Paulo Rocha
Rola a bola no mundial e rebolam considerações e juízos, debates e sentenças por causa do jogo e dos seus atores, principais e sobretudo os secundários. Em qualquer competição e sobretudo no futebol no nosso ambiente latino, o tempo de jogo fora de campo é, sem dúvida, muito superior ao que se passa dentro das quatro linhas. Com um grande perigo: a competição é cada vez menos um desporto que resulta das capacidades físicas e psíquicas de atletas e equipas e decorre antes de bastidores, pressões, jogadas impossíveis de aplicar a qualquer modalidade desportiva.
No dia 1 de junho foi publicado um documento que vai ser, por certo, uma referência para aqueles que estiverem interessados não na vitória a qualquer preço nas o desenvolvimento de atividades desportivas que sejam expressão da vida humana, da relação entre pessoas, e não de negócios desumanos. “Dar o melhor de si” é o título do texto.
“Dar o melhor de si é um tema fundamental do desporto, uma vez que os atletas se esforçam individual e coletivamente para conseguir os seus objetivos no jogo. E quando a pessoa dá o melhor de si, experimenta a alegria do dever cumprido”. Assim começa este documento, que não é um conjunto de artigos estatutários de um clube ou associação desportiva, um regulamento de uma competição ou o corpo normativo de uma modalidade. Trata-se da abordagem do fenómeno desportivo no que tem de mais genuíno, como parte integrante da pessoa humana, para apresentar as marcas que devem definir qualquer atividade desportiva, felizmente visível em tantos atletas e equipas: ser expressão do corpo, alma e espírito, do indivíduo e da equipa; desenrolar-se com criatividade, liberdade e regras; resultar do sacrifício; gerar alegria, harmonia, valentia, igualdade, respeito, solidariedade; e ser expressão da procura do sentido para a pessoa.
O documento foi publicado pelo Vaticano, pelo setor que coordena projetos relacionados com os leigos, a família e a vida, e inspira atletas, equipas, responsáveis e também adeptos de todas as modalidades.
O envolvimento do público nas várias competições compromete cada vez mais a concretização desse desígnio maior para o desporto: “Dar o melhor de si”. Mais do que adeptos, apoiantes de uma equipa ou modalidade, verifica-se o crescente número de seguidores de clubes e dirigentes, partidários de estratégias empresariais que em nada se relacionam com a prática desportiva e correligionários de intervenções públicas e mediáticas que apenas têm por objetivo o negócio e só por essa via também pensam na vitória.
Também nos ambientes que envolvem estádios e competições, o documento sobre o desporto publicado pelo Vaticano deixa pistas a considerar, caso os adeptos estejam interessados no desporto e não só no clube, que se resumem a indicações raramente observáveis neste meio: apoiar a equipa na vitória e na derrota e respeitar os adversários e os árbitros. Porque para apoiar uma equipa não é necessário ser contra o adversário.
Ingenuidade? Talvez! Mas o único meio para os adeptos ajudarem a salvar o desporto. E também os clubes!
Paulo Rocha