Padre José Cristino Coelho destaca tradição essencial do ponto de vista religioso mas também humano e social
Lisboa, 31 out 2014 (Ecclesia) – O padre José Cristino Coelho, missionário de São João Batista e antigo capelão hospitalar, falou à Agência ECCLESIA sobre o significado do Dia de Fiéis Defuntos que a Igreja Católica vai assinalar este domingo.
Segundo o sacerdote, recordar e homenagear os mortos é uma tradição essencial do ponto de vista cristão, religioso, mas também humano e social.
Com a ida ao cemitério, as pessoas têm oportunidade de expressar a sua “gratidão para com aqueles que já partiram”, de dizer que eles permanecem no seu coração, de se reconciliarem com a morte.
As “velas” que se acendem, as “flores” que se renovam nas campas, gestos característicos deste dia, representam a “esperança” numa vida que “não termina ali”, que continua em “comunhão” com os seus entes mais próximos.
“Muita gente diz ‘eles estão a velar por nós’, se estão junto de Deus Pai e Deus nos acompanha, também nos acompanham a nós. As pessoas dizem isto espontaneamente, nem todas, mas nesta perspetiva da fé acho bonito, o Dia de Fiéis Defuntos é também um convite para isso”, salienta o padre José Cristino Coelho.
O antigo capelão hospitalar destaca depois a reunião familiar que marca também o Dia de Fiéis Defuntos, em que até parentes “que andavam distantes” se “reencontram no cemitério”, tornando-o “também num lugar de vivos”.
“Uma coisa muito bonita, sobretudo nas grandes cidades e mesmo fora, nas aldeias onde as pessoas vêm de longe para estarem com os seus familiares e amigos e fazerem a romagem ao cemitério”, sustenta o sacerdote.
Neste caso, é a morte que também une e aproxima as pessoas e “traz à tona aquilo que está na raiz de uma família”, o seu passado, na forma de “um pai ou de um avô” já falecido, a herança espiritual, os valores que eles deixaram e que assim passam “de geração em geração”.
Numa sociedade em crescente “secularização”, até que ponto é que a tradição do Dia dos Fiéis Defuntos pode estar em causa?
Para o padre José Cristino Coelho, não há dúvidas de que “em termos percentuais, tanto na Europa como em Portugal, o catolicismo diminuiu bastante” e portanto “pode haver mais indiferença” perante esta proposta cristã de encarar a morte.
“É mais difícil lidar com o tema da pós-morte, da vida eterna, da imortalidade, porque as pessoas não têm fé”, admite o sacerdote.
No entanto, mais do que uma questão religiosa, a Igreja Católica está perante um desafio cultural, de uma sociedade que tende a olhar para a morte como uma coisa “tabu”, que precisa de ser colocada longe dos olhares das pessoas.
“Há décadas atrás a morte era um momento natural, de tal maneira que a família participava na morte do ente querido. Hoje evita-se que as crianças participem ou estejam presentes nestas circunstâncias”, exemplifica o antigo capelão.
Até a forma de dar destino aos mortos está em mudança, com muitas famílias a optarem cada vez mais pela cremação do que pela sepultura dos seus entes queridos.
Na opinião do padre José Cristino Coelho, a “ligação” das pessoas “com o túmulo” pode estar “a desaparecer”, algo que deve levar a Igreja Católica a reconfigurar a sua proposta pastoral nesta área.
“Há cada vez mais crematórios, sobretudo nas grandes cidades e a Igreja tem de se adaptar a essa nova situação”, conclui.
O Dia de Fiéis Defuntos vai ser tema em destaque no programa 70×7 do próximo domingo, a partir das 11h18 na RTP2.
SN/JCP