Exortação apostólica liga defesa da vida ao amor pelos pobres e migrantes
Lisboa, 09 abr 2018 (Ecclesia) – O Papa Francisco propõe hoje na sua nova exortação apostólica, ‘Gaudete et Exsultate’, uma maior atenção aos mais necessitados e à justiça social na vida dos católicos, que desafia a “reconhecer Jesus nos pobres e atribulados”.
“Não podemos propor-nos um ideal de santidade que ignore a injustiça deste mundo, onde alguns festejam, gastam folgadamente e reduzem a sua vida às novidades do consumo, ao mesmo tempo que outros se limitam a olhar de fora enquanto a sua vida passa e termina miseravelmente”, assinala, no texto dedicado à santidade no mundo contemporâneo.
‘Gaudete et Exsultate’ (Alegrai-vos e exultai), a terceira exortação apostólica do atual pontificado, aponta o dedo à falta de coerência de alguns cristãos nas propostas éticas e sociais.
“Muitas vezes ouve-se dizer que, face ao relativismo e aos limites do mundo atual, seria um tema marginal, por exemplo, a situação dos migrantes. Alguns católicos afirmam que é um tema secundário relativamente aos temas ‘sérios’ da bioética”, lamenta Francisco.
O Papa sustenta que a “única atitude condigna” dos cristãos perante a crise dos refugiados “é colocar-se na pele do irmão que arrisca a vida para dar um futuro aos seus filhos”.
https://www.facebook.com/vaticannews.pt/videos/1593567154084659/
A exortação apostólica, documento de teor catequético, desafia as comunidades a promover uma defesa efetiva da vida em todas as suas etapas, sem desprezar nenhuma.
“A defesa do inocente nascituro, por exemplo, deve ser clara, firme e apaixonada, porque neste caso está em jogo a dignidade da vida humana, sempre sagrada, e exige-o o amor por toda a pessoa, independentemente do seu desenvolvimento”, assinala.
Francisco sublinha, em seguida, que “igualmente sagrada é a vida dos pobres que já nasceram e se debatem na miséria, no abandono, na exclusão, no tráfico de pessoas, na eutanásia encoberta de doentes e idosos privados de cuidados, nas novas formas de escravatura, e em todas as formas de descarte”.
O documento retoma a importância da misericórdia, conceito central no pontificado, e aponta como referência de vida espiritual o capítulo 25 do Evangelho segundo São Mateus, que indica um julgamento divino com base no que cada pessoa fez em prol do outro.
“Quando encontro uma pessoa a dormir ao relento, numa noite fria, posso sentir que este vulto é um imprevisto que me detém, um delinquente ocioso, um obstáculo no meu caminho, um aguilhão incómodo para a minha consciência, um problema que os políticos devem resolver e talvez até um monte de lixo que suja o espaço público”, adverte o pontífice.
O Papa convida antes a “reagir a partir da fé e da caridade” e reconhecer no necessitado “um ser humano com a mesma dignidade”.
“Poder-se-á porventura entender a santidade prescindindo deste reconhecimento vivo da dignidade de todo o ser humano?”, questiona.
O texto alerta para o erro dos que separam estas exigências do Evangelho do seu “relacionamento pessoal” com Deus, transformando o Cristianismo numa “espécie de ONG”, bem como para o erro das pessoas que olham com suspeita para “o compromisso social dos outros”, considerando-o “superficial, mundano, secularizado, imanentista, comunista, populista”.
“Poder-se-ia pensar que damos glória a Deus só com o culto e a oração, ou apenas observando algumas normas éticas (é verdade que o primado pertence à relação com Deus), mas esquecemos que o critério de avaliação da nossa vida é, antes de mais nada, o que fizemos pelos outros”, defende o Papa.
OC
No capítulo 25 do Evangelho de Mateus (vv 31-46), Jesus volta a deter-se numa destas bem-aventuranças: a que declara felizes os misericordiosos. Se andamos à procura da santidade que agrada a Deus, neste texto encontramos precisamente uma regra de comportamento com base na qual seremos julgados: “Tive fome e destes-Me de comer, tive sede e destes-Me de beber, era peregrino e recolhestes-Me, estava nu e destes-Me que vestir, adoeci e visitastes-Me, estive na prisão e fostes ter comigo” (Mt 25, 35-36).
Papa Francisco, «Gaudete et Exsultate» |