D. Ximenes Belo irá escrever livro sobre sobre a história de Timor

D. Carlos Filipe Ximenes Belo, Bispo emérito de Dili e Prémio Nobel da Paz, tem 60 anos, nasceu a 3 de Fevereiro de 1948 em Baucau, Timor. Em 1980 foi ordenado presbítero por D. José Policarpo. Em Maio de 1983, foi nomeado, por João Paulo II, Administrador Apostólico da Diocese de Dili. Defensor dos direitos humanos e do povo timorense, apelou à manutenção da paz naquele território. Os seus esforços foram recompensados, em 1996, ano em que, juntamente com Ramos Horta, recebeu o Prémio Nobel da Paz. D. Ximenes Belo esteve na Guarda, entre os dias 7 e 11 de Julho, a orientar um retiro de sacerdotes da Diocese, realizado no Centro Apostólico da Guarda. A Guarda: Quem é D. Ximenes Belo? D. Ximenes Belo: Bem, é um timorense, um discípulo de Jesus Cristo que está ao serviço de Deus. Estou reformado, agora estou em Portugal para tratamento, para Timor vou de vez em quando, vou e venho. Estou sedeado no Colégio dos Salesianos, em Mogofores, ajudo na paróquia, nas confissões e quando a pedido das escolas, das universidades e das paróquias, falo da paz, dos direitos humanos, da justiça e da solidariedade. A Guarda: Como foi o seu percurso académico? D. Ximenes Belo: Andei no Seminário Menor em Dili, onde andaram também Xanana Gusmão e outros líderes políticos timorenses e depois, pronto, a um dado momento, senti para seguir D. Bosco [fundador dos Salesianos] e pedi para vir para os Salesianos, porque lá em Timor não havia Seminário Menor e então o missionário que era encarregado dos padres Salesianos em Timor disse-me «olha vai até Portugal e fazes lá o aspirantado», como se dizia. Depois vim para Portugal, fiz o primeiro e o segundo ciclo, no Seminário de Dili não tínhamos os exames oficiais e tive que repetir na escola Salesiana de Manique [de Baixo], Estoril, fiz lá também o noviciado. Fiz [o curso de] Filosofia no ISET (Instituto Superior de Ensinos Teológicos), Teologia na Universidade Católica e depois continuei a Licenciatura em Roma, na Universidade Salesiana. A Guarda: Ficou surpreendido com a nomeação para Bispo de Dili? D. Ximenes Belo: Sim, porque havia padres mais capazes do que eu, mais preparados, eu tinha apenas três anos de sacerdócio, tinha regressado da Europa, quando o Papa [João Paulo II] me pediu para ser Administrador Apostólico e numa situação difícil de Timor mas, pronto, em obediência ao Santo Padre, aceitei e levei a cruz. A Guarda: Qual o papel da Igreja Católica no processo de independência de Timor-Leste? D. Ximenes Belo: Não foi um problema político, portanto, não se pode falar no papel da Igreja Católica na independência de Timor-Leste. É mais um papel de moral, de protecção das pessoas, dos que sofrem, dos débeis, dos direitos humanos, sobretudo na defesa da justiça, da paz e dos direitos humanos. Era mais uma voz moral, um suporte moral para a população, do que propriamente uma força política, porque nós não nos sentíamos como políticos, o nosso trabalho era na pastoral, ao nível da justiça e da paz. A Guarda: A presença dos portugueses em Timor-Leste é bem aceite? D. Ximenes Belo: Como sabe, é bem aceite. Desde 1999, depois do referendo, que voltaram para lá, através da presença dos militares, dos policias, agora, concretamente da GNR, e dos cooperantes, sobretudo no aspecto da Educação. Continua a ser necessária a presença [dos portugueses), sobretudo de assessores, de conselheiros, de professores e de técnicos. Como sabe, Timor é uma nação nova e precisa sempre de apoio internacional, sobretudo dos Países de expressão de Língua Portuguesa. A Guarda: No seu ponto de vista, actualmente, é seguro viver em Timor? D. Ximenes Belo: É seguro. É só ir lá e verá com os próprios olhos que é seguro. Claro que há problemas. Há falta de trabalho para os jovens. Em Timor não é como aqui em Portugal que tem indústrias, tem fábricas, mas, o Governo tenta organizar a vida para que os Timorenses se sintam em casa e, sobretudo, gozarem os benefícios da independência. Independência política já tem, agora, precisa de desenvolver o aspecto económico, cultural agrícola e industrial. Tudo isto, ainda é necessário desenvolver. A Guarda: O que é que falta para que Timor se torne num País próspero e pacífico? D. Ximenes Belo: Isso não se faz num dia, leva muito tempo e, claro, como sabe, em 1999 foi tudo destruído e foi preciso recomeçar a pouco a pouco e, neste momento, o programa que há, da parte do Governo, são aqueles programas essenciais que estão relacionados com a ordem pública, consolidar os aspectos da educação, da saúde, da agricultura e a criação de postos de trabalho, sobretudo para os jovens. Como sabe, há instituições internacionais que estão a explorar petróleo e gás natural em Timor. Esperamos que o que provém de lá reverta em benefício das populações. A Guarda: Como é a vida de um Bispo Nobel da Paz? D. Ximenes Belo: É a vida como a de outro Bispo qualquer, não é a vida de um Bispo que está nas nuvens. Somos muito terra a terra, servimos as pessoas, trabalhando pela paz, pelos direitos humanos. A Guarda: O que é que veio transmitir aos padres da Diocese da Guarda? D. Ximenes Belo: A minha pregação aqui, aos sacerdotes, também é nessa linha. Estamos a reflectir sobre a oração, dita pela paz, de S. Francisco de Assis «onde houver guerra que eu leve a paz, onde houver ódio que eu leve a união». Estamos a cada dia, a fazer meditações sobre esta oração. Isto para os sacerdotes, porque para os jovens falo sobretudo de educação para a paz. A Guarda: Que projectos tem para o futuro? D. Ximenes Belo: Não tenho projectos nenhuns, a não ser o projecto de estar à disposição dos senhores Bispos, dos senhores padres, e ajudar os Salesianos. O projecto pessoal que tenho é tentar escrever o livro sobre a História de Timor, desde 1556 até 2006, abrange um período de 450 anos. A Guarda: Quando prevê proceder ao seu lançamento? D. Ximenes Belo: Não se sabe. Como sabe, quando se escreve sobre Timor é muito difícil porque não há muitos documentos. Já tivemos quatro incêndios ao longo dos séculos. Os arquivos que foram mandados para Macau, Goa, também grande parte, sofreu com as inundações, com a perca dos documentos, por isso, aqui em Portugal ainda terei de consultar os Arquivos Histórico Ultramarino, a Torre do Tombo, e outros Arquivos. Isto de escrever a História, é muito difícil. Não é romance, é preciso ter dados.

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