Greve: «Não podemos ficar calados»

Fátima Almeida, Coordenadora Nacional da LOC/MTC

A LOC/MTC – Liga Operária Católica/Movimento de Trabalhadores Cristãos vê na greve geral do dia 24 de Novembro, convocada pelas duas centrais sindicais, a possibilidade dos trabalhadores manifestarem a sua indignação pelas graves injustiças e angústias dos tempos presentes, mas também a oportunidade de os mesmos se unirem em torno de um ideal de mudança de paradigma, onde a pessoa humana se torne o princípio e o fim do desenvolvimento económico e financeiro.

A nossa convicção da necessidade de mudança baseia-se nas consequências que a globalização económica e financeira desregulada e sem ética está a ter na vida dos trabalhadores e famílias, e é fundamentada no compromisso evangélico de que “é uma vez mais o homem, que deve continuar a ser o verdadeiro protagonista do seu trabalho”. (CDSI – Compendio da Doutrina Social da Igreja, 317)

Por isso não podemos ficar calados e indiferentes quando a precariedade laboral afecta já gravemente a dignidade de vida de milhares de trabalhadores, enquanto muitos outros são fragilizados pelo medo diante do futuro do seu posto de trabalho. Pois verificamos ainda que os novos contratos de trabalho são cada vez mais precários, com horários cada vez mais desregulados – com evidentes prejuízos para a saúde e estabilidade familiar – e com muito mais baixas remunerações.

E não podemos aceitar como uma fatalidade do presente e do futuro que milhares de homens e mulheres se vejam excluídos do acesso ao trabalho, incluindo aqueles que são considerados velhos para trabalhar e novos para a reforma. E que tantos jovens, mesmo os mais qualificados, não encontrem também o seu merecido emprego que lhes dê estabilidade financeira para constituir a sua família e projectar o seu futuro.

E temos de nos indignar porque a precariedade laboral, os salários irrisórios e o desemprego crescente são hoje as principais causas do aumento da pobreza e da desestruturação de tantas famílias. Porque é também por estes motivos que tem aumentado o número de cidadãos a viver dos subsídios sociais, agora injustamente reduzidos, e crescido as estatísticas das doenças mentais.

Estas realidades são hoje graves atentados aos direitos humanos, pondo em causa o elementar direito ao trabalho digno e justamente remunerado para todos os cidadãos, no respeito pelas suas capacidades e qualidades. “O trabalho é um bem de todos, que deve estar disponível para todos aqueles que são capazes de trabalhar. O «pleno emprego» é, portanto, um objectivo obrigatório para todo o ordenamento económico orientado para a justiça e para o bem comum” (CDSI 288)

É diante destas realidades que consideramos legítima e adequada a greve anunciada. Esta não é, para nós, uma posição fácil nem tomada de ânimo leve. Mas “como recurso inevitável, senão mesmo necessário, em vista de um benefício proporcionado”. (CDSI 304). A greve deve ter como função tornar visível o desagrado dos trabalhadores e dos cidadãos, mas deve também alicerçar ainda mais a solidariedade entre estes e aqueles, reforçando as capacidades das associações sindicais no combate à mercantilização dos trabalhadores.

Como movimento de trabalhadores cristãos entendemos que os homens e as mulheres não podem ser usados somente e sobretudo em função do lucro alheio e dos seus bens de consumo. O trabalho é sempre o principal meio de desenvolvimento humano, permitindo a realização material, cultural e espiritual.

Também os bens do trabalho devem ser a expressão da comunhão de origem, de destino e de dignidade de todos os seres humanos, conforme é referenciado por vários documentos do Ensino Social da Igreja, bem como do Antigo e do Novo Testamento.

Por isso também esperamos que desta acção de luta saiam mais reforçados os laços de solidariedade entre os trabalhadores e as suas organizações sindicais, estas se sintam mais implicadas numa verdadeira concertação social, onde todos os parceiros sociais – sindicatos, empresários e governo – se comprometam nos princípios de uma justa repartição do trabalho e das riquezas por si geradas.

Apelamos ainda para que apareça visível na sociedade uma nova cultura empresarial onde as empresas assumam o seu lugar de responsabilidade social para com os trabalhadores e as suas famílias, bem como de desenvolvimento sustentável das comunidades onde estão inseridas.

Fátima Almeida, Coordenadora Nacional da LOC/MTC

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