A paz é uma construção que começa no interior de cada ser humano. Sermos os primeiros a amar, sem esperarmos que sejam os outros a dar o primeiro passo, amar até os inimigos, esquecendo ofensas do passado e aprendendo a perdoar, tal é o desafio que os jovens assinalam na mensagem que circula pelo mundo “Peace, top priority”. Viver procurando aquilo que nos une, em vez daquilo que nos divide, sentirmo-nos membros da mesma família espalhada por toda a terra, essa é a tarefa assinalada pelos jovens, em tempo de múltiplas guerras. O tema deste grupo de trabalho é o da construção da paz nas famílias, nas escolas, nos meios de comunicação social e nas Igrejas. Concordaremos todos que estes “ambientes” de educação são espaços e os tempos privilegiados de construção da paz. De uma construção diária da paz, alicerçada em valores, fundada numa ética que envolva e dê aos mais pequenos gestos do quotidiano. Em tempo de guerra, como aquele que acabamos de presenciar, os media provocam reacções fortes, mobilizam a opinião pública, mas raramente ajudam a compreender os problemas estruturais que alimentam a guerra. Há, neste aspecto como em outros, uma espécie de tabloidização da vida quotidiana, que fecha em vez de abrir horizontes, que provoca mas não vai até aos porquês, que, no limite, formata mas não educa. Há um número crescente de cidadãos que considera que o debate ético se impõe nas organizações e empresas que controlam os media. O debate sobre a verdade, a liberdade, a justiça e a paz não deveria transpor o mero foro individual ou de pequenos grupos profissionais, para alcançar o âmago da produção dos media? Importaria, nesta sociedade tão marca-da pela informação e pelos media, desencadear uma adequada educação para o uso crítico e esclarecido dos media, quer do ponto de vista da utilização e do consumo quer do ponto de vista das capacidades de expressão através dos media, usufruindo da variedade de suportes e de linguagens. Essa não seria uma tarefa da educação escolar? As escolas desempenham um papel crucial na educação das crianças e dos jovens para a paz. Desde logo no acesso à educação escolar, importa assegurar a justiça social, um dos pilares da paz, criando as condições para a realização de percursos educativos dignos para todos os portugueses. Em seguida, na promoção de valores que confinam com a paz, como a tolerância, a verdade, a solidariedade, a justiça, a participação social, a liberdade. Se queremos contribuir para eliminar o racismo e a xenofobia que grassam pelo nosso mundo, não deveremos investir na escola como espaço aberto a todos, em qualquer idade, qualquer que seja o seu género, cor, etnia e condição social? Pensamos que a escola pode ser um espaço privilegiado de aprendizagem da paz, dos pensamentos e das atitudes de paz. Para isso tem de percorrer caminhos árduos como o desenvolvimento da compreensão e a prática da solidariedade humana, como a tolerância e o respeito pelos direitos humanos, como a promoção dos princípios democráticos e de uma real participação social, como o respeito pelo meio ambiente e a compreensão das vantagens de um desenvolvimento sustentável. Será que as nossas escolas avivam esta formação ou escondem-na atrás de disciplinas “muito importantes”? Não haverá margens de progressão muito grandes, nas nossas escolas, para a aprendizagem da paz? A família pode ser um bom núcleo humano fundador da paz. Somos chamados por Deus, como diz o Papa, a formar uma única família. Educar para a paz é ensinar o respeito pelo outro, compreender o lugar do outro na minha própria construção pessoal, é ensinar e aprender a resolver os conflitos. As famílias podem ser espaços privilegiados de aprendizagem de paz. É esse o ambiente que prevalece nas nossas famílias? Que paz se edifica em famílias onde se multiplicam os maltratos, onde não há respeito mútuo, onde a pobreza e a injustiça conduzem a situações de desespero e de conflito? Que horizontes de paz podem as famílias construir de novo, em esperança, nomeadamente como exemplo de vida para os seus filhos? A educação religiosa desempenha um papel particularmente importante na educação de espíritos de sincera abertura e tolerância, de espíritos de paz. Diz o Papa João Paulo II que “a religião possui uma função vital para suscitar gestos de paz e consolidar condições de paz, podendo desempenhá-la de forma tanto mais eficaz quanto mais decididamente se concentrar naquilo que lhe é próprio: a abertura a Deus, o ensino da fraternidade universal e a promoção duma cultura solidária”. Como vivemos este espírito construtor da paz nas nossas comunidades eclesiais? Como é que a Igreja hoje presente em Portugal está a ser testemunha desta função vital de suscitar gestos de paz? Diz Frederico Mayor: “Compete às gerações presentes a quase impossível tarefa bíblica de “transformar as lanças em arados” (Is 2,4) e evoluir de um instinto de guerra – forjado desde a origem dos tempos – para uma consciência de paz. Seria o melhor legado para deixar aos nossos descendentes. Com que satisfação poderíamos olhar nos olhos dos nossos filhos!” Joaquim Azevedo