Eutanásia/Bioética: Reflexão sobre «obstinação terapêutica» propõe medicina mais centrada no doente

Novo documento da Academia Pontifícia para a Vida reforça oposição a tratamentos desproporcionais

Cidade do Vaticano, 20 ago 2024 (Ecclesia) – O novo documento da Academia Pontifícia para a Vida (APV) sobre o fim da vida apresenta uma reflexão sobre a chamada “obstinação terapêutica”, propondo uma medicina mais centrada no doente.

“A Igreja convida a refletir sobre o facto de a obstinação terapêutica não ser expressão de uma medicina a favor do doente”, refere D. Vincenzo Paglia, presidente da APV, em declarações ao portal de notícias do Vaticano.

O responsável falava a respeito da publicação do ‘Pequeno Léxico do fim da vida’, que apresentou pessoalmente ao Papa no dia 8 de agosto.

A obra, com 88 páginas, aborda questões relacionadas com o fim da vida, da eutanásia e suicídio assistido aos cuidados paliativos ou sedação profunda.

O texto gerou polémica ao apontar a importância da vontade do doente relativamente à “alimentação e a hidratação preparadas para pacientes vegetativos”.

O presidente da APV rejeita que se esteja perante uma “abertura” da Santa Sé à suspensão de nutrição e de hidratação, nestes casos, recordando que já em 2007 a então Congregação para a Doutrina da Fé admitia que esta administração poderia ser “licitamente interrompida” quando comporta “uma excessiva gravidade ou um relevante desconforto físico”.

“Esses são dois critérios que fazem parte da definição de tratamento não proporcional, ou seja, aquele que deve ser suspenso. É uma avaliação que exige sempre, na medida do possível, o envolvimento do paciente. O ‘Léxico’ deve ser lido em sua totalidade”, sustenta D. Vincenzo Paglia.

O responsável acrescenta, a este respeito, que “a Igreja reitera a sua oposição absoluta a qualquer forma de eutanásia e suicídio assistido”.

A 22 de setembro de 2020, a Congregação para a Doutrina da Fé publicou um documento sobre o fim da vida, no qual reforça a oposição à eutanásia e suicídio assistido, responsabilizando políticos e instituições católicas que intervenham direta ou indiretamente nestas práticas.

“A Igreja considera que deve reafirmar como ensinamento definitivo que a eutanásia é um crime contra a vida humana porque, com tal ato, o homem escolhe causar diretamente a morte de um outro ser humano inocente”, assinala a carta, intitulada ‘Samaritanus Bonus’ (O Bom Samaritano).

O documento, aprovado pelo Papa, deixava um alerta contra a obstinação terapêutica, convidando a “aceitar o limite da morte como parte da condição humana” e a uma “aliança terapêutica entre o médico e o doente, ligados pelo reconhecimento do valor transcendente da vida e do sentido místico do sofrimento”.

“É lícito tomar a decisão, em ciência e consciência, de renunciar a tratamentos que provocariam apenas um prolongamento precário e penoso da vida, sem interromper os cuidados normais devidos ao doente em casos similares”, pode ler-se.

Quando o fornecimento de substâncias nutrientes e líquidos fisiológicos não produz nenhum benefício ao paciente, porque o seu organismo já não  está em condições de os absorver ou metabolizar, a sua administração deve ser suspensa. Deste modo não se antecipa ilicitamente a morte por privação de suportes hidratantes e nutricionais essenciais às funções vitais, mas respeita-se o decurso natural da doença crítica ou terminal” (‘Samaritanus Bonus’, 2020).

A carta recorda casos judiciais que, nos últimos anos, têm levado a suspender cuidados de suporte vital para doentes em estado vegetativo, falando em “obrigatoriedade deste cuidado do doente, através de apropriada hidratação e nutrição”.

Estas podem exigir “o uso de via artificial na sua administração, sob condição de que não resulte danosa ao doente ou lhe provoque sofrimentos inaceitáveis”.

Outro tema abordado é o do testamento vital, sendo pedido “respeito à vontade do moribundo, expressa nas assim chamadas declarações antecipadas de vontade quanto ao tratamento”, excluindo “qualquer ato eutanásico ou suicida”.

Já em 2016, a Conferência Episcopal Portuguesa publicou uma série de “Perguntas e respostas sobre a Eutanásia”, acompanhando a nota pastoral ‘Eutanásia: o que está em jogo? Contributos para um diálogo sereno e humanizador’.

O texto sublinhava que “quer a eutanásia, quer a obstinação terapêutica, desrespeitam o momento natural da morte: a primeira antecipa esse momento, a segunda prolonga-o de forma artificialmente inútil e penosa”.

As questões apresentavam ainda o termo “distanásia”, que “consiste em utilizar todos os meios possíveis — sem que exista uma esperança de cura — para prolongar de forma artificial a vida de um doente moribundo”.

OC

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Agência ECCLESIA

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