D. Jorge Urosa Savino critica antecipação do ato eleitoral para este domingo e realça situação «deplorável» no país
Lisboa, 18 mai 2018 (Ecclesia) – O arcebispo de Caracas diz que as eleições na Venezuela, que se realizam este domingo, 20 de maio, são “uma afronta aos direitos políticos do povo venezuelano”.
Em entrevista à Fundação Ajuda a Igreja que Sofre (AIS), enviada à Agência ECCLESIA, o cardeal Jorge Urosa Savino lamenta o facto de a ida às urnas ter sido antecipada para este mês, em vez do fim do ano como estava inicialmente previsto, inviabilizando assim a preparação adequada da oposição.
Para aquele responsável católico, o ato eleitoral deveria ser “adiado”, de modo a decorrer de “forma mais apropriada”, ou seja, em “democracia”.
“Os venezuelanos têm o direito de eleger os seus líderes com liberdade”, refere D. Jorge Urosa Savino, que depois vai mais longe nas críticas ao salientar que esta antecipação “faz lembrar uma competição de futebol onde uma das equipas marca o jogo 10 dias mais cedo do que o previsto, sem dar tempo da outra equipa reunir os seus melhores jogadores”.
“Estas eleições deveriam acontecer nos últimos meses deste ano, como está previsto na Constituição”, frisa o bispo de Caracas.
Para a Igreja Católica da Venezuela, é fundamental garantir a seriedade e a transparência destas eleições.
Caso contrário só se estará a “agravar ainda mais” a crise em que o país se encontra, o que poderá levar a “uma catástrofe humanitária sem precedentes”.
De acordo com a Cáritas Venezuela, esta nação sul americana tem hoje “o nível de inflação mais elevado do mundo”.
Um dos sinais visíveis deste contexto económico muito negativo é o preço dos alimentos, que subiu “mais de 1300 por cento em 2017”.
Atualmente um quilo de carne ou um quilo de leite em pó podem custar até cerca de um ordenado mínimo.
“A realidade da vida na Venezuela é deplorável”, admite o cardeal Jorge Urosa Savino, que aponta não só a questão dos alimentos, mas também outras carências graves.
Como “a falta de medicamentos e de outros materiais de saúde”, que afeta inclusivamente “os cuidados médicos nos hospitais”; a “falta de eletricidade e de água”, os “problemas da rede de transportes” e a falta de “liquidez” do país, de “dinheiro disponível”.
“Como é possível não haver dinheiro disponível no país? Basta isto para matar qualquer economia”, frisa aquele responsável católico, segundo o qual a Igreja Católica venezuelana vai continuar a denunciar a situação “desesperada” em que as pessoas se encontram.
Até porque algumas das atuais e antigas vozes da oposição, em termos políticos e sociais, estão hoje “muito fragmentadas e enfraquecidas”.
Para isso, aponta o arcebispo, muito contribuiu a forma violenta com que o atual Governo tem lidado com as fações dissonantes do regime.
No último ano, pelo menos 140 pessoas foram mortas durante protestos contra o presidente Nicolas Maduro.
“Algumas das vítimas nada tinham a ver com as manifestações. Eu vi um vídeo de uma mulher que seguia na rua, não estava integrada nas marchas, quando de repente se ouve um tiro e ela cai morta. Isto chocou-me profundamente. Parece que o mal está a triunfar nisto tudo. E diante deste sofrimento e da falta de soluções, muitos estão a cair no desespero”, salienta D. Jorge Urosa Savino.
Outra realidade preocupante diz respeito à sangria populacional que tomou conta da Venezuela.
De acordo com a Cáritas Internacional, já abandonaram a nação sul americana mais de quatro milhões de pessoas, cerca de “10 por cento da população”.
“Temos este êxodo porque não há perspetivas de futuro”, sustenta o arcebispo de Caracas, para quem por detrás deste “conflito venezuelano” está não apenas uma questão nacional, mas todo um conjunto de interesses.
“O país é um peão no meio de um jogo de interesses económicos e geopolíticos a nível internacional”, aponta o prelado, referindo-se por exemplo à luta pela exploração de ouro, diamantes e outros materiais preciosos no país.
JCP