Grupos vulneráveis na prisão

Num Congresso Nacional da Pastoral Penitenciária de Espanha, os participantes tiveram oportunidade de reflectir e tomar consciência da realidade penal e das medidas privativas de liberdade por que passam as pessoas mais frágeis, repensar o sistema penal e fazer sugestões para uma maior humanização em todo o sistema, no que seja aplicável a este tipo de pessoas.

Trata-se, efectivamente, de uma forte e urgente tomada de consciência, pessoal e colectiva, sobre o tratamento que se dá, e em que se pode mudar o modelo do mesmo sistema, para que estas pessoas e as suas vítimas possam ter respostas humanizantes e curativas, restauradoras.

Os grupos subjacentes à temática do Congresso são, em especial, os Doentes Mentais, os Idosos, as Mães com Filhos na Prisão, as Pessoas Portadoras de Deficiência Física, os Estrangeiros e os Menores Internados.

Estas pessoas, susceptíveis de cometer ilícitos, como todas as outras, apresentam, todavia, campos de tratamento muito especial, aplicáveis a cada pessoa em questão; é fácil de perceber que, para casos especiais, tratamentos especiais; justiça é dar, ou tratar cada pessoa segundo aquilo que ela é ou faz; aplicar medidas privativas de liberdade, ou outras, é ter presente a pessoa e as circunstâncias que as tornam únicas e irrepetíveis.

Sabemos que há doentes mentais com um historial de agressividade, por vezes grave e difícil de controlar; ficar à espera que eles cometam crimes para, de seguida, ficarmos sem saber o que lhes fazer – a eles e às suas vítimas – é muito grave e, por vezes com situações de irremediáveis efeitos. E pergunta-se: como é possível que um bom número deles tenha entrado numa Prisão, sem nunca lhes ter sido diagnosticado nem tratado previamente a sua doença mental? Considerar a verdadeira natureza da causa dos delitos que afectam estes grupos vulneráveis em geral, permitiria reduzir os danos provocados pelos mesmos, prevenir o envolvimento de vítimas e minimizar o uso da prisão, em favor de medidas terapêuticas, não só mais adequadas, mas também mais seguras; também aqui se deve falar em Prevenção!

Em Espanha também há pessoas muito idosas, mães com filhos nas Prisões, pessoas portadoras de deficiências físicas várias, a cumprir penas, com medidas privativas de liberdade, isto é, em prisão. Talvez nem todas devessem estar nas Cadeias: quem sabe se outras medidas, com métodos de controlo e de limitação da liberdade, lhes possibilitariam uma maior qualidade de vida, desde que assegurassem à Sociedade o direito a uma maior e mais segura convivência pacífica. Ainda não se esgotaram a criatividade nem a coragem para encontrar outras modalidades seguras, para a execução das penas, nestes como noutros casos…

Os Estrangeiros, pela sua especial vulnerabilidade e fragilidade, em muitos campos da sua vida, ficam muitas vezes expostos a circunstâncias facilitadoras da prática de ilícitos.

É preocupante o número, sempre crescente, de estrangeiros nas nossas Pisões. As distâncias em relação à Família, o desconhecimento da língua e da legislação aplicável, a possibilidade de pensar e programar o futuro, são dificuldades reais, a juntar à medida da privação de liberdade, em país estrangeiro! Também aqui é urgente mudar e adaptar a legislação internacional, para agilizar o cumprimento das penas nos países de origem, quando essa fosse a vontade dos réus em causa; é urgente a preparação académica de funcionários e intérpretes, disponíveis em todas as fases do processo, mesmo durante a execução da pena, sempre! Ainda não fizemos tudo para garantir a protecção dos direitos dos outros…dos diferentes…

No País vizinho, num total de cerca de 76.800 presos, quase 16.000 são menores, sujeitos a medidas judiciais, com idades compreendidos entre os 14 e os 17 anos! A Igreja tem respostas de boa presença junto destes Centros de Detenção, procurando acompanhar o crescimento para a vida, ajudando a preparar o futuro.

Na Declaração Final do Congresso, realizado em Madrid nos dias 10-12 de Setembro, foi afirmado que “ a Pastoral de Justiça e Liberdade – Pastoral Penitenciária – proclama o seu compromisso para com as pessoas privadas de liberdade, por qualquer motivo; nenhuma delas está irremediavelmente perdida…”. “Particularmente expressamos a nossa adesão aos postulados da Justiça Restaurativa ou Reconciliadora. À luz da Doutrina Social da Igreja, optamos por um modelo de justiça que proteja de maneira efectiva a vítima, que responsabilize o infractor e que devolva a paz social, minimizando o uso de meios coercivos ou violentos. Apostamos em todas as formas de mediação penal comunitária, como um modo de atender efectivamente às necessidades reais das pessoas afectadas pelo delito”.

Também nas Prisões de Portugal existem pessoas destes grupos vulneráveis: temos mais de 150 reclusos inimputáveis, internados em Estabelecimentos Psiquiátricos não Prisionais; cerca de 2350 estrangeiros – mais de 20% do total de Reclusos; um total de 612 mulheres, algumas das quais com filhos menores com elas, na Prisão; idosos – são 379 com mais de 60 anos – ,e pessoas portadoras de deficiências várias; temos Menores, uns em Centros Educativos e outros em meio Prisional; estes, nunca com menos de 16 anos: com idades entre os 16 e os 18 anos estão detidos cerca de 90.

A experiência de Espanha, no sector da Pastoral Penitenciária, faz-nos despertar para o muito que ainda nos resta fazer, no sector desta Pastoral tão específica. O nosso esforço, de muita urgência, é estar nos Estabelecimentos Prisionais, com Capelães e Colaboradores Voluntários, numa acção directa com os Reclusos; e criar ou revitalizar, em todas as Dioceses, um Departamento da Pastoral Penitenciaria, que dinamize e desenvolva a consciência das Comunidades, no sentido de se fazer a Prevenção do crime, a Reinserção social dos reclusos, e de dar a atenção devida e urgente às vítimas dos crimes, e às Famílias de Reclusos e vítimas.

É por aqui que estamos lançando as nossas maiores preocupações e esforços, para que a Sociedade, as Leis e o Sistema Penitenciário sejam, sempre e cada vez mais, humanizados e humanizantes. Para o bem de todos!

Aveiro, 19 de Setembro de 2010

P. João Gonçalves, Coordenador Nacional da Pastoral Penitenciária

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top