Desafio e compromisso para Portugal

Mensagem do presidente da Cáritas nacional a propósito da presidência portuguesa da União Europeia Desde este Domingo, Portugal está ao leme da Europa dos 27. A agenda, para além de aliciante, é decisiva para a coesão europeia. Foi, em Lisboa, que se traçaram os “Objectivos do Milénio”, que almejam a redução da pobreza e a integração dos que se encontram em situação de exclusão. Compete, agora, ao governo português criar condições para que se recupere o tempo perdido no alcance destas metas. O projecto europeu de que os Estados se unam é já muito antigo. Os políticos e militares pretendiam congregar novos territórios; os comerciantes queriam alargar o mercado a novos espaços de comércio e criar uma moeda única; os intelectuais, pacifistas e religiosos ansiavam por uma nova cultura e evangelização, bem como pela construção da paz. Por isso, a União Europeia, por razões da sua própria história e pelos compromissos inerentes a um desenvolvimento económico e social integral, terá de convencer este mundo globalizado que não pode obstruir a iniciativa e os legítimos interesses dos cidadãos e dos países, mas que, sendo estes protagonistas do seu próprio desenvolvimento, por direito próprio, deverá investir em formas de cooperação que impulsionem aquelas iniciativas e as façam frutificar em proveito de quem as exerce ou a quem se destinam. Isto mesmo determina o Tratado da Comunidade Europeia ao afirmar que a «Comunidade actuará dentro dos limites das competências que lhe atribui o presente Tratado e dos objectivos que este assinala. Os âmbitos que não sejam da sua competência exclusiva, a Comunidade Europeia intervirá, conforme o princípio da subsidariedade, só na medida em que os objectivos da acção pretendida não possam ser alcançados de maneira suficiente pelos Estados membros e, por conseguinte, podem alcançar-se melhor, devido à dimensão ou aos efeitos da acção contemplada a nível comunitário»(1) Porém, esta exigência não pode, como está a ser nos últimos decénios, questionar a tradição europeia da disponibilização de serviços públicos essenciais para todos. Durante a Presidência de Portugal da UE, a pobreza e a inclusão social são dois temas que estarão, permanentemente, na agenda. São problemáticas que, nos últimos anos, têm sido referidas nos dados apresentados pelo Eurobarómetro como necessitadas de uma atenção mais urgente, aparecendo sempre no cimo da lista de preocupações em todos os países. Todavia, estas preocupações não se têm reflectido nas actuações políticas, na disponibilização de meios e num aberto e consistente debate político. É por isso que a ameaça principal para a concretização da Estratégia de Lisboa provém de uma carência de energia política, que se reflecte tanto na falta de debate e de pressão públicos, como nas forças de grupos de interesses nos níveis estatal e europeu. Outra ameaça para a estratégia da inclusão vem do aumento do racismo, e da xenofobia, motivado pela forma como são abordados estes problemas sociais na comunicação social e em certos quadrantes políticos. São suas principais vítimas os que pedem asilo, os imigrantes, especialmente os indocumentados, os ciganos e outras minorias étnicas, que não devidamente acolhidos e integrados geram pobreza e acentuam os problemas de exclusão social. As estratégias antipobreza necessitam, por isso, de consolidar os direitos de igualdade das minorias, determinar e afrontar o impacto do racismo e da descriminação nas condições de vida das minorias. Estamos desenhando um mundo sem fronteiras. Optámos por um mundo global com a esperança de que esta globalização nos trará um mundo melhor; melhor para todos. Há, porém, que ampliar o conceito de bem comum a esse mundo global que estamos tentando construir, sendo a capacidade de vencer as causas estruturantes da pobreza e de acolher os imigrantes desafios substantivos. Este repto foi lançado por João Paulo II ao afirmar: «O fenómeno migratório põe à prova a capacidade que tem a Europa de dar espaço a formas de acolhimento e hospitalidade inteligente. Exige-o a visão ‘universalista’ do bem comum: é necessário alongar o olhar até abraçar as exigências da família humana inteira. O próprio fenómeno da globalização reclama abertura e partilha, se não quiser ser raiz de exclusão e marginalização mas sim de participação solidária de todos na produção e intercâmbio de bens.» (2) Ultimamente, a UE tem insistido na contribuição das próprias pessoas, em situação de pobreza e de marginalização, na edificação dos seus próprios projectos de vida e mesmo na construção de uma Europa mais justa e solidária. Para isso, é necessário formar a opinião pública, sendo imprescindível a colaboração dos media, das paróquias, das associações não governamentais, desde o nível local ao europeu. Nesta senda, a Cáritas continuará a empenhar-se por ser mediação, no sentido de fazer ouvir a voz dos mais marginalizados. Estamos num momento particularmente importante no que respeita à unidade europeia em todas as suas dimensões. Durante os próximos seis meses, o governo e todos os cidadãos de Portugal têm um desafio aliciante pela frente. Oxalá sejam capazes de estar a altura das exigências decorrentes da Presidência da UE. Eugénio Fonseca, Presidente Nacional da Cáritas [1] Tratado Constitutivo da Comunidade Europeia, Roma, 25 de Março de 1957, art. 5. [2] IGREJA CATÓLICA. Papa, 1978 – 2005(João Paulo II) – Ecclesia in Europa: [Exortação Apostólica de 28 de Jun. 2003]. Roma: Tipografia Vaticana, 2005, n.101.

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Agência ECCLESIA

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