Emprego: Apelo do primeiro-ministro à emigração é estratégia de quem «desistiu», considera Comissão Justiça e Paz

«Doutrina Social da Igreja vai contra o sistema económico» mas a sua execução é possível, diz Alfredo Bruto da Costa

Lisboa, 20 dez 2011 (Ecclesia) – O presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz (CNPJ) considera que o convite à emigração feito pelo primeiro-ministro aos professores desempregados é “uma estratégia de quem desistiu e declara a sua derrota”.

“O problema do emprego é um dos objetivos principais de qualquer economia e é anterior à busca do lucro”, declarou Alfredo Bruto da Costa em entrevista à Agência ECCLESIA, acrescentando que esse “apelo é uma claudicação muito precoce e um mau sinal enquanto atitude de um governante perante os problemas do país”.

O responsável pela CNPJ, reconduzido no cargo pela Conferência Episcopal Portuguesa, criticou a repartição nacional da riqueza, à luz da mensagem de Bento XVI para o Dia Mundial da Paz de 2012, que se assinala a 1 de janeiro.

“A distribuição dos rendimentos é uma preocupação que tem de ser tida em conta porque a paz depende dela”, frisou o responsável, salientando que “a justiça social não está a ser cumprida” porque nem todas as fontes e escalões de receita são igualmente taxados.

Convidado a comparar as medidas de austeridade com a mensagem para o Dia Mundial da Paz, onde o Papa refere que “não se pode sacrificar a pessoa para alcançar um bem particular, seja ele económico ou social”, Bruto da Costa sustentou que “esse é um problema chave no modo de entender o que se passa em Portugal”.

“Todos nós devemos respeitar a dignidade da pessoa humana, e até há políticos que, a esse respeito, têm usado a palavra ‘incontornável’, isto é, que não pode ser sacrificada de modo nenhum. Mas na prática a questão é saber que tipo de medidas, cujos objetivos são económicos ou financeiros, atinge ou não o respeito pela pessoa”, assinalou.

O especialista em questões de pobreza referiu que o Estado, mesmo que queira, pouco pode fazer para adequar as suas políticas à Doutrina Social da Igreja enquanto o lucro for o objetivo principal dos mercados: “O problema não é só deste Governo mas radica no tipo de economia das últimas décadas”.

“O Executivo agravou a questão porque se sentiu obrigado a tomar medidas gravosas devido aos objetivos do défice e da dívida. Mas o que está em causa é algo de estrutural”, salientou.

A “Doutrina Social da Igreja vai contra o sistema económico” mas a sua execução é possível: “O mais recente documento do Vaticano sobre a economia mundial mostra-o com muita clareza: não só aponta objetivos como diz que têm de ser atingidos de forma gradual e sensata, apontando alguns passos nesse sentido”.

“Temos de ter muito claro o que é uma economia ao serviço das pessoas e, a partir daí, cumprir uma estratégia compatível com uma estabilidade que as sociedades precisam, mesmo quando atravessam transformações profundas”, explicou o responsável, referindo-se à nota do Conselho Pontifício Justiça e Paz publicada em outubro.

Bruto da Costa recordou que o presidente daquele departamento da Santa Sé, o cardeal ganês Peter Turkson, “disse que era natural a existência de algumas coincidências” entre o documento e os objetivos dos manifestantes que se instalaram no centro financeiro de Nova Iorque, no movimento ‘Ocupem Wall Street’.

“Chegamos a um ponto em que, a brincar, até se diz que qualquer dia o Papa é bem capaz de ir manifestar-se à Wall Street”, concluiu.

RJM

Partilhar:
plugins premium WordPress
Scroll to Top