Especial: «As religiosas são como as borboletas»

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Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena acompanham doentes e profissionais do Hospital de Sant’Ana

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Um hospital virado ao mar. Corredores largos e coloridos. “Varandas” com cheiro a maresia e uma comunidade de Irmãs Dominicanas que ali vive. Conhecemos a vivência da Irmã Celina Laranjeiro, que desde 1973, cuida de quem por ali passa. Sente-se como as borboletas, passou por metamorfoses.

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Na escadaria do edifício principal a consagrada dominicana esperava a ECCLESIA, com o seu hábito branco e preto, olhar atento e sorriso aberto. Depois das boas-vindas ao Hospital, como de sua casa se tratasse, apressou-se a abrir a porta da primeira paragem, a Capela.

“É uma joia, muito bem pensada, já viu?”, questiona a Irmã Celina, orgulhosa do templo “neobizantino e neogótico”, berço do Hospital, onde foi lançada a primeira pedra da construção do edifício.

Virado ao mar, na Parede, concelho de Cascais, fica situado o Hospital de Sant’Ana, conhecido antigamente como Sanatório pelo tratamento da tuberculose óssea, doença alastrada na época da sua fundação, em 1904. Por vontade e exigência da fundadora o projeto tem a presença religiosa feminina, “para cuidar da alma e do corpo, uma vez que as Irmãs eram as melhores enfermeiras”, como se pode ler no site do Hospital.

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Assim, no ano de 1910 chegaram ao Hospital as Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena e onde permanecem até hoje. Atualmente são seis irmãs, “todas com mais de 70 anos”, graceja rapidamente a irmã Celina.

Enfermeira de formação e por vocação a irmã Celina Laranjeiro chegou a ser a enfermeira chefe dos serviços e hoje apelida a sua vida de “muito boa e feliz”.

Em 2010 “deixou o ativo”, como diz, e “o dia a dia é muito simples, fruto da evolução da idade”, refere.

“Vou todos os dias de manhã às enfermarias, visito os doentes e o pessoal, eles que são parte muito importante desta casa, e interesso-me por tudo o que se passa neste hospital”, explica.

Considera o ambiente hospitalar como “descontraído, à parte das dores que os doentes sentem”, e está sempre pronta para uma boa conversa, com doentes, familiares ou visitantes.

“É agradável ver como evoluem no dia a dia, no internamento; às vezes a situação de doença proporciona uma ocasião especial para refletirem, darem mais valor à vida e à saúde e isso podemos conversar com eles”, refere.

Atualmente o Hospital de Sant’Ana faz parte da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e do conselho de administração faz parte a Irmã Celina. Nos dias que a ECCLESIA visitou o Hospital o ambiente era confuso pois tinha sido inaugurado o novo edifício dois dias antes.

“O pessoal estava todo muito cansado, stressado, e a nossa função é acalmar e dar uma palavra de alento”, diz a Irmã Celina.

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Um espaço privilegiado

Há 107 anos que aqueles corredores, pautados por azulejos Arte Nova, estão habituados a ser percorridos por Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena.

Como resume a religiosa “já fazemos parte da casa” e quando chegam novos funcionários não há espaço para a surpresa.

“Os mais novos logo se habituam, quando veem freiras no corredor, que não é nada do outro mundo, e até se riem dizendo que somos as donas da casa”, partilha a religiosa ao microfone da Ecclesia.

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Donas da casa as religiosas não são, mas a sua presença é natural e comum, pois a fundadora, D. Claudina Chamiço, queria que as religiosas “tomassem conta da casa e ensinassem a doutrina (como se dizia), a ler, escrever e contar, uma vez que os ‘filhos do povo’ não tinham direito à escola”.

A conversa decorreu depois numa sala que faz parte de um conjunto de três salas, o designado jardim de Inverno, com painéis de azulejos com pintura de Arte Nova, do princípio do século.

De pé, junto aos azulejos, a irmã Celina Laranjeiro foi apontando os azulejos e explica que as pinturas são de “plantas medicinais, na sua maioria, que aproveitávamos para ensinar as crianças.”

