Funchal: A Senhora da Lapinha

Disse que sim e sorriu. A serenidade tomou conta dos olhos de Maria e o mundo ficou em paz. Vejo-a, assim, no meu Presépio. Olha para o Menino que adormeceu, na doçura do seu olhar e ensina-me o valor da disponibilidade, do serviço, da vida que se escreve, em cada dia, no silêncio de nós.

Nas palavras que cala, a Senhora da Conceição, diz-me que é preciso saber esperar. Apesar da loucura das compras e da vida, apesar do medo do amanhã, apesar do vento que quer arrancar a esperança, é preciso saber esperar. Contra todo o desespero.

Sigo a direcção do seu sorriso. As asas dos meus olhos pousam na pobreza de um Menino que sorri de dentro do sonho do Seu Natal. Lembro-me, então, de outros natais, em outros tempos, de uma ansiedade doce, do nome Jesus escrito no peito, da saudade da inocência, do dia de estrear a roupa da festa.

A Senhora da lapinha sorri. Eu também sorrio à criança que fui. Do fundo de mim, o sorriso da Senhora da Lapinha diz-me que sim, que é preciso lutar contra o vazio dos sacos cheios de compras, que é preciso acender a alegria, que é preciso contrariar o cinzento da manhã, que é preciso abrir um sorriso nas janelas das casas. Do fundo de mim, o olhar terno da Senhora da Lapinha aponta-me o Deus pequenino, diante do qual se ajoelha, por causa de Quem, é quem é.

Disse que sim e sorriu. Ensina-me, hoje, o valor do silêncio. Mostra-me que é possível fazer Natal na pobreza das coisas. Diz-me que a felicidade tem outros nomes, que vive dentro das casas, que se escuta na música do sorriso, que se agarra na mão que segura outras mãos, que se pinta na paz branca que se restaura, todos os dias, dentro de nós.

– Mãe, a Senhora não dorme?

E a mãe diz que não. Ela tem de velar o Menino que tem nos braços. A Senhora da lapinha tem de velar os filhos durante a noite dos seus desencantos, para os impedir de morrer.
A Senhora da Lapinha sorri. Eu também.

Graça Alves

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