«Pode demorar tempo, mas a paz vai acontecer», afirma Nelson Moda, responsável moçambicano da Comunidade de Sant’Egídio
Lisboa, 07 nov 2023 (Ecclesia) – Nelson Moda, responsável pela Comunidade de Sant’Egídio na cidade da Beira, em Moçambique, disse hoje que o carisma de “diplomacia silenciosa” pode ajudar nas negociações na Ucrânia, sendo, atualmente uma das entidades humanitárias naquele país europeu.
“A experiência em Moçambique para negociar a paz tem resultados visíveis, dóceis e apreciáveis no mundo inteiro. Desde então a comunidade aprendeu o alfabeto negocial da paz. Hoje está na linha da frente na Ucrânia, não apenas para negociar, mas para socorrer a população e as vítimas da guerra. Para além do seu carisma espiritual de oração quotidiana para que a paz prevaleça, há ações concretas, uma diplomacia silenciosa desenvolvida para persuadir à paz. Os passos são evidentes e a não publicitação das ações torna-as mais frutíferas”, explica à Agência ECCLESIA o responsável moçambicano.
Presente em Portugal para a apresentação do livro «Xirico, vozes da paz em Moçambique», Nelson Moda explica a importância de dar a conhecer às novas gerações o passado, que a sua maioria desconhece, uma vez que “metade da população moçambicana nasceu depois do fim da guerra”.
“Se vivermos sem conhecer a história, arriscamo-nos a repeti-la. Foi uma história difícil mas nela podemos inspirar-nos para uma coexistência numa diversidade e na reconstrução da paz”.
O autor cita a “terceira guerra mundial aos pedaços” que o Papa Francisco reconheceu no mundo atual, com conflitos na Ucrânia, na Terra Santa, há mais de 10 anos na Síria e em outros locais.
“30 anos após a assinatura dos acordos de Roma, que conduziram ao final da guerra civil que durou 16 anos, Moçambique tem um papel fundamental de testemunhar a superação de momentos difíceis da guerra e este testemunho, em forma de livro, pode ser um antídoto para todos os lugares que se encontram em guerra hoje”, afirma.
Nelson Moda recorda o trabalho da Comunidade de Sant’Egídio, uma “entidade, frágil e sem meios que foi capaz de sentar à mesa as partes beligerantes”, colocá-las em diálogo e encontrar a paz em Moçambique.
“Esta convicção é a que temos nos dias de hoje: O término da guerra na Ucrânia, na Terra Santa e em outros locais, depende da vontade de homens e mulheres, despidos de interesses de poder, de pequenos grupos, e nos concentrarmos numa política ao serviço do povo”, referiu.
“Os que viveram a guerra conhecem melhor o sabor de cada pedaço da paz. É responsabilidade de quem viveu a guerra, conservar a paz”.
O autor reconhece que o país atravessa um tempo de instabilidade; a Conferência Episcopal apelou à paz no país, para que se evite a “possibilidade de derramamento de sangue entre irmãos”, numa nota pastoral em que alerta para possíveis irregularidades nas eleições autárquicas de 11 de outubro.
O responsável frisa que as manifestações “pacíficas e anunciadas” que têm acontecido são organizadas por jovens que “rejeitam a violência”.
“A nossa juventude, a maioria do povo moçambicano, não recorre à violência para resolver os problemas. Alguns a chamam de pacifista e monótona, mas é uma juventude que assumiu a consciência que a guerra é uma aventura que não vale a pena iniciar, mas importa preservar a paz. É um povo e uma juventude que tem muito a ensinar ao mundo”.
Nelson Moda indica que a Comunidade de Sant’Egídio procura junto das crianças e adolescentes desenvolver as Escolas de Paz, precisamente porque acreditam que esta tem de ser uma realidade construída diariamente.
A Comunidade de Sant’Egídio estende a sua ação a todo o território moçambicano, concentrando-se, neste momento no norte do país no acolhimento e auxílio ao milhão de deslocados do terrorismo, estando presentes em Pemba, Nampula, Lichinga, Quelimane para onde o fluxo se direciona.
A comunidade desenvolve igualmente o programa Bravo que consiste no registo civil dos deslocados do terrorismo que perderam os documentos.
A Comunidade de Sant’Egidio é um movimento católico de leigos, baseado na oração, nascido em Roma, em 1968, que se dedica à solidariedade, ao ecumenismo e ao diálogo, como construtores da paz.
LS