“Este espaço era usado pelas crianças que, internadas muito tempo, aqui recebiam as visitas, tinham os recreios e faziam os teatros”, recorda com os olhos humedecidos.

Este Hospital de Sant’Ana é para a religiosa um espaço privilegiado, “os doentes têm mar de um lado e pinhal do outro, cá dentro o Jardim de Inverno; a estrutura do Hospital foi pensada para que, as galerias das enfermarias abram para um pequeno solário onde se pode trazer as camas para apanhar sol no tempo de verão.”

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O novo edifício do Hospital tem as duas alas denominadas de São Domingos e Santa Catarina, respetivamente, tomando-os como padroeiros por privilégio dado à Irmã Celina, em reunião de administração, aquando da escolha dos nomes.

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Antes de ser enfermeira a Irmã Celina foi missionária em Angola, professora da Escola Primária e de Educação Moral e Religiosa Católica mas a formação foi uma área de grande dedicação.

A religiosa conta que deu formação dos profissionais, formação permanente a todos os profissionais, administrativos e técnicos do Hospital e a sua vida foi-se enriquecendo com a formação, partilhas e conversas que ali se proporcionavam.

A vida exigiu-lhe que estudasse, na enfermagem e na formação espiritual, prestou outros serviços, como na secretaria geral da congregação, na casa de Fátima e no Colégio do Ramalhão.

As mãos que outrora administravam medicação e acarinhavam a face dos doentes, hoje percorrem as contas do rosário negro, presas no hábito dominicano, enquanto decorre a conversa.

“Como religiosas passamos por muitas metamorfoses, como as borboletas, e eu fiz muitas coisas nesta vida que tenho e sinto como rica, alegre e feliz”, refere.

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Meia dúzia de Dominicanas

Seguimos pelo elevador que, só com a ajuda da chave, nos leva ao piso do edifício onde reside a comunidade de religiosas. O corredor vai ter a um varandim que dá para a Igreja. No coro alto, duas religiosas fazem as suas orações, uma sentada e outra de joelhos. Junto ao altar uma religiosa trata dos arranjos de flores. A irmã Celina apresenta-as, religiosas na casa dos 80 anos, mas, apesar das rugas demarcadas, os sorrisos e olhares mostram-se singelos.

Na sala da Comunidade espera-nos a Irmã Trindade, apresenta-se de avental. Outra vida de entrega aos outros e que ali vive há muitos anos também. Dona de um sorriso que gera boa disposição, explica-nos na sua candura dos 88 anos, que teve duas irmãs que ali foram doentes naquele Hospital e de quem tratou, depois tornaram-se religiosas também.

Bem-dispostas as duas religiosas explicam o significado de algumas das peças da sala: um Menino Jesus trazido de outra comunidade, o poster da fundadora e outra fotografia onde apontam as Religiosas que por ali passaram dizendo os nomes que a memória não esquece.

“Éramos uma família”, resume a Irmã Trindade.

A sala do refeitório estava já preparada para o almoço e o quadro do corredor anunciava a visita da ECCLESIA, depois do amanhecer com a oração de laudes.

As orações, que se dissolvem entre visitas a enfermarias e conversas com doentes, têm o ponto alto na Eucaristia de todos os dias, onde as religiosas cantam e tocam, animando esses momentos.

“A irmã que toca o órgão, Irmã Imaculada, tem 88 anos, já está um pouco esquecida… Estamos a ficar velhotas e precisamos de vocações, acreditamos que vão chegar mais religiosas à congregação para que esta missão não termine; os doentes precisam de nós”, conclui a irmã Celina Laranjeiro.

Uma comunidade de Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena que, no Hospital de Sant’Ana, imprime a marca de fé pelos corredores e enfermarias, quando a condição de doença deixa a descoberto a fragilidade da vida.

SN/OC

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O Hospital de Sant’Ana, do arquiteto Rosendo Carvalheira, foi um edifício considerado pioneiro e exemplar ao nível nacional e internacional para a época. Atualmente são feitas visitas guiadas, por marcação, bem como outros eventos culturais, que mantém viva a ligação do Hospital com a comunidade mais próxima.

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Agência ECCLESIA

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