Dia Mundial da Paz e justiça climática

Ao mesmo tempo que decorria em Copenhaga a Conferência das Nações Unidas sobre alterações climáticas, foi apresentada a Mensagem de Bento XVI para o Dia Mundial da Paz 2010,  com o mote Se quiseres cultivar a paz, preserva a criação. Nesta mensagem, o já chamado “Papa Verde” convida ao reforço da “aliança entre ser humano e ambiente”, cuja salvaguarda é essencial para a convivência pacífica da humanidade. É de notar que já João Paulo II, há 20 anos atrás, alertara que a paz mundial estava ameaçada pela falta do respeito devido à natureza.

No sentido mais imediato, as alterações climáticas são realmente uma ameaça à paz, uma vez que os efeitos que delas decorrem – menos terras aráveis, falta de água, aumento de cheias e secas prolongadas – provocam já conflitos pelo acesso a recursos naturais cada vez mais escassos nalgumas partes do mundo, bem como um número crescente de “refugiados climáticos”, vítimas das catástrofes naturais e da subida do nível do mar nas zonas costeiras.

Mas há também uma forte dimensão de justiça: os países em desenvolvimento foram os que menos contribuíram para o actual estado do clima, porém são quem mais sofre hoje seus os efeitos nefastos. É por esse motivo que a campanha da CIDSE e da Caritas Internationalis, na qual a Fundação Evangelização e Culturas participa, apela à “justiça climática”, que passa em concreto por uma forte redução das emissões de gases de efeito de estufa dos países desenvolvidos e pelo financiamento por parte destes países à adopção de tecnologias verdes nos países em desenvolvimento e à sua adaptação aos impactos das alterações climáticas.

À procura de soluções para a “crise ecológica”, Bento XVI separa os aspectos técnicos, onde têm a palavra os cientistas, dos aspectos éticos, aos quais é necessário responder com “uma nova solidariedade”. Em Copenhaga, na entrega de uma petição que juntou mais de 500 mil assinaturas de cristãos de todo o mundo, o comissário Yvo de Boer, responsável máximo das Nações Unidas nas negociações, reconheceu que o que está em causa nesta discussão é sobretudo um problema moral. E aqui os cristãos, legitimados pela sua visão do ambiente como criação de Deus que nos é confiada para preservar, devem ter uma voz activa na denúncia de abusos e na alteração de comportamentos pessoais.

O Papa apela ainda a uma profunda revisão do modelo de desenvolvimento actual, para que ele se passe a alicerçar em valores firmes, como a sobriedade e a solidariedade, que contrastam com o consumismo e o egoísmo que reinam no nosso tempo.

Em Copenhaga, numa manifestação onde cem mil pessoas reclamaram um acordo mundial justo e ambicioso, fez-me pensar ver do mesmo lado padres e freiras com cartazes, os ambientalistas radicais do Greenpeace e grupos de esquerda anti-capitalista. É certo que temos motivações muito diferentes e divergimos em muitos temas, mas temos em comum um sentido crítico do consumismo desenfreado das sociedades ocidentais.

É por isso enriquecedor criar pontes com outras formas de pensar o mundo, e muito especialmente com os cristãos de outras Igrejas e com outras religiões, com quem partilhamos a fé de que a vida não se esgota naquilo que vemos e de que o ter não sacia a fome de ser.

Seguindo os apelos do Papa, é urgente despertar na sociedade portuguesa, e nos católicos em particular, a consciência de que os problemas ecológicos têm graves consequências sociais para os mais pobres do mundo, e de que o Evangelho nos impele a adoptar padrões de consumo mais sustentáveis.

Tiago Tavares, Fundação Evangelização e Culturas

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