D. José Policarpo falou aos Bispos portugueses da necessidade de uma atitude dialogante e das implicações políticas da fé
O Cardeal-Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, defendeu hoje a necessidade de mudar a “atitude” da Igreja perante a sociedade contemporânea, procurando “formas novas de intervenção”.
“A Igreja faz parte integrante do todo da sociedade e dada a qualidade da sua mensagem e o número dos seus membros, não pode deixar de procurar formas sempre novas para contribuir para o bem da comunidade humana em que está integrada”, afirmou.
O Patriarca de Lisboa falava nas Jornadas Pastorais da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), uma iniciativa de estudo e debate que decorre em Fátima, centradas no tema «Repensar juntos a Pastoral da Igreja em Portugal».
“O anúncio cristão pode, por vezes, ser uma denúncia, embora deva ser, sobretudo, anúncio. Mas se começa pela denúncia, corre o risco de nunca ser anúncio”, alertou.
O Cardeal-Patriarca lamentou a “situação anacrónica” de considerar “qualquer intervenção da Igreja” como uma “intervenção na esfera do estritamente político” e deixou uma confissão: “Pressinto que virá dos leigos a energia para esta renovação da intervenção da Igreja na sociedade”.
“É impressionante verificar a pouca importância que a dimensão ética tem nas escolhas políticas”, observou, antes de recordar que “o voto deveria ser sempre a escolha de uma consciência bem formada e esclarecida”.
A hierarquia, referiu o antigo presidente da CEP, “abstém-se habitualmente de se imiscuir no âmbito do estritamente político, mas os cristãos leigos não são a isso obrigados e devem ser porta-vozes, no seio da sociedade, dos autênticos valores cristãos”.
D. José Policarpo lembrou várias passagens dos discursos proferidos por Bento XVI na sua viagem a Portugal, frisando que o próprio Papa afirmou a importância de uma “atitude aberta e dialogante”.
“Esta atitude dialogante da Igreja perante a sociedade real, com os seus valores e os seus desvios, não pode significar uma cedência”, apontou, ao declarar que o anúncio feito pela Igreja “não pode ser apenas denúncia negativa, mas afirmação do nosso empenho no progresso da humanidade”.
Para o Cardeal-Patriarca, “se nos limitarmos à denúncia, a nossa voz pode ser facilmente interpretada como mera tomada de posição política e ser vítima de fundamentalismos”.
“Estes, sejam de matriz religiosa ou ideológica, acabam sempre por roçar a intervenção política na defesa de posições pessoais ou grupais, isolando a verdade que defendem da verdade fundamental que é o amor salvífico de Deus”, alertou.
Citando a Constituição Pastoral “Gaudium et Spes” (1965), do Concílio Vaticano II, D. José Policarpo defendeu que “só amando o mundo se podem captar os sinais que a realidade emite, para que a Igreja intua caminhos concretos de missão”.
“Podemos cair, facilmente de mais, na atitude de condenação da sociedade actual, mas é possível amar o mundo sem concordar com o mundo”, assinalou, apelando a um “olhar construtivo sobre a sociedade, por parte da Igreja”.
Entre os pontos que valorizou, na sua longa intervenção, o Patriarca de Lisboa destacou a “busca de sentido” na sociedade actual, mas deixou como alerta a constatação de que “muitos já não procuram, espontaneamente, a resposta da Igreja, na sua acção institucional”.
Neste contexto, D. José Policarpo falou em particular do “universo juvenil”, convidando os presentes a “aceitar o desafio de rever profundamente a nossa pastoral juvenil”.
Após recordar os apelos do Papa para que a acção social da Igreja portuguesa fosse repensada, o Patriarca de Lisboa concluiu a sua intervenção com uma nota crítica: “Trabalhamos mais do que amamos, criamos estruturas mas quando as pessoas precisam do pastor, nós estamos ocupados”.