Duas velocidades em busca de um rumo comum

Octávio Carmo, Agência ECCLESIA

Durante quatro dias, os olhos do mundo estiveram postos no Vaticano: o Papa Francisco fez história ao convocar presidentes de conferências episcopais, religiosos, vítimas de abusos sexuais, responsáveis da Cúria Romana e jornalistas para debater as falhas da Igreja Católica na proteção dos menores.

O Papa já tinha deixado claro que algumas das expectativas sobre esta cimeira eram exageradas. Como em tudo, na Igreja Católica, há quem espere mais e quem pense que se foi longe de mais. Mas aqui o caso é suficientemente sério para que se deixem de parte estas relativizações.

Para quem ouviu os participantes e algumas conversas de bastidores, é inegável que quase a chegar à segunda década do século XXI, há ainda muitas resistências e hesitações no seio da Igreja Católica no que diz respeito à crise de abusos sexuais. Até a expressão “tolerância zero” parece ter dado o seu último suspiro neste encontro, numa atitude bem-intencionada de apresentar uma imagem de conjunto, mais centrada na proteção de menores do que nos abusos sexuais, mas que é muito mal recebida pela opinião pública e, em particular, e pelas associações de vítimas.

Os representantes das Conferências Episcopais mais afetadas por esta crise estão, claramente, num outro patamar de reflexão e isso implica, necessariamente, que a busca do objetivo comum de combate e prevenção de novos casos se faça a duas velocidades. A grande conclusão desta cimeira é que todos são convidados a assumir que o problema não é do Ocidente ou do mundo anglo-saxónico, muito menos dos jornalistas, como durante tanto tempo se disse, mas é efetivamente um desafio comum.

Durante o encontro, algumas vozes manifestaram desconforto por só se falar em abusos sexuais e, no seu discurso final, o Papa parece ter dado eco a estas preocupações. Não para relativizar a gravidade dos crimes, mas sublinhar a sua mensagem de líder global: os abusos sexuais chegam a todo o mundo, a começar pelas próprias famílias, e nenhuma diferença cultural os pode justificar. O problema é de todos e a resposta tem de chegar agora.

Liderar a erradicação dos vários tipos de abusos sobre menores é uma intenção nobre e uma tarefa muito maior do que erradicar os abusos de clérigos e religiosos. Mas ninguém levará essa intenção a sério sem que, primeiro, a casa esteja arrumada dentro da Igreja Católica.

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Agência ECCLESIA

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