Homilia da Missa Crismal do patriarca de Lisboa

«Ungidos para semear a Esperança»

1. Reunimo-nos nesta manhã luminosa para celebrar a Missa Crismal, sinal profundo da comunhão do presbitério em torno do seu bispo e expressão visível da Igreja viva, que se prepara para celebrar o mistério pascal.

Neste ano jubilar, a Igreja convida-nos a redescobrir a esperança como dom e missão. E se há alguém chamado a ser, de forma particular, artífice da esperança na Igreja e no mundo são os presbíteros: homens ungidos por Deus, não para si mesmos, mas para os outros; enviados para curar corações feridos, proclamar o ano da graça do Senhor, acender a luz onde parece haver trevas.

 

2. A nossa unção é missão. E nesta hora da história – marcada por tantas incertezas, conflitos, cansaços e até desilusões – a esperança não é um luxo, é uma urgência. O povo precisa de esperança. A Igreja precisa de esperança. O mundo tem fome de sinais de que Deus não se esqueceu da humanidade. Quero convidar-vos a vós, padres, hoje de forma especial, a contemplar a vossa vocação como um ministério da esperança. Sois obreiros da esperança de Deus no mundo e colaboradores da Sua alegria para com todos.

 

3. Em primeiro lugar, na pregação da Palavra. O padre é o primeiro mensageiro da esperança cristã. Não prega ideias ou doutrinas estéreis, mas anuncia o Evangelho do Deus vivo, que entrou na história, que venceu a morte, que nunca abandona os seus filhos. Este Evangelho é o próprio Jesus Cristo, vivo e ressuscitado, sempre presente e próximo de todos os seus discípulos, como um dia em Emaús (cf. Lc 24, 13-35).

Nas homilias, nas catequeses, na escuta no confessionário, no simples conselho no momento oportuno e também no seu modo de viver e agir – tudo isso é lugar onde se pode reacender uma chama apagada, oferecer uma palavra de ânimo, abrir horizontes de sentido. Num tempo em que tantas palavras são vazias ou agressivas, a palavra do padre deve ser ungida: cheia de misericórdia, firme na verdade, mas sempre consoladora, sempre portadora de esperança.

 

4. Em segundo lugar, o padre é chamado a ser testemunha da esperança quando dirige na caridade as comunidades cristãs. Ser pastor é mais do que administrar estruturas: é conduzir um povo – com paciência, na escuta, com espírito de comunhão e de missão. O padre é aquele que, em nome de Cristo, não desiste do rebanho, mesmo quando há cansaço ou conflitos. É aquele que acredita que a comunidade, mesmo ferida, pode crescer, renovar-se, recomeçar. Ele está ao serviço de um bem maior: do anúncio de Cristo Ressuscitado àqueles que esperam e procuram razões de viver.

Nesta lógica jubilar, o padre torna-se servo da reconciliação, promotor da unidade, paciente semeador de paz. É fácil cair no desânimo, nas comparações, nas estatísticas. Mas o bom pastor olha com os olhos de Cristo: não vê números, vê pessoas. E vê nelas possibilidades novas, mesmo quando tudo parece estagnado.

Isto, muitas vezes, implica um esforço sobre-humano do padre… mas é precisamente aí, do princípio ao fim, que o padre se recorda que não está em nome próprio, mas do Senhor. Que na ordenação recebeu um fluxo particularíssimo da graça de Deus, que o constitui como sacramento de Cristo. Isto oferece uma perspetiva sobre o sacerdócio que só aos olhos da fé se pode compreender: sacramento de Cristo Bom Pastor, o padre descobre que a realização da sua missão não se deve aos seus esquemas pastorais ou às suas habilidades pessoais, mas à ação do Espírito Santo. E como é bom que hoje, na renovação das promessas sacerdotais, recordemos que nos voltamos a colocar diante do propósito que um dia nos animou no dia da ordenação, mas também, e sobretudo, renova-se aquela promessa que o próprio Senhor fez a cada um de nós, de sempre nos acompanhar, fortalecer, guiar. Neste sentido, é fundamental recordar que «o sacerdócio ministerial está ao serviço do sacerdócio comum dos fiéis» (Catecismo da Igreja Católica, n.o 1547): é para santificar os outros que somos padres. Somos consagrados por Cristo para dar o próprio Cristo ao Povo: nas palavras, nos gestos, nos sacramentos, na caridade. Renovamos e recordamos que somos «homens para os outros», em nome de Cristo, ungidos para servir o Povo Santo de Deus, que hoje de forma especial reza por cada um de nós.

 

5. Em terceiro lugar, a missão do padre renova-se como ministério da esperança na celebração dos sacramentos. Cada sacramento que celebramos é um encontro com a esperança viva. No Batismo, nasce uma nova criatura; na Eucaristia, alimenta-se um coração que procura a comunhão com o Senhor; na Reconciliação, reabre-se o futuro; na Unção, consola-se e fortalece-se a vida ferida. O padre é testemunha e canal dessa graça, e por isso deve celebrar com fé, com zelo, com alegria. Não como quem cumpre um ritual, mas como quem recebe Deus e O entrega ao povo.

Queridos padres, a esperança entra no mundo pelas vossas mãos ungidas, pelos vossos gestos simples, pela vossa fidelidade silenciosa. A vossa presença, mesmo quando ninguém repara, é um sinal de que Deus continua a cuidar do Seu povo. O Senhor reitera a sua aliança, segundo a qual cuida das suas ovelhas e dá a vida por elas, por meio de cada um de vós.

 

6. Neste dia em que renovamos as promessas sacerdotais, peçamos ao Senhor que renove em nós a unção da esperança. Não deixemos que o peso dos dias, as dificuldades ou os desânimos nos endureçam o coração. Voltemos sempre à fonte: à Palavra, à Eucaristia, à oração. E deixemos que o óleo da graça penetre de novo o nosso ser.

E a vós, povo santo de Deus, peço: rezai pelos vossos padres, cuidai deles, amai-os com ternura. Eles são vossos servidores, vossos pastores, vossos irmãos em Cristo.

Que Maria, Mãe dos sacerdotes e Mulher da esperança, nos acompanhe neste caminho quotidiano rumo à santidade. Que, neste Jubileu, possamos todos experimentar a alegria de sermos Igreja peregrina que caminha com esperança viva e renovada. Ámen.

D. Rui Valério
Patriarca de Lisboa

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