Homilia da Missa Vespertina da Ceia do Senhor de D. José Traquina – Santarém

Quinta Feira Santa

Sé de Santarém, 06-04-2023

Homilia da Missa Vespertina da Ceia do Senhor

Irmãos

Com esta Missa vespertina da Ceia do Senhor, damos início à celebração do Tríduo da Páscoa do Senhor.

A Páscoa do Senhor é a passagem deste mundo para o Pai e corresponde à sua Hora, a Hora de Jesus que São João referencia no seu Evangelho. É o momento alto em que o Senhor Jesus eleva toda a sua dedicação ao Pai por amor à humanidade, é a entrega que Jesus antecipa numa celebração pascal com os seus apóstolos a quem confiou a responsabilidade de a atualizarem em sua memória.

1 – Nesta celebração temos a instituição da Eucaristia. Jesus celebra a ceia em ambiente pascal, agora com a sua nova família, os seus apóstolos. Para o povo de Israel, uma família que se junta para celebrar a Páscoa é uma comunidade de vida que quer assegurar a sua liberdade e o futuro em paz. Porém, a ceia de Jesus é a última, é de despedida, é a Páscoa com novo sentido: significa a sua entrega em fidelidade que se projeta na eternidade. É um memorial a celebrar até ao fim do mundo.

A Páscoa de Jesus, passagem deste mundo para Pai em entrega dolorosa mas confiante, é a nossa Páscoa, é a Pascoa de todos os seus discípulos reunidos em comunidade, é a Páscoa da Igreja. A Eucaristia é a celebração da Páscoa do Senhor que nos deixou como memorial do seu Amor fiel ao Pai e a nós, consagrado na cruz.

O testemunho de São Paulo aos Coríntios, que escutámos na segunda Leitura, é muito claro e expressivo da importância que devia ter naquela comunidade a celebração da Eucaristia na fidelidade à sua origem. A Eucaristia é o grande tesouro, é a grande obra de arte de Cristo à sua Igreja que não suporta adaptações de qualquer estilo.

Como ensina o Concílio e o Catecismo da Igreja, a Eucaristia é o “sacramento de piedade, sinal de unidade, vínculo de caridade, banquete pascal em que se recebe Cristo, a alma se enche de graça e nos é concedido o penhor da glória futura” (CIC 1402)

2 – Nesta celebração temos também a instituição do ministério sacerdotal.

O ministério sacerdotal, dom de Cristo à sua Igreja, transmitido de geração em geração por sucessão apostólica, só à luz da Fé se entende e valoriza. Recebendo o Sacramento da Ordem no segundo grau, o ministro sacerdote fica habilitado a presidir à eucaristia, em nome e na pessoa de Cristo e a corresponder ao mandato: “Fazei isto em memória de mim”.

Jesus confiou aos seus apóstolos a responsabilidade de continuarem a celebrar a ceia em sua memória e assim assegurarem a sua presença real para fortalecer a vida e a missão confiada a todos os fiéis. O ministério sacerdotal é portanto um serviço à comunidade dos irmãos na fé e a sua razão de ser está na comunicação da graça e alimento espiritual que os cristãos recebem na celebração da Eucaristia, promovendo a união da pessoa humana com Deus.

Os ministros sacerdotes e todos os irmãos na fé, formam a Igreja, o grande sacramento, também chamada ‘corpo social e místico de Cristo’, ou ainda, ‘esposa de Cristo’.

Santo Agostinho ensinou que “do lado de Cristo adormecido na cruz jorrou o admirável sacramento de toda a Igreja”, o Papa Francisco na Carta apostólica Desiderio desideravi (Desejei ardentemente) acrescenta o seguinte: “O paralelismo entre o primeiro e o novo Adão é surpreendente: tal como Deus tirou Eva do lado do primeiro Adão, depois de ter feito cair sobre ele um sono profundo, assim do lado do novo Adão, adormecido no sono da morte, nasce a nova Eva, a Igreja. O espanto para nós reside nas palavras que podemos pensar que o novo Adão faça suas, olhando para a Igreja: «Desta vez é osso dos meus ossos e carne da minha carne» ( Gn 2, 23). Por ter acreditado na Palavra e termos descido à água do Batismo, nós tornamo-nos osso dos seus ossos, carne da sua carne. (…) É este o dom que recebemos. O sujeito que age na Liturgia é sempre e só Cristo-Igreja, o Corpo místico de Cristo” (Dd 14-15).

3 – Nesta celebração também temos a instituição do mandamento do amor fraterno. Como escutámos no Evangelho: “Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a sua hora de passar deste mundo para o Pai, Ele, que amara os seus que estavam no mundo, amou-os até ao fim” (Jo 13,1). São João refere o que acontece no contexto da ceia: para ilustrar o mandamento “Amai-vos uns aos outros como Eu vos amei” (Jo 13,34), Jesus resolveu assumir um serviço: lavar os pés aos seus apóstolos. Era um serviço próprio de um escravo. Mas o contexto é solene e tem um significado especial: Jesus quer dar aos seus apóstolos um ministério e uma capacidade de amar que se traduza em serviço e purificação da humanidade. Trata-se de amar e cuidar dos outros nossos semelhantes como Deus quer, para isso é necessário alargar o coração e rever objetivos pessoais: foi o que o apóstolo Pedro teve que fazer.

“Dei-vos o exemplo, para que, assim como Eu fiz, vós façais também” (Jo 13,15). Repetimos o gesto do lava pés mas sabemos que o seu significado é traduzir o espírito da missão apostólica de todos os cristãos: confiar, amar e servir. Vamos ao lava pés: manifestemos nesse gesto a nossa identidade cristã.

+ José Traquina

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