Ei-los que partem

O número dos que não receberam ainda o primeiro anúncio, ou a desertificação crente exigem muito mais

1. O título destas linhas não introduz a conhecida canção de Manuel Freire. De facto, aqueles que pretendo mencionar não vão de coração triste e saco às costas, nem levam o sonho de regressar ricos; ao menos de bens materiais…

Os voluntários missionários, que nestas linhas quero homenagear – é essa a minha intenção – partem pressionados pelo desejo desprendido de, noutras aragens e entre outros povos, oferecerem tempos de entusiasmo, fé e saber.

Não os conduz o romantismo, a fuga de qualquer circunstância menos positiva, ou o gosto pela aventura. Urge-os o amor e a profunda exigência da vida de Deus em cada um. Sem esta causa, não imagino, aliás, como poderiam pôr à prova afetos ou adiar justos desejos de realização profissional.

Sendo verdade que “o homem contemporâneo acredita mais nas testemunhas que nos mestres”, os voluntários missionários cumprem, de forma excelente, o que, nas palavras de João Paulo II aos membros da Federação dos organismos cristãos do Serviço Internacional de Voluntariado, cabe a cada crente: “tornar de certa forma experimentável, através da sua dedicação aos irmãos, a ternura Providencial do Pai celeste”. Na mesma linha aponta Bento XVI, na Carta Apostólica para o Ano da Fé: “Aquilo de que o mundo hoje precisa de maneira especial é do testemunho credível dos que, iluminados na mente e no coração pela Palavra do Senhor, são capazes de abrir o coração e a mente de muitos ao desejo de Deus e da verdadeira vida; essa que não tem fim”.

 

2. Escrevi que o voluntário missionário não leva, quando parte, outro desejo que não seja o de servir. Mas os testemunhos de quem viveu tal experiência não escondem, também, a recompensa de “cem vezes mais”, prometida no Evangelho.

Socorro-me do que escreveu Catarina, em agosto de 2011, no final da sua missão em Timor: “cheguei de coração cheio para dar. Parto de coração cheio do que recebi. Cheguei a pensar que mudava o mundo. Parto a saber que o mundo me mudou a mim. Cheguei a pensar fazer. Parto a saber que o que mais importa é ser. Cheguei eu. Parto eu mais rica”. (http://www.estemeucoracao.blogspot.com).

 

3. Se se aprofundar a dimensão vocacional da vida cristã, muitas outras vidas se entregarão.

Sendo verdade que as estatísticas dos que partem revelam generosidades insuspeitadas, o número dos que não receberam ainda o primeiro anúncio, ou a desertificação crente exigem muito mais.

Eis um desafio colocado a todas as comunidades ou paróquias: assumir a exigência da dimensão missionária, constitutiva de toda a Igreja. De modo que todos pratiquemos a convicção de que, afinal, ser crente é viver em constante estado de missão.

João Aguiar Campos

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Agência ECCLESIA

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