«Governos e políticos deviam ser reguladores da finança e ainda não estão a ser capazes disso», afirma D. Carlos Azevedo
Lisboa, 12 set 2011 (Ecclesia) – O responsável máximo da Igreja Católica pela área social critica a “ganância” que alimenta a economia, censura os ganhos exagerados nas transações financeiras e anuncia para esta semana o lançamento de uma Nota Pastoral.
“Há um caráter insaciável, um liberalismo dos mercados, expressão que enche a boca de tudo, que se transformou quase numa orientação de vida, e isso precisa de ser posto no verdadeiro lugar”, sublinha D. Carlos Azevedo no programa ECCLESIA que vai hoje para o ar, às 18h00, na RTP-2.
O prelado, um dos dois bispos auxiliares de Lisboa, não coloca em causa as margens de lucro mas declara que chegaram a “dimensões absurdas”: “A economia não se centrou nas pessoas. Viveu por ela própria, sobretudo com a especulação financeira, que foi o chegar ao limite”.
“Os governos e políticos deviam ser reguladores da finança e ainda não estão a ser capazes disso”, afirma o historiador, acrescentando que “o capital transformou-se em algo de livre e único, enquanto que o trabalho é que é o principal”.
A Comissão Episcopal da Pastoral Social, presidida por D. Carlos Azevedo organiza entre amanhã e quinta-feira, em Fátima, o seu 27.º encontro nacional, dedicado ao tema “Desenvolvimento local, caridade global”, durante o qual se apresentará uma “Nota Pastoral”.
[[v,d,2440,Entrevista a D. Carlos Azevedo]]D. Carlos Azevedo diz que “tem havido alguma coragem” por parte do Executivo com o anúncio de medidas que implicam “impopularidade”, embora os partidos da coligação tenham caído “num certo engodo da facilidade” durante a campanha, e salienta que o orçamento de Estado não pode passar só pelo aumento dos impostos.
“Além da dimensão da receita há também a dimensão do corte das despesas no supérfluo e no que se foi acumulando nestes últimos decénios”, diz o prelado, acrescentando que Portugal precisa de um Governo “que faça reformas profundas”, para as quais espera o “acordo dos cidadãos em geral”.
O Programa de Emergência Social (PES), formulado pelo Ministério da Solidariedade e Segurança Social, “valorizou as instituições que estão no terreno”, evitando, “como em tempos anteriores se estava quase a tentar fazer”, a criação de entidades “ao lado das que existem, perdendo-se recursos e prejudicando a vida de uns e outros”, assinala.
Depois de considerar que o PES é, por agora, “mais um conjunto de ideias de políticas sociais do que um programa”, o responsável alerta para o perigo de “asfixia” das instituições sociais, devido ao aumento de responsabilidades atribuídas pelo Governo sem contrapartida financeira.
Os portugueses, frisa D. Carlos Azevedo, têm de cortar “de modo muito drástico” nos gastos, alterando “comportamentos de todos os dias”: “As pessoas viveram muitos luxos pequeninos, como tomar o pequeno-almoço fora de casa”, exemplifica.
O respeito pela ecologia constitui também uma preocupação, mesmo que desagrade “ao discurso da economia”: “Os bens da criação [divina] são escassos: estamos a dar cabo da água e da natureza”, pelo que, “em nome das futuras gerações”, é necessário optar por “uma vida mais equilibrada, não gastando tantas coisas nem produzindo tanto lixo”.
PTE/RM