Grupo quis responder ao sofrimento provocado pela guerra na Ucrânia
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Nada foi planeado, a surpresa comandou o gesto humanitário…
Quando surgiu a guerra na Ucrânia, com a invasão da Rússia ao país vizinho, o jovem padre da Ericeira – Carvoeira (Patriarcado de Lisboa) sentiu-se interpelado, tal como a comunidade, a caminharem através da oração e do jejum.
Na Quarta-feira de Cinzas (2 de março), o Papa Francisco convidou o mundo inteiro a fazer jejum e a rezar pela paz. Um clique… A comunidade convidou os ucranianos da região a estarem presentes na noite orante porque no Leste europeu o belicismo era bem visível e estava a destruir o pilar da paz.
“Fomos tocados pela aflição, desespero e angústia daquele povo”, disse à Agência ECCLESIA o padre Tiago Fonseca. As imagens que os meios de comunicação social divulgavam e a noite de oração daquele dia que deu início à Quaresma de 2022 foram os alicerces para a missão humanitária que realizaram neste mês de março.
Um amigo ligou ao padre de 36 anos, a pedir oração, porque iria partir para uma missão. A Roménia e a Polónia era o destino com o intuito de trazer refugiados ucranianos para o nosso país. O gesto do amigo Miguel Serra voltou a interpelar o padre Tiago Fonseca.
A circulação das notícias sobre a ajuda ao povo ucraniano era cada vez maior.
“Percebi a preocupação dos ucranianos a residir em Portugal porque tinham lá muitos familiares e amigos”, sublinhou o sacerdote do Patriarcado de Lisboa.
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No dia 4 de março, após a celebração na Carvoeira, o padre Tiago Fonseca aborda uma paroquiana natural da Ucrânia e pergunta-lhe o que a comunidade pode fazer por aquele povo. “Senhor padre, tenho os meus sogros aflitos e não sei como os trazer para Portugal”, respondeu a Lena, imigrante ucraniana. A resposta do sacerdote foi taxativa: “Nós vamos ajudar-te”.
Os sinais aparecem sem esperarmos… A Lena colocou nas redes sociais da comunidade ucraniana o número de telemóvel do padre que queria ajudar e estava disponível para ir buscar pessoas à Ucrânia. “Isto foi para lá daquilo que tinha pensado”, confessou o pároco da Ericeira – Carvoeira.
De um momento para outro começam “a chover chamadas” no telemóvel do padre Tiago Fonseca. Ucranianos a pedir ajuda… Foram três dias a receber chamadas “constantemente”. Na noite de domingo (06 de março), o padre Tiago desabafou com amigos e voluntários que “era fundamental fazer algo por aquele povo”. As imensas chamadas telefónicas eram um sinal…
O apelo surtiu efeito e foi organizada uma equipa de cinco elementos. Como algumas chamadas não tinham sido atendidas, quatro elementos “agarraram-se” ao telefone e procuraram saber as preocupações de quem estava do outro lado da linha. Com os dados recolhidos… Depois de quatro horas de chamadas, olharam uns para os outros e disseram “esta parte da missão está concluída”, confidenciou o sacerdote.
As necessidades estavam identificadas. Estava na hora de ir descansar porque “dormir é sempre um bom conselho”, acrescentou.
No dia seguinte, num momento de oração com padres amigos, o sacerdote pediu a Deus um sinal. “Meu Deus se queres que vá à Polónia, e sabes que quero, faz com que o padre que está a fazer a meditação fale da Polónia”, referiu. O sacerdote não falou do país desejado, mas fez referência, “por três vezes”, ao Papa João Paulo II, natural daquele país. “Foi o sinal para partir até à Polónia”, acentuou.
