Esperança para a educação

Joaquim Azevedo, presidente do Centro Regional do Porto da UCP

As prioridades para a Educação Escolar, no quadro da tomada de posse de um novo Governo (junho de 2011), tal é o mandato que preside a este texto, a pedido da Agência Ecclesia.

Acabo de escrever um livro sobre “Liberdade e política pública de educação” (Ed Fundação Manuel Leão), onde descrevo a situação atual da educação escolar em Portugal e onde enquadro e alinho um conjunto de ações comuns e de medidas de política pública que poderiam e deveriam ser tomadas. Vou, por isso, sintetizar essa reflexão, remetendo o seu esclarecimento e aprofundamento para este livro.

1.Vivemos um situação de bloqueio, que a atual crise só vem agravar. Estamos bloqueados: porque entendemos que a educação é uma questão técnica, que se resolve com bons gabinetes e com base na iluminação que invade a 5 de Outubro, em cada mudança do governo; porque não apoiamos devidamente as famílias na sua insubstituível missão de educar os filhos; porque não focamos a nossa ação no ensino e nas aprendizagens, procurando lidar com as diferenças e promovendo percursos educativos de qualidade por parte de todos os alunos; porque os professores são permanentemente desfocados do seu trabalho essencial, ensinar; porque a administração educacional labora sob o signo da desconfiança, desfazendo o que com liberdade e autonomia se vai construindo; porque existe um sistema de irresponsabilidade incutido pela ação omnipresente, omnisciente e uniformizante de um Estado muito pouco inteligente; porque o conjunto dos atores sociais na sociedade portuguesa ainda é pouco chamado a comprometer-se com a melhoria da educação escolar; porque a demagogia e o cinismo fazem mais caminho do que o trabalho árduo de melhoria da situação da educação.

2.Pugno pela construção de um referencial em que se possa enquadrar uma nova política pública de educação. Sumariando: (i) uma visão antimonopolista e policêntrica da política pública de educação escolar; (ii) uma conceção do bem público educacional como uma construção social e política realizada no espaço público, com a participação de toda a sociedade e onde se caminha sempre para a realização de compromissos concretos e comuns para a melhoria da educação escolar em Portugal e em cada localidade; (iii) nestes compromissos concretos participam o Estado e toda a sociedade, cada escola e os seus atores, em ordem a gerar mais valor público educacional, muito mais do que as ditas reformas educativas, que geralmente destroem o valor entretanto criado; (iv) é urgente focar a educação em melhor ensino e em melhores aprendizagens por parte de cada criança, jovem ou adulto, o resto pouco interessa; (v) a liberdade e autonomia devem ser acarinhadas em cada momento e a autonomia de cada escola e de todas as escolas deve ser contratualizada com o Estado; (vi) os alicerces ainda não mudaram de sítio e a educação da infância, com destaque para a pré-escolar e para o primeiro ciclo, tem de ser prioritária.

3. Neste quadro, é possível perceber e conceber o desenvolvimento que proponho para uma nova política pública de educação escolar. Reconheço o novo quadro de escassez de recursos. Dispomos de menos meios para melhorar o ensino e as aprendizagens. Focar os recursos no essencial passa a ser uma prioridade irrenunciável. Como principais medidas: (i) aplicar o conceito defendido de “serviço público de educação” que serve a democracia e a liberdade, que compreende, aproveita e integra na rede escolar todas as inciacitivas que contribuem para melhor ensino e melhores aprendizagens, tenham elas o estatuto jurídico que tiverem; (ii) aplicar um novo estatuto de ampla e verdadeira autonomia escolar, em que cada agrupamento ou escola contratualiza com o ME, no prazo máximo de três anos, aquilo que vai fazer para atingir as suas novas metas de melhoria nas aprendizagens; (iii) ter como principal e decisiva prioridade a elaboração e execução em cada agrupamento ou escola de um Plano de Melhoria Gradual da Educação, de onde constem os compromissos sociais e escolares concretos, a rever de ano a ano, em dinâmicas reforçadas de autoavaliação, planos estes que serão a base de sustentação do contrato com o Estado; (iv) criar um novo, eficaz e independente meio de avaliação externa das escolas, apto igualmente a desencadear dispositivos de apoio às escolas com pior desempenho; (v) rever profundamente a estrutura central e regional do ME, criando apenas quatro novos e ágeis serviços centrais e uma agência para a avaliação; (vi) colocar no centro do sistema os professores e a melhoria do seu desempenho profissional, em contextos escolares cada vez mais responsabilizantes e com Planos de Melhoria, inscritos em compromissos localmente construídos e muito concretos; (vii) subordinar todas estas ações a um único foco e fito, melhorar as aprendizagens dos alunos.

A obsessão avaliativa só serve a tecnologia social e política que a sustenta (muito populista, aliás), não vai servir para nada em termos de melhoria do desempenho dos professores, dos alunos e das escolas. Será uma obsessão que passará como todas as outras paixões que já por cá passaram.

Os nós que existem, e são muitos, temos de ser nós a desatá-los. Ninguém o fará por nós. Com Confiança, com Cooperação, com Compromissos e, no fim, com melhor ensino e melhores aprendizagens. Com trabalho, muito trabalho, árduo e persistente trabalho, o que só faz quem está convencido de que isso vale a pena e que só há mesmo esse caminho a trilhar. Muita coragem e muita esperança!

Joaquim Azevedo, professor catedrático da Universidade Católica Portuguesa

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