«Fórum Migrações»: «Defender a própria identidade sem se abrir à diferença é criar uma sociedade autorreferencial», afirma D. José Ornelas

Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa abriu encontro em Fátima, pedindo que se afirme na Igreja uma «cultura nova», «de respeito», «de acolhimento» face aos migrantes 

Foto: Agência ECCLESIA/CB

Fátima, 15 nov 2025 (Ecclesia) – O presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), D. José Ornelas, criticou hoje, na abertura do ‘Fórum Migrações’, em Fátima, a rejeição da abertura à diferença que leva à criação de uma sociedade centrada em si mesma.

“Pretender defender a própria identidade sem se abrir à diferença e à alteridade e à transformação social é criar uma sociedade autorreferencial, para não dizer incestuosa, controladora e manipuladora, incapaz de responder a um mundo em constante movimento que gera encontros diferenciados e parcerias novas para novas realidades”, afirmou D. José Ornelas.

Bispos portugueses, participantes das dioceses com ligação à dinâmica das migrações, aos organismos nacionais da CEP e às congregações religiosas estão hoje reunidos, no Centro Pastoral Paulo VI, com o objetivo de sensibilizar e formar as comunidades cristãs para o fenómeno migratório.

Segundo o bispo de Leiria-Fátima, fazer jus ao ADN identitário de um povo “não é ver o estrangeiro como um perigo e um inimigo, mas como alguém que se acolhe na sua riqueza, na sua necessidade e pobreza e que nessa condição partiu para receber e dar, onde for acolhido”.

“Por isso é importante que o processo legislativo em curso seja uma ocasião de real esforço de direito e de justiça, desde as condições de entrada no país, à sua integração social, à sua defesa contra explorações e exclusões”, indicou.

D. José Ornelas explicou que o ‘Fórum Migrações’ pretende ser uma “tomada de consciência e um passo decidido da Igreja em Portugal para responder a um fenómeno que atinge dramaticamente e, de forma mais ou menos intensa, todos os países, tanto os que se debatem com a emigração dos partem, como os que são metas de migrações humanas”.

“Concretamente, no nosso país, sobretudo nos últimos anos, este fenómeno atingiu dimensões nunca conhecidas anteriormente, impondo-se, por isso, a tomada de medidas para garantir que as pessoas que chegam ao nosso país o façam em segurança e sem interferência de redes de manipulação e extorsão”, salientou.

Segundo o presidente da CEP, esta é a melhor forma de “assegurar uma justa e bem-sucedida integração” dos migrantes, bem como de impedir “a difusão da xenofobia, da deturpação interesseira da verdade, da manipulação do medo em nome de uma ideia e uma identidade fechada que contradiz o ADN” do povo português, “nascido com a migração de povos”.

Reforçando que a Igreja em Portugal não pode ficar alheia ao fenómeno migratório, o bispo de Leiria-Fátima espera que este o ‘Fórum Migrações’ seja o primeiro de muitos encontros, uma vez que os problemas não se vão resolver todos hoje.

“Que se afirme na Igreja, em cada uma das nossas igrejas diocesanas e na Igreja no seu conjunto, uma cultura nova, uma cultura do respeito, uma cultura por dever cumprido, uma cultura de acolhimento que não desconsidera todas as outras componentes”, pediu.

No discurso, o presidente da CEP valorizou o contributo que os migrantes dão às cidades portuguesas, nas quais assumem funções “mais diversificadas”, em serviços públicos e sociais, bem como em indústrias, escolas e universidades.

“Em muitos dos nossos lares e locais de cuidado dos mais frágeis, são os estrangeiros, a maioria dos que cuidam dos mais desvalidos, como o estrangeiro samaritano do Evangelho, o único que se compadeceu daquele que tinha ficado à margem da estrada da vida”, referiu.

Sobre o acolhimento dos migrantes, D. José Ornelas apontou que “não há melhor caminho de integração” do que sentar-se nos bancos de uma igreja, ao lado de pessoas que não se conhecem, cuja língua não se fala, mas que olham e são “olhados como irmãos e irmãs”.

“Nós igreja temos um papel que é de integração, mas é preciso que funcione, e que o façamos funcionar, e que tenhamos iniciativa para que, não esperando simplesmente que venham bater à nossa porta, mas sermos nós a tomar a iniciativa de integrá-los, de chamá-los”, referiu.

Realçando que a Igreja não quer fazer do acolhimento proselitismo, o presidente da CEP incentivou os presentes que sejam “verdadeiros samaritanos para quem chega” ao território nacional.

Organizado pela Conferência Episcopal Portuguesa, o ‘Fórum Migrações’ incluiu, durante a manhã, um momento de sensibilização inicial feito pelos organismos nacionais que desenvolvem a sua ação na área das migrações e trabalhos de grupo de escuta e diálogo.

A tarde conta com a presença de Rui Marques, antigo Alto-Comissário para a Imigração e membro do Consenso Imigração, e Pedro Góis, diretor científico do Observatório das Migrações, que vão procurar ajudar os presentes a pensar sobre a legislação e a ação da sociedade em geral sobre este tema.

O encerramento do encontro cabe ao presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana, D. José Traquina.

CB/LJ

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