Escolher o futuro

Confrontado com um conjunto de situações que em nada dignificam a Igreja Católica e aqueles que a têm de servir, na linha da frente, a opção de Bento XVI foi escolher o futuro

Para quem esperava uma espécie de “manual contra os abusos sexuais”, a carta com que Bento XVI aborda a questão da pedofilia entre o clero da Irlanda pode parecer surpreendente. Não é propriamente um conjunto rígido de instruções e procedimentos, mas uma reflexão mais ampla, marcada pela exigência de mudança e a certeza de que é possível acreditar, ter esperança, mesmo depois de uma crise tão grave.

Agiram muito mal os que trataram destes abusos como um “assunto de família”, no pior sentido, escondendo, relativizando, colocando acima dos valores da verdade e da humanidade para com as vítimas questões como a imagem da Igreja ou dos seus ministros.

O choque provocado pela revelação de tais abusos ultrapassa, em muito, o âmbito da Igreja. Como reconhece o próprio Papa, o caminho para recuperar a confiança na Igreja e curar as feridas provocadas a tantas pessoas é longo e doloroso. Mas é possível. A Igreja é mais, muito mais do que padres pedófilos – que aliás, não têm nela lugar.

Confrontado com um conjunto de situações que em nada dignificam a Igreja Católica e aqueles que a têm de servir, na linha da frente, a opção de Bento XVI foi escolher o futuro.

Explico: slogans como “tolerância zero” ou “nunca mais” dizem pouco se não forem acompanhados de uma acção concreta, que procure não só resolver o que de mal se fez no passado – atendendo em primeiro lugar às vítimas, logicamente -, mas também mudar comportamentos, pessoais e institucionais.

A dor provocada deve servir, neste momento, para potenciar uma revolução de largo alcance, que não se limite à visão “sexualista” dos acontecimentos. Em pleno Ano Sacerdotal, uma provação desta dimensão tem de ajudar a perceber que padres é que a Igreja quer para o século XXI. Outro ponto essencial é cultivar uma cultura de transparência, de verdade, em todas as dimensões eclesiais. Assumir o que está errado para que possa ser rapidamente reparado e haja espaço – aos olhos de todos – para observar também o que de bom e importante é realizado por toda a Igreja. Com coragem e determinação.

Octávio Carmo

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Agência ECCLESIA

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