Celebração da Vigilia Pascal
Homilia
«Todos nós que fomos baptizados em Jesus cristo, fomos baptizados na Sua morte. Sepultámo-nos com Ele, pelo baptismo, na morte, e assim como Cristo ressuscitou dos mortos, por meio da glória do Pai, também nós caminharemos numa vida nova». Estas palavras, com as quais S. Paulo ajuda a sua comunidade de Roma a participar activamente no mistério pascal de Jesus Cristo através do baptismo, são as mesmas palavras que nos convidam a penetrar profundamente no Mistério da Ressurreição que realizado em Cristo transforma o nosso ser e faz-nos participantes da Vida Nova do Ressuscitado que nos orienta para uma comunidade de partilha fraterna e de missão evangelizadora.
Na verdade esta noite convida-nos, a partir da contemplação do Mistério da Ressurreição de Jesus Cristo, a renovarmos em nós o baptismo que recebemos, a saborear a abrangência deste dom e o compromisso que exige de nós de realizarmos a mesma proclamação e testemunho que brotou da experiência daquelas mulheres e dos discípulos que sentiram a alegria e a esperança da Ressurreição do Senhor.
Renovamos o nosso baptismo contemplando a água que nos regenerou, na qual ficou morto o nosso pecado e dela ressurgimos como pessoas novas. Igualmente admiramos a luz de Cristo que do Cirio Pascal nos foi entregue a cada um para nos confrontarmos com esta luz e reconhecermos que também somos luz do mundo, reflexo da luz de Cristo.
Na escuta da Palavra de Deus, que hoje percorreu os grandes passos da história da Salvação, somos convidados a fazer esta caminhada na fé para sentirmos em nós esta revelação progressiva e amorosa de Deus e que à imagem do primeiro Povo da Aliança, somos nós hoje, o Novo Povo de Deus, que nascido da Páscoa de Jesus Cristo é um Povo sacerdotal, profético e real, capacitado para anunciar e testemunhar ao mundo as maravilhas de Deus realizadas em Seu Filho Jesus Cristo.
Participantes do banquete Eucaristico, somos integrados na comunidade cristã que vive da oferta permanente de Cristo Pão da Vida que nutre a nossa existência e nos fortalece para a missão no meio do mundo.
Participantes do mesmo Corpo de Cristo somos transformados num novo Corpo que é a Comunidade cristã na qual, na diversidade de dons e serviços, experimentamos a unidade e a comunhão que nos vem da acção do Espirito Santo.
Nesta noite somos convidados a acompanhar aquelas mulheres que vão de manhã muito cedo ao sepulcro. Este percurso, hoje feito na escuta da Palavra e na fé que nos faz viver os acontecimentos salvíficos, é fundamental para uma verdadeira experiência do Ressuscitado.
Como afirmava o Papa Francisco na Vigilia Pascal do ano passado, no rosto daquelas mulheres descobrimos muitos rostos de sofrimento por tanta desumana injustiça. Na verdade, «nos seus rostos, vemos refletidos os rostos de todos aqueles que, caminhando pela cidade, sentem a tribulação da miséria, a tribulação causada pela exploração e o tráfico humano».
De facto, «neles, vemos também os rostos daqueles que experimentam o desprezo, porque são imigrantes, órfãos de pátria, de casa, de família; os rostos daqueles cujo olhar revela solidão e abandono, porque têm mãos com demasiadas rugas».
Sem dúvida, «refletem o rosto de mulheres, de mães que choram ao ver que a vida dos seus filhos fica sepultada sob o peso da corrupção que subtrai direitos e quebra tantas aspirações, sob o egoísmo diário que crucifica e sepulta a esperança de muitos, sob a burocracia paralisadora e estéril que não permite que as coisas mudem».
Deste modo, «na sua tristeza, elas têm o rosto de todos aqueles que, ao caminhar pela cidade, veem a dignidade crucificada».
Ir ao sepulcro e carregar com todos estes sofrimentos e sinais de morte que estão ali juntamente com Jesus Cristo que os quer transformar através da Sua Ressurreição, poderá, numa primeira hora, amedrontar-nos. Por isso, a voz divina alerta para não terem medo.
Deixemos também ressoar em nós esta mesma voz a dizer-nos que não devemos ter medo da Ressurreição de Jesus Cristo e do compromisso de O tornar presente onde se desenrola o sofrimento humano oferendo a Palavra e os gestos de esperança que brotam da Vida partilhada fruto da Ressurreição do Senhor.
Na experiência da Ressurreição é fundamental o envio e a partilha da experiência dos acontecimentos pascais. Ver que Ele não está no túmulo, reconhecer os sinais da sua identidade e obedecer á voz divina que nos encaminha na direcção dos irmãos para lhes comunicar que Jesus de Nazaré venceu a morte e está Vivo fazem parte do itinerário da fé cristã que nos eleva até ao patamar da verdadeira consciência de discípulos que assumem a missão de evangelizar o mundo.
É urgente proclamar a todos os baptizados que não devemos resignar-nos a manter o sepulcro fechado, como é imprescindível alertar o mundo de hoje para não se deixar dominar pelos sinais de morte sem levantar a cabeça e escutar o grande anuncio da ressurreição.
Pela ressurreição, Jesus Cristo abre o tumulo, o Seu e o das nossas vidas, para nos fazer saltar das barreiras dos nosso pessimismos estéreis, pela proclamação de que Ele não está ali, ressuscitou.
Do mesmo modo que somos convidados a acompanhar as santas mulheres a ir até ao sepulcro somos igualmente interpelados a percorrer o caminho da alegria e da esperança que nos leva à partilha do Ressuscitado com os irmãos anunciando-lhes que Jesus Cristo Ressuscitou e por isso podemos cantar alleluia. Deus exerceu o seu poder de amor e libertou-nos de toda a opressão.
«Vamos anunciar, partilhar, revelar que é verdade: o Senhor está Vivo». Sim «está vivo e quer ressurgir em tantos rostos que sepultaram a esperança, sepultaram os sonhos, sepultaram a dignidade» (Papa Francisco, homilia da vigilia pascal 2017).
Imploro de Nossa senhora, Mãe e Rainha dos Açores, Ela que foi a primeira a sentir a alegria da ressurreição do Seu Filho, abençoe na esperança e com as graças do Ressuscitado as nossas famílias, crianças, jovens, adultos idosos, desempregados, atribulados, excluídos e pobres, encarcerados e emigrantes e nos acompanhe pelos caminhos que leva à evangelização do mundo de hoje.
Amen
+João Lavrador, Bispo de Angra e Ilhas dos Açores
