Eucaristia.
Encontro entre vós, estudantes, professores e funcionários das Escolas Superiores de Lisboa, comunidade crente, que confessa Jesus como seu Senhor e compartilha com Ele vida e missão.
Do encontro com Cristo Palavra, que acabamos de celebrar, emerge o mandato da missão universal que Cristo ressuscitado confia aos discípulos antes de parir para o Céu: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda a criatura”.
Jesus convida os discípulos a deixarem Jerusalém, a deixarem o mundo judaico, o seu mundo, para irem ao encontro de outros mundos, outros ambientes, outras pessoas, porventura desconhecidas, e partilharem com elas o Evangelho, a Boa-Nova da salvação, a própria experiência vivida no discipulado com Jesus.
2. Evangelizar é, antes de mais, partilhar a própria experiência cristã, o encontro com Cristo, que fez mudar a própria vida.
Tornou-se celebre o a afirmação do Papa Paulo VI, na exortação apostólica sobre a evangelização (8 dezembro de 1975): «O homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas que que os mestres ou então se escuta os mestres, é porque são testemunhas” (41).
O Papa Paulo VI recorda-nos que o testemunho é indispensável para o anúncio do Evangelho. O «Ide e ensinai» tem de ser acompanhado de credenciais que tornem credível o ensino, a mensagem e o mensageiro.
O ensino pressupõe o discipulado. Foi o que fez Jesus: antes de enviar os discípulos a anunciar o Evangelho, fê-los fazer uma forte experiência de discipulado, vivendo com Ele, caminhando com Ele pelas estradas da Palestina, encontrando as pessoas, escutando e vendo com os próprios olhos os seus gestos e as suas escolhas de vida, fazendo a experiência de uma nova realidade: o Reino de Deus que se tornava forma de vida, história quotidiana.
É esta experiência de vida com o Mestre que torna os discípulos capazes de viver o Evangelho, de o testemunhar com a própria vida e de o anunciar corajosamente, realizando o mandato do «ide e ensinai».
3. Discipulado significa meter-se a caminho, como os apóstolos com Jesus, para aprender a viver a vida ao estilo do discípulo, aprender como tornar presente Deus e o Reino, na complexa realidade do nosso mundo.
Discipulado significa caminhar com Cristo, estar com Ele, e aprender dele, para dar cumprimento ao seu mandato, de «ide e ensinai».
Estou convencido que quem se sente continuamente e para sempre discípulo, quem assume o estatuto cristão de discípulo, é que é capaz de se tornar testemunha, hoje, amanhã e sempre.
Discipulado significa grande disponibilidade e abertura para aprender com todos, ter sempre sede de melhorar e fome de mudar, para poder estar à altura dos problemas de hoje, dando uma resposta sempre mais adequada, verdadeira e autêntica, estando sempre prontos a dar a razão da própria esperança a todo aquele que a peça (1 Pe 3,15).
Discipulado significa viver em permanente discernimento para compreender melhor como viver hoje a fé, como partilhá-la; como testemunhá-la, como contagiar os outros com ela; como ler e interpretar os sinais de sentido e de esperança; como decidir-se, com escolhas livres e responsáveis, para oferecer sentido e sinais de esperança.
Ser discípulo para ser apóstolo, para realizar o «ide e ensinai», para tornar percetível o Evangelho e os «milagres» que ele opera em quem o acolhe.
4. Este é o dinamismo que urge recuperar: ser discípulos para se tornarem testemunhas, e poder, de verdade, ensinar. Fazer um ensinamento novo, como o de Jesus, que se funda sobre o testemunho e não meramente sobre o conhecimento.
O mundo tem necessidade de testemunhas. Para evangelizar o mundo de hoje é necessário assumir o modelo da Igreja primitiva de Jerusalém, formada por pessoas que tiveram uma forte experiência espiritual que mudou as suas vidas, e que experimentaram a força da comunidade até ao ponto de serem um só coração e uma só alma.
A comunidade cristã, a Igreja, para cumprir a missão universal do «ide e ensinai» que o Senhor Jesus lhe confiou, não pode limitar-se a ensinar, mas a ensinar e testemunhar.
É relativamente fácil ser mestre, mas muito mais difícil ser testemunha. No mundo de hoje não faltam mestres, verdadeiros e falsos, mas escasseiam as testemunhas. A testemunha fala com a vida, com a coerência, com a humildade, com a atitude de disponibilidade, com a conceção da vida como serviço, como dom recebido para ser doado, com a generosidade, com a doação a exemplo de Cristo.
A testemunha comporta-se segunda a maneira de viver a que foi chamada, como recomenda S. Paulo, na primeira leitura. Honra a sua vocação, a sua eleição de filho de Deus e membro da Igreja, comportando-se segundo a maneira de viver própria do cristão, em que há coerência entre a fé e a vida, entre o dizer e o fazer, assumindo as virtudes cristãos da humildade, da mansidão, da paciência, da caridade, que faz dela transparência do rosto de Cristo.
5. A voz das testemunhas é muito mais forte que as dos mestres, porque nelas ressoam uma profundidade de vida que vem do discipulado. As palavras das testemunhas estão carregadas de vida e têm um peso enorme, têm a capacidade de insidiar-se no mais profundo dos corações, e de gerar novos estilos de vida.
As palavras das testemunhas são plasmadas pelas Palavras de Deus, por isso têm a capacidade de tocar os corações, de os converter, e de se tornarem luz de um novo caminho.
O desafio é pois ser testemunhas para adquirir a capacidade e a força para dar cumprimento ao «ide e ensinai». Testemunhas que tornem a Palavra de Deus vida da própria vida, pão quotidiano que alimenta os próprios compromissos, luz que faz ver que escolhas fazer para ser verdadeiros cristãos.
O desafio é pois ser mais e melhores testemunhas, para ensinar a todos a beleza e a profundidade do discipulado e do seguimento de Cristo Ressuscitado.
6. O Santo Padre Bento XVI, no encontro com jovens professores universitários, quando da recente Jornada Mundial da Juventude, sublinhou a necessidade de mestres autênticos, de homens e mulheres que se se devotem a propor e a valorizar a fé perante a inteligência dos homens, e que “para o fazer, não basta ensiná-lo, é preciso vivê-lo, encarná-lo, à semelhança do Logos que também encarnou para colocar a sua morada entre nós”.
Neste sentido, acrescentou o Papa, os jovens precisam de mestres autênticos; pessoas abertas à verdade total dos diversos ramos do saber, capazes de escutar e viver dentro de si mesmos o diálogo interdisciplinar” (Madrid, mosteiro de São Lourenço do Escorial, 19 agosto 2011).
Aos jovens, o Papa desafiou a tornar visível a presença de Deus, a abrir fronteiras e a criar espaços de amizade.
Dar visibilidade à fé e à presença de Deus no mundo, através de uma vida crente e coerente com o Evangelho. Abrir fronteiras para que o anúncio chegue mais longe. Criar espaços de amizade que abra caminhos para a fraternidade e para a universalidade da comunhão e que “torne visível que é bom estarmos com Deus e que Deus está connosco”.
7. Assumi a maravilhosa aventura de crer, de dizer e testemunhar a própria fé na própria vida, de ser discípulos que seguem Cristo e apóstolos que o anunciam.
Concluo com as palavras do Santo Padre, na homilia da missa de encerramento da Jornada Mundial da Juventude (Base Aérea dos Quatro Ventos, Madrid, 21 de agosto de 2011): “O mundo precisa do testemunho da vossa fé; o mundo necessita de Deus”. “Não guardeis Cristo para vós mesmos. Comunicai aos outros a alegria da vossa fé”. Sede discípulos que o seguem e missionários que o anunciam e testemunham!
Que o encontro com Cristo Eucaristia, que se segue, reforce a vossa fé, revigore a vossa esperança e leve “a responder com amor a Quem por amor se entregou por nós”.
Missa das Universidades, igreja do Sagrado Coração de Jesus
20 de outubro de 2011
D. Joaquim Mendes, bispo auxiliar de Lisboa