Fragilidades do Papa num Jubileu consequente

Paulo Rocha, Agência Ecclesia

Ainda era noite. O início das caminhadas de vários grupos para peregrinar à Porta Santa na Basílica de São Pedro desde as margens do rio Tibre foi antecipado uma hora, começou às 07h00 e não às 08h00, como habitualmente (eram muitos os grupos previstos). Os peregrinos de Portugal foram dos primeiros, mais de meia centena, entre os muitos que participávamos no Jubileu do Mundo das Comunicações. Cumpria-se um ponto do programa, simbólico, em grupo, a partir dos sentimentos que preenchiam essa alvorada fria, em Roma.

Um dia depois, na tarde de domingo, foi possível voltar a esse percurso, sozinho. E consegui escolher a companhia: o texto que o Papa tinha previsto dizer aos milhares de comunicadores, no encontro que aconteceu mais de quatro horas depois de terem passado pela Porta Santa, mas o cansaço não deixou… Entregou o texto a cada uma e a cada um (disponível também em português). E confiou-nos o compromisso de o retomar, no próprio dia, no seguinte ou em tantas ocasiões, na jornada de cada história que se procura narrar e partilhar com tantos públicos.

Por certo que todos esperávamos ouvir, pela voz do Papa, o “obrigado a todos os agentes da comunicação que arriscam a própria vida para procurar a verdade e narrar os horrores da guerra”; rezar com ele por “todos aqueles que sacrificaram a vida neste último ano, um dos mais letais para os jornalistas”;  evocar os comunicadores que “estão presos simplesmente por terem sido fiéis à profissão de jornalista, fotógrafo, operador de vídeo, por terem desejado ir ver com os próprios olhos e por terem procurado narrar o que viram”. E ouvir a voz do Papa a defender a “liberdade de imprensa e de manifestação do pensamento”; a afirmar a necessidade de uma “informação livre, responsável e correta”; e a dizer que ser jornalista não é só uma profissão, mas também “vocação e missão”. Depois, a lembrar “o estudo e a reflexão”, a necessidade “de ver e de ouvir”, de se colocar “ao lado dos marginalizados, de quem não é visto nem ouvido”. E ainda encorajar à “mudança necessária para superar a mentira e o ódio” e a uma aposta clara no “poder transformador da narração, do conto e da escuta de histórias”, “também histórias de esperança, histórias que alimentam a vida”.

Para os presentes, não ouvir a voz do Papa pode ter retirado emoção à mensagem, tão essencial para que possa chegar a tantos, a mais comunicadores. Mas não está em causa a certeza e oportunidade do que foi escrito, reafirmado nestes dias também na mensagem para o 59º Dia Mundial das Comunicações Socais, e ainda no discurso do Papa aos responsáveis pela comunicação nas Conferências Episcopais, revelando uma sintonia no ambiente do Vaticano sobre a importância da comunicação e o papel que tem para a Igreja Católica na atualidade.

Este foi um momento do Jubileu para o Mundo das Comunicações, que teve muitos outros, geradores de encontro e emoções, que desafiam a consequências concretas. Foram dias com grande impacto nos participantes (e também nos que acompanharam à distância).

Para o grupo de Portugal, o diálogo com o cardeal D. José Tolentino Mendonça, prefeito do Dicastério para a Cultura e Educação, a irmã Simona Brambilla, prefeito do Dicastério para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, e padre Antonio Spadaro, subsecretário do Dicastério para a Cultura e Educação, foi ocasião de expandir horizontes sobre o pontificado do Papa Francisco e a forma de cada um de nós, também na comunicação, seguir o seu propósito; também nas celebrações, nomeadamente em torno da Porta Santa; e depois na oportunidade de encontro, de diálogo com conhecidos e desconhecidos, nos auditórios ou nos restaurante, nos púlpitos ou nas vias romanas.

O Jubileu do Mundo das Comunicações convida a olhar não para o copo meio cheio, mas para o copo quase cheio que resulta da primeira celebração setorial deste ano e convocou comunicadores de 138 países. Esvaziar o copo significa distanciar-me dos compromissos ouvidos com aclamação durante quatro dias. Porque, também por causa das fragilidades do Papa a reclamar a participação de toda a Igreja e de cada um de nós, este foi um Jubileu consequente.

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