Especial: Maior presença de mulheres em cargo de responsabilidade ajuda a entender «beleza do feminino na Igreja» – Alice Cardoso (c/vídeo)

Da única chanceler nas dioceses portuguesas a diretoras de Secretariados Nacionais, ligados à Conferência Episcopal, cargos de responsabilidade são cada vez menos um exclusivo de homens

Lisboa, 08 mar 2025 (Ecclesia) – Alice Cardoso, assessora na Comissão dos Episcopados Católicos da União Europeia (COMECE), disse à Agência ECCLESIA que a maior presença de mulheres em cargos de responsabilidade destaca a “beleza do feminino na Igreja”.

A jovem escuteira integra a ‘COMECE Youth Net’, rede que está atenta ao que pensam as novas gerações de católicos em vários países da Europa e faz chegar aos bispos este sentir e modos de ver.

“O objetivo é que a perspetiva católica jovem possa também ajudar na elaboração da legislação da União Europeia”, refere Alice Cardoso.

A auscultação resulta de inquéritos aos jovens da Europa que depois geram sínteses que são entregues aos bispos representantes dos episcopados europeus, que assim fundamentam os seus pareceres no diálogo com as instâncias comunitárias.

Alice Cardoso é favorável a uma certa “paridade” entre homens e mulheres porque, pela sua experiência, reconhece que “ambos trazem ao debate coisas muito diferentes e enriquecedoras”.

A entrevistada lembra o trabalho recente em torno dos desafios da imigração e “a sensibilidade perante a maternidade”, que é essencial para perceber que a mulher “não é apenas uma força de trabalho”.

Maria da Graça é a primeira e, até ao momento, única mulher chanceler de uma diocese em Portugal.

Formada em teologia e em direito canónico pela Universidade Católica Portuguesa, foi nomeada por D. José Ornelas, então bispo de Setúbal, para um serviço que é exercido dentro da Cúria Diocesana e dos seus serviços administrativos, zelando para que todos os atos emitidos tenham efeitos jurídicos a nível civil e a nível canónico.

Quanto ao facto de, como mulher, desempenhar esta função num universo ainda muito masculino, Maria da Graça reconhece que tem sido “um caminho acompanhado” e fala do “apoio” que sente por parte dos sacerdotes, vigários-gerais e bispos.

“Não é um caminho solitário, é uma equipa e todos nos apoiamos”, refere a chanceler da Diocese de Setúbal que não olha a sua missão como um lugar conquistado, mas como “resposta a um chamamento”.

“A mulher na Igreja não é uma relação de poder, mas de serviço e missão”, considera Maria da Graça que assume o papel de uma “facilitadora” e quer uma Igreja “com a participação de todos”.

Na Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) existem vários serviços relacionados com as comissões episcopais dirigidos por mulheres, como o Secretariado Nacional da Pastoral da Mobilidade Humana, liderado por Eugénia Quaresma.

A também diretora da Obra Católica Portuguesa de Migrações (OCPM) coordena o trabalho da Igreja neste setor e junto da comunidade cigana, a pastoral do mar e também o acompanhamento das comunidades portuguesas dispersas pelo mundo.

Eugénia Quaresma sublinha a “mobilidade” que experimenta diariamente ao deslocar-se da Amora, na margem sul, para a sede da CEP em Lisboa, referindo que essa é uma ocasião para perceber os “problemas reais das pessoas, muitas delas migrantes”.

A responsável não esquece a ponte que atravessa e que lhe lembra uma urgência bem atual.

“Esta ponte é simbólica e é real, hoje, é-nos pedido que sejamos comunidades cristãs construtoras de pontes” destaca a diretora da OCPM, confiante de que “o lado feminino” pode contribuir para isso.

Um andar abaixo, na sede da CEP, está o gabinete do Secretariado Nacional dos Bens Culturais da Igreja (SNBCI), dirigido por Maria de Fátima Eusébio, da Diocese de Viseu.

Doutorada em História da Arte em Portugal, pela Faculdade de Letras da Universidade do Porto, Fátima Eusébio já coordenava o Departamento dos Bens Culturais em Viseu quando, em 2023, foi desafiada a assumir funções de âmbito nacional.

A responsável entende que o convite foi “um reconhecimento pelo trabalho anterior” e dá conta que há 18 anos quando assumiu esta missão em Viseu deparou com algumas “resistência internas” na diocese.

“Por ser mulher, mas também por se considerar que o património não justificava alguém em permanência”, recorda Fátima Eusébio, que assume a “resiliência” como uma capacidade das mulheres.

A diretora do SNBCI declara-se contra as “quotas” de mulheres em determinados cargos, por discordar da promoção da mulher por “via administrativa”.

A maior presença, indica, tem de corresponder à “competência e à capacidade de desempenhar um trabalho válido”.

Na CEP, o Secretariado Nacional das Comunicações Sociais também é dirigido por uma mulher, Isabel Figueiredo, e a Fundação Fé e Cooperação tem Patrícia Fonseca como responsável.

As entrevistas por ocasião do Dia Internacional da Mulher (8 de março) estão em destaque no Programa ‘70X7’, que vai ser emitido este domingo na RTP2, pelas 18h30.

HM/OC

O documento final do Sínodo sobre a Sinodalidade na Igreja, publicado em outubro de 2024, afirma que “as mulheres continuam a encontrar obstáculos para obter um reconhecimento mais pleno dos seus carismas, da sua vocação e do seu lugar nos vários sectores da vida da Igreja, em detrimento do serviço à missão comum”.

Apesar dessa situação, há cada vez mais mulheres a desempenhar cargos de responsabilidade, inclusive na Cúria Romana, por decisão do Papa Francisco.

Desde 1 de março, a irmã Raffaella Petrini é a primeira mulher a exercer o cargo de presidente da Comissão Pontifícia para o Estado da Cidade do Vaticano e do Governatorato do Estado.

No início deste ano, a missionária da Consolata, Simona Brambilla foi nomeada prefeita do Dicastério para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica, numa decisão inédita do Papa.

Em Roma, num encontro com os jornalistas portugueses a propósito do Jubileu dos Comunicadores Católicos, a irmã Simona destacou a importância da “reciprocidade na Igreja entre uma dimensão feminina e masculina”, sublinhando que não tem a ver apenas “com homens e mulheres”, mas com o “feminino e o masculino” que todos têm.

A religiosa sugere que esta sensibilidade, expressa “na forma de pensar, de falar, de perceber e interpretar a realidade” e traduzida nas dimensões “prática, afetiva, espiritual, deve ser uma condição para favorecer a paz no mundo”.

O pontificado de Francisco, tem reforçado a percentagem de mulheres em cargos no Vaticano.

A tendência foi aprofundada com a Constituição Apostólica ‘Praedicate Evangelium’ de 2022, sobre a reforma da Cúria Romana, na qual o Papa tornou possível que leigos e mulheres possam chefiar um Dicastério e tornar-se prefeitos, posição tradicionalmente reservada a cardeais e arcebispos.

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