Documento destaca impacto da pandemia e risco agravado de pobreza para trabalhadores com menos rendimentos
Lisboa, 17 mar 2022 (Ecclesia) – A Cáritas Portuguesa apresentou hoje o mais recente relatório ‘Cáritas CARES’, sobre a pobreza, centrado nos desafios de ‘Mercados de Trabalho Inclusivos’ e da pandemia de Covid-19, no contexto da sua semana nacional, na Paróquia de S. Julião da Barra (Oeiras).
“A situação é transversal à Europa, não temos grande diferença, estamos na mesma situação o que para mim também é espantoso”, disse a presidente da Cáritas Portuguesa, em declarações aos jornalistas.
Rita Valadas realçou que, em Portugal, os trabalhadores pobres chegam “mais rápido” ao nível de dificuldade do que outros países da Europa.
A Cáritas Portuguesa explica que os relatórios ‘CARES’ sobre a pobreza são produzidos pela Cáritas Europa, de dois em dois anos, abordando tópicos de política social – “da pobreza nos jovens até os desafios de acesso aos serviços sociais” – e pretendem “reforçar o trabalho de influência política da rede Cáritas, a nível nacional e europeu”.
Rita Valadas referiu que o tema deste relatório, que a Cáritas Europa constrói com as organizações nos diversos países, “é a empregabilidade” e as questões que “assustam”, como o emprego não ser motivo da proteção da pobreza, os fatores que causam maior vulnerabilidade e que “implicam com a questão da empregabilidade”.
“Isso somado a outras situações de fragilidade – estar em situação de risco, ter um rendimento baixo, qualquer doença, qualquer nascimento – pode levar as pessoas a uma situação de precariedade”, identificou a presidente da Cáritas Portuguesa.
O relatório europeu ‘Mercados de Trabalho Inclusivos’ foi apresentado hoje pela diretora de advocacia da Cáritas Europa, Shannon Phofmman, e por Nuno Alves, do Observatório Cáritas, na Paróquia de São Julião da Barra, em Oeiras.
Em declarações aos jornalistas, Shannon Phofmman realçou que o relatório da pobreza tem “muitos elementos importantes” e, essencialmente, fizeram uma análise da situação das pessoas em 18 países, “e os desafios que tinham no acesso ao mercado de trabalho”.
“O que o nosso estudo mostra é que o mercado de trabalho, por si só, não é a solução. Há pobreza entre quem trabalha, devido à prevalência da precariedade laboral, e muitas pessoas lutam para pagar as suas despesas, por isso recorrem cada vez mais aos serviços Cáritas”, desenvolveu.
Segundo a diretora de advocacia da Cáritas Europa, no relatório assinalam que “há muito mais a fazer para garantir um sistema forte de proteção social”, para que as pessoas tenham acesso a um rendimento mínimo para sobreviverem, e quem trabalha seja capaz de “ter garantido um salário mínimo que permita uma vida digna”.
Shannon Phofmman salienta que há muitas coisas que a União Europeia e os Estados-membros podem fazer para responder aos “desafios” que a organização identificou, “e já têm feito muito”, destacando ainda o debate em curso “sobre o salário mínimo”, que esperam que “seja adotada este ano”, e uma plataforma sobre os trabalhos irregulares, “trabalho não declarado”, é preciso assegurar que “as pessoas não são exploradas e têm proteção”.
A diretora de advocacia da Cáritas Europa explicou que alguns elementos que pesquisaram antes da pandemia, e que eram “desafios persistentes nesta área”, afetaram particularmente durante a Covid-19 um número de pessoas em grupos como os migrantes, os jovens, os trabalhadores mais velhos, pessoas portadoras de deficiência, as comunidades ciganas, as mulheres, os cuidadores, os trabalhadores informais e os trabalhadores não declarados.,
Já Nuno Alves, do Observatório Cáritas, centrou a sua apresentação no funcionamento do mercado de trabalho e sobre a realidade que “não há uma relação limiar entre o estar empregado e o estar ou não estar numa situação de pobreza ou exclusão social”.