“Não há coincidências, mas muitos toques de Deus”![]() ![]() ![]() ![]() ![]() ![]() Ao longo do caminho e do sonho que se vai tornar realidade, o padre Tiago Fonseca contatou a edilidade de Mafra. Numa conversa com a vice-presidente da Câmara daquela localidade, o sacerdote deu conta dos contatos feitos e das “necessidades de ajuda de alguns paroquianos”. Partir com uma carrinha de nove lugares em direção à Polónia era a ideia inicial. Uma luz traz sempre outras luzes… A autarca Aldevina Rodrigues mostrou-se disponível e talvez “conseguisse arranjar um autocarro da parte da câmara” para os acompanhar naquela missão. No diálogo entre o sacerdote e a vice-presidente da Câmara Municipal de Mafra falou-se também de uma missão humanitária da Liga dos Bombeiros Portugueses, que iria partir daquela terra da zona Oeste do Patriarcado de Lisboa, e que talvez a paróquia pudesse ir integrada naquele grupo. Mobilizar contatos é uma tarefa essencial para o sucesso de uma missão. “Já tinha muitos paroquianos entusiasmados” para a realização da iniciativa. Os amigos são para as ocasiões e o padre Tiago Fonseca ligou a um deles, do tempo do seminário, “e com quem não falava há muitos anos”. O velho amigo Arlindo, motorista de profissão, falou com o patrão. Os contatos continuaram com as entidades… A missão humanitária estava a ser preparada com minúcia. Os transportes iriam levar mantimentos, bens de saúde e ambulâncias. Uma parceria entre os bombeiros, câmara municipal e paróquias. “Tivemos a perceção que valeria a pena trabalhar juntos”, disse o sacerdote. E acrescenta: “Não há coincidências, mas muitos toques de Deus”. Só faria sentido levar um autocarro até à Polónia “para trazer refugiados” porque já eram conhecidos casos de “boa vontade”, mas os autocarros vieram vazios devido “à falta de coordenação no terreno”, afirmou. Uma das estratégias era levar carrinhas de nove lugares, a acompanhar o autocarro, para recolher os refugiados na Polónia. Uma empresa cedeu “duas carrinhas gratuitamente” e como a irmã do padre Tiago Fonseca mostrou disponibilidade para fazer a missão “conseguiu outra carrinha de nove lugares”. O projeto estava a ganhar solidez… Quem iria na missão humanitária para trazer os refugiados? “Tínhamos a noção que era fundamental a presença de senhoras na carrinha porque iríamos transportar, sobretudo, mulheres e crianças”, acentuou o sacerdote. A confiança é essencial… E as notícias veiculadas sobre “o tráfico humano e raptos” eram conhecidas. O projeto de voluntariado das Paróquias da Ericeira e da Carvoeira, «O Farol», que assenta nos princípios e valores da Igreja, mostrou-se “muito entusiasmado” na missão, mas “nem todos os voluntários podiam ir”. Depois de muitos diálogos e “com a providência divina” a equipa foi-se compondo com algumas surpresas. Assim se formou um grupo de 12 voluntários, “quatro em cada carrinha”, que foram em missão até à Polónia.
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Superar as dificuldades… E agora?O trabalho de equipa é fulcral e um grupo de voluntários polacos associaram-se aos portugueses na escola primária São João Paulo II, na periferia de Cracóvia (Polónia). Naquelas paragens, onde a guerra estava a dois passos, o grupo viu “várias situações de superação de dificuldades”. Quando o som das armas se aproxima, as pessoas “colocam-se ao caminho com o pouco que tinham na mão”. Apesar da dor, o padre Tiago Fonseca via as “crianças a brincar” o que tornava o ambiente menos pesado. Desarmes que encheram os voluntários cheios de esperança… Inicialmente, o grupo pensava trazer para Portugal cerca de quatro dezenas de refugiados, mas “a providência divina ajudou” e os voluntários trouxeram “101 refugiados”. Quando chegaram a Portugal, várias entidades disponibilizaram-se a transportar os refugiados aos locais de destino, do algarve ao norte do país. A “angústia da incerteza” está nestes refugiados. No futuro pensam “voltar ao seu país de origem”, mas agora “as instituições e empresas” vão ter um papel “muito importante”. “A nossa missão foi uma resposta de Deus à oração de tantos”, conclui o padre Tiago Fonseca. |
LFS