Em cada novo começo, uma nova esperança

Bruno Alexandre, Diocese do Algarve

Há cerca de um mês que demos início a mais um ano letivo, depois de quatro anos verdadeiramente atípicos: aos três anos letivos afetados pela pandemia, sucedeu um ano em que os professores, unidos como não se via há muito tempo, lutaram pelos seus justos direitos.

Um novo ano é sempre sinal de um novo começo. E os novos começos podem ser, no mínimo, desafiantes.

Num ano em que foi prometido o fim da precariedade para os professores (pelo menos, uma larga maioria onde não pude estar incluído), assistimos ao fenómeno de antigos professores precários que, tendo estado a contrato tantas vezes perto de casa, foram parar a oitenta (e mais) quilómetros das suas residências. Num ano em que foi prometida estabilidade, voltámos a ter escolas que, à véspera de iniciar o ano, ainda não tinham metade do seu corpo docente colocado. E quantos de vós, caros leitores, ainda estão ansiosos porque, aos vossos educandos falta um qualquer professor? Ou mais? Talvez, até, de EMRC? Ou pelo rácio de assistentes operacionais, esticado até ao limite, ao ponto de, quando faltarem dois ou três funcionários por motivos de saúde, se terem de suspender aulas num qualquer ponto do País?

Uma República que deixa aqueles que ensinam os seus filhos viverem numa carrinha e alimentarem-se e fazerem a sua higiene na escola, pode ser um lugar de esperança? Podemos falar de esperança mesmo quando as rendas para um quarto para um docente colocado a 200, 300 quilómetros de casa, levam cerca de metade do seu vencimento? Ou quando até se fazem leilões à melhor oferta por um lugar num sofá-cama?

Podemos, por vezes, cair na tentação de baixar os braços. Olhar para a “fartura do Egito”, do que deixámos para trás, dos escolhos que temos diante de nós. Mas, como cristãos, sabemos que existe algo mais.

Este ano, quis Deus que viesse para um novo Agrupamento, como contratado. Pela décima-quinta vez consecutiva. E a viagem, invariavelmente feita de comboio (que chega quando chega e parte antes de partir), tem sido uma soberana oportunidade para rezar, refletir e meditar. E, graças a isso, veio-me à mente e ao coração um hino da hora de Vésperas do tempo da Quaresma, que tantos de nós conhecemos:

Crescem nas asperezas do caminho
Pequenas flores brancas de esperança;
Não podem os espinhos afogá-las,
Pois foi o amor quem as chamou à vida.

Nós, professores de EMRC, sentimos na nossa pele a verdade do Evangelho: que “Um é o que semeia, e outro o que ceifa” (cf. Jo 4, 37). Deixamos transcorrer a nossa vida, tantos anos, tantos rostos, tantas histórias, para que outros possam colher os frutos que semeámos; frutos esses que também iremos colher em outros campos. Levamos, como “peregrinos da esperança”, um lume no peito, lume que não se apaga, para caminharmos, em conjunto, olhos nos olhos e coração a coração, como presença ínfima de um Amor para além de qualquer medida e que jamais passará. Sofremos; temos reuniões infinitas; saímos muitas vezes de casa antes que o sol se levante e voltamos, outras tantas, quando o sol já se pôs. Arrisco-me a dizer, inclusive, que o carinho que recebemos de tantos colegas, funcionários, alunos e encarregados de educação é diametralmente oposto ao carinho que “os poderes que são” têm por nós. Mas, naquele rosto jovem que volta a sorrir, naquele colega que volta a ganhar ânimo, naqueles braços doridos e cansados da funcionária que descansam enquanto carregamos um balde cheio de água, naquele pai ou mãe que volta a acreditar que o filho tem um futuro sorridente pela frente, apenas e só porque nos apeteceu reatar a esperança nos que desanimaram: vale a pena começar de novo.

Bruno Alexandre, Diocese do Algarve

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