Este responsável apresentou números sobre a situação do emprego e do desemprego em Portugal durante a pandemia Covid-19, e revela que o que aconteceu “não estava nas melhores expectativas”, porque o desemprego em Portugal em 2021 “está num nível pré-pandémico” e, neste momento, “está a baixo”, isto é, “há mais pessoas a participarem no mercado de trabalho do que antes da pandemia”.
“O que é um evento extraordinário e está muito ancorado na reação das famílias e das empresas mas também dos apoios públicos, implementados em Portugal e em toda a Europa, no fundo de apoio à manutenção do posto de trabalho de cada um”, desenvolveu o membro da Direção da Cáritas Portuguesa.
Nuno Alves alertou para a realidade escondida do “grande aumento das desigualdades”, e exemplificou que “os empregos cresceram essencialmente a partir dos 35 anos em frente”, com os jovens a terem uma “diminuição muito grande no mercado e trabalho, uma queda de quase 20%”, mas “estudaram mais” e aumentaram a formação.
Neste contexto das desigualdades, apontou também que para quem tem uma educação até ao 9.º ano “houve uma diminuição muito grande do emprego” mas um “enorme aumento dos indivíduos com ensino superior” e “a desigualdade também emerge na distribuição de rendimento”.
“Pessoas com maior rendimento aumentaram muito e temos conjunto de indivíduos que não eram pobres mas caíram na distribuição. Às vezes pensamos que foram os pobres os mais prejudicados mas surgiram novos pobres, muitas vezes em situação ainda mais difícil do que os pobres que já existiam”, acrescentou o economista.
Nuno Alves sublinhou que a participação no mercado de trabalho “é um caminho para sair da pobreza mas não é condição suficiente” e revelou preocupação com a “inflação, que está a aumentar, acima de 4% em fevereiro”.
“O problema é que vai aumentar mais, mas num conjunto de itens que tem um peso no consumo dos de menor rendimento maior – bens alimentares e dos bens energéticos”, explicou o membro da direção da Cáritas Portuguesa.
CB/OC
Na sessão de apresentação do mais recente relatório ‘Cáritas CARES’ diversas Cáritas Diocesanas – Leiria-Fátima, Santarém e Lisboa – partilharam o trabalho que desenvolvem em diversos setores e apresentaram testemunhos da sua intervenção junto das pessoas que procuram o seu apoio. Margarida Quelhas, do grupo de coordenação da Cáritas Interparoquial da Unidade Pastoral Nova Oeiras e São Julião da Barra, explicou que a Cáritas surgiu “recentemente” nesta unidade pastoral mas as paróquias “já tinham uma série de serviços caritativos”. Aos jornalistas, adiantou que têm centros sociais paroquiais, apoios às famílias, lojas sociais como uma como mercearia, apoiam os ministros extraordinários da comunhão e os visitadores, e na pandemia surgiu o serviço ‘bons vizinhos’ que apoia as pessoas que “não podiam sair de casa, e que já podem mas têm dificuldade”, e têm um “banco de voluntários que faz comprar para essas pessoas”. Sobre a ‘Semana Nacional Cáritas’, Margarida Quelhas explica que deu a “oportunidade” ao grupo de coordenação da Cáritas Interparoquial da Unidade Pastoral Nova Oeiras e São Julião da Barra de “tentar divulgar às pessoas que frequentam as paróquias”, o que é a Cáritas Paroquial, “porque é que surgiu” e o que é que estão a fazer “mas também à comunidade no geral. “Organizamos durante a semana a divulgação dos serviços disponíveis, para quem precisa, como para angariar voluntários”, referiu, acrescentando que também estão a dinamizar o peditório com voluntários destas duas paróquias do Patriarcado de Lisboa. |