«Somos irmãos» disse Francisco a Cirilo
Havana, 12 fev 2016 (ECCLESIA) – O Papa chegou hoje a Havana, capital de Cuba, cidade escolhida para acolher o inédito encontro entre Francisco e o patriarca ortodoxo de Moscovo, que selaram o momento histórico com um abraço.
"Somos irmãos, temos o mesmo Batismo", disse Francisco ao patriarca Cirilo, no início da sua reunião, que decorre à porta fechada no aeroporto internacional José Martí de Havana.
O Papa abraçou e beijou o patriarca ortodoxo, dizendo "finalmente".
O encontro em Cuba, onde o patriarca Cirilo está no âmbito da sua primeira visita oficial à América Latina, deve demorar cerca de duas horas e conclui-se com a assinatura de uma declaração comum.
Na sala estavam ainda o cardeal Kurt Koch, presidente do Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos (Santa Sé) e o metropolita Hilário, responsável pelo departamento das relações externas da Igreja Ortodoxa Russa.
Ortodoxos e católicos encontram-se divididos desde o Cisma do Oriente, em 1054, data em que trocaram excomunhões o Papa Leão IX e o patriarca de Constantinopla Miguel Cerulário; as excomunhões foram levantadas em 1965, mas as Igrejas não recuperaram ainda a unidade plena.
Francisco deixou Roma às 08h24 (07h24 em Lisboa) para chegar à capital cubana minutos antes das 14h00 locais (mais cinco horas em Lisboa), onde foi recebido pelo presidente Raúl Castro, numa escala a caminho do México.
O Papa agradeceu ao patriarca de Moscovo por ter alterado as datas da sua viagem, após não lhe ter sido possível responder afirmativamente a uma primeira proposta de encontro.
Às 16h15 locais (21h15 em Lisboa) vai ter lugar a troca de presentes e 10 minutos depois o presidente Raúl Castro junta-se aos dois líderes religiosos, antes da assinatura declaração da declaração conjunta católico-ortodoxa, seguida de intervenções de Francisco e Cirilo.
"Este encontro dos primazes da Igreja Católica e da Igreja Ortodoxa russa, preparado há muito tempo, será o primeiro na história e marcará uma importante etapa nas relações entre as duas Igrejas", refere o comunicado oficial conjunto divulgado no último dia 5.
A Santa Sé e o Patriarcado de Moscovo desejam que o encontro "seja um sinal de esperança para todos os homens de boa vontade".
Na capital russa, o Departamento para as Relações Exteriores do Patriarcado de Moscovo adiantava aos jornalistas que um encontro deste género estava em preparação "há quase 20 anos" e foi acelerado pelo "genocídio dos cristãos" às mãos de grupos terroristas.
O cenário mais esperado para um encontro entre o Papa e Cirilo era um território que fosse considerado "neutro" pelas duas Igrejas, como explicou o padre Federico Lombardi, porta-voz do Vaticano.
Francisco tinha visitado Cuba, pela primeira vez, em setembro de 2015.
Em 2014, o patriarca Cirilo enviou uma mensagem de felicitações ao Papa Francisco por ocasião do seu primeiro aniversário de pontificado, elogiando o “fortalecimento da colaboração ortodoxo-católica” na confirmação dos “valores morais-espirituais cristãos no mundo contemporâneo, a defesa dos oprimidos e o serviço verdadeiro ao próximo”.
A Igreja Ortodoxa da Rússia é a maior desta comunhão, com cerca de dois terços dos 200 milhões de fiéis ortodoxos, tornando Cirilo, eleito em 2009, um dos mais influentes líderes cristãos.
Cirilio reuniu-se com Bento XVI logo após a eleição pontifícia do agora Papa emérito, em 2005, e posteriormente em maio de 2006 e dezembro de 2007, mas no âmbito das suas anteriores funções como responsável pelas relações exteriores do Patriarcado de Moscovo.
Entre os temas que separam as duas Igrejas está o alegado proselitismo da Igreja Católica em territórios da antiga URSS – com destaque para a Ucrânia – para além do uniatismo (termo com o qual os ortodoxos se referem aos cristãos de países de tradição ortodoxa em união com o Papa).
A 30 de novembro de 2014, no voo de regresso da Turquia, Francisco disse aos jornalistas que tinha entrado em contacto com o patriarca Cirilo e que só a situação da guerra na Ucrânia estava a impedir o encontro.
“Já lho fiz saber e também ele está de acordo – temos vontade de encontrar-nos. Eu disse-lhe: ‘Vou aonde quiseres. Ligas-me e eu vou!’ E ele tem a mesma vontade”, relatou.
O Papa defendeu então que as Igrejas católicas orientais “têm direito de existir", mas sustentou que “o uniatismo é uma palavra de outra época, hoje não se pode falar assim”.
A Igreja Católica e as Igrejas ortodoxas continuam separadas desde o Cisma de 1054, tendo estas últimas desenvolvido um modelo de autoridade próprio, de cariz nacional, pelo que os vários patriarcados são autónomos e o patriarca ecuménico de Constantinopla (atual Turquia) tem apenas um primado de honra, como 'primus inter pares'.
OC
Notícia atualizada às 19